Tijolo Records e Naiche: a construção de um selo e paranoias visuais

“Cultivar o objetivo de que os projetos tenham vínculos pessoais profundos”; Naiche e SIXX4SIXX falam sobre “Back on Track” e os ideais que impulsionaram a criação do selo estabelecido em Nova York

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Fotos: Divulgação

Construção e fundação, pouco a pouco – esse é o lema que ressoa após uma conversa com o fundador da Tijolo Records, SIXX4SIXX. O selo estabelecido em Nova York, que tem nomes como CERSV em seu acervo, recentemente lançou o excelente EP Back on Track, de Naiche, produtor e músico de Belo Horizonte, com quem também batemos um papo repleto de referências sonoras e visuais.

É difícil não se impressionar primeiro pela “embalagem” da Tijolo Records – uma estética suja com animações que parecem saídas de um quadrinho de fanzine dos anos 1990, misturada ao VHS, ruído, grão e outros elementos. Back on Track foi desenvolvido durante um período em que Naiche e sua companheira encarnaram uma espécie de vida nômade, passando por São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Bahia. “As coisas estão realmente estranhas e tem feito sentido viver com o mínimo possível. Então, estamos vivendo com algumas mochilas e um computador”. A ideia de movimento é perceptível no trabalho, que transita por diversos caminhos, seja pelo House de Chicago e Detroit, o Techno, UK Garage o Footwork ou até o Jazz e o Boom Bap. Em batidas quase sempre 4×4 diversas camadas vão sendo criadas e sobrepostas.

Além da confluência de referências, a vivência de Naiche foi muito pautada pelo skate e o Punk. “A fita do Punk moldou minha forma de produzir e de como conviver e perceber. Estar num cenário Punk me fez ter contato com questões que até então eu jamais tinha convivido, pôs em xeque várias fitas de vir de uma cidade com pensamento conservador, esse tipo de coisa. Nasci numa quebrada rural em BH, tá ligado? Não a fita de questionar, foi o Punk que me acolheu e deu uma direção. Pude ir para lugares que nunca imaginei, por causa do Punk ou do skate, certeza. E na moral, não como pegar a capa do Bad Brains, por exemplo, e não se empolgar com aquele bagulho”.

Soma-se ainda o trabalho de Naiche como designer gráfico, sob a alcunha de Visual Paranoia, o que resulta em um universo particular, no qual, segundo ele, surge uma arte feita sempre para as pessoas que tão no “garimpo do som”, seja na produção ou no processo. Uma combinação atraente, permeada de diversas influências e embalada pela Tijolo Records (assinada por Visual Paranoia) – há também uma camada urbana que reflete o apreço pela cultura Hip Hop. Tudo isso entra no pacote desse manifesto dos fundadores do selo, Thiago Takeshi  e SIXX4SIXX.

Naiche também se envolve no campo audiovisual, ais especificamente no Holotrópico, acompanhado de Vitor Jabour e Kill Moves, também de BH. O laboratório de ideias vem se destacando pelo Brime, Eletrônico e Hip Hop, com clipes para o celebrado BRIME! – disco de CERSV, Fleezus e Febem –, além de trabalhar com a Ceia. São produções que trazem referências ao skate, ao Punk e à atmosfera urbana, a partir de uma proposta que se utiliza de equipamentos obsoletos do vídeo. “A HTP é tipo um laboratório em que vamos fazendo experimentos e, normalmente, por causa disso, várias pessoas do som, do skate, da arte vêm na busca. Porque é estranho”.

“A decisão de criá-lo partiu da necessidade de escrever a própria história e dar suporte aos projetos com os quais temos afinidade. Creio não existir a pretensão de inventar a roda ou lançar algo revolucionário. Acredito que o valor estará no conjunto da história, para daqui a cinco nos, além de ter lançado vários discos, cultivar o objetivo que eles tenham vínculos pessoais profundos”, diz SIXX4SIXX sobre a Tijolo, cujo fantasminha no logo “bem vileiro, era a analogia perfeita para dois imigrantes nessa cidade caótica chamada Nova York”. O terceiro lançamento do selo será do RHR, o Roni, trabalho que, para o SIXX4SIXX fortalece a ideia de construir uma história versátil, com vínculos fortes e confiança. “É um disco diferente dos dois anteriores (CESRV e Naiche). Nós estamos conversando desde dezembro do ano passado sobre vida, saúde, cura, família e música. Ele me disse que estava muito feliz de poder fazer algo que o representasse nesse momento, que ele estava realmente envolvido com esse trabalho e a importância de poder registrar isso agora em vinil. Eu, sem ouvir, as músicas, já respondi: “É isso que queremos!”.

Esse processo de troca de vivências e crenças, junto aos corres que cada um seguiu durante a jornada, mostram uma construção paciente e cuidadosa no que diz respeito a o que e com quem se constrói. Essa edificação passa pelo lançamento de todos os projetos em vinil, prensados na gringa. No entanto, o desejo é disponibilizar tudo no Brasil, a preços praticáveis. “Para o Brasil, estou estudando qual será a melhor forma, pois penso em vender os discos nos valores mais justos possíveis, e que as pessoas não tenham que pagar todas as taxas de importação e envio. Chega a ser quase inviável pagar tudo isso por um disco. O selo está apenas começando, acredito em coisas duradouras”.

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ARTISTA: Naiche
MARCADORES: Tijolo Records

Autor:

Economista musical, viciado em games, filmes, astrofísica e arte em geral.