Ouça: VRUUMM

Grupo tenta subverter conceito alheio de Jazz e tem grande elenco para trazê-lo aos dias atuais

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Se existe um estilo que sempre permanecerá clássico, ele é o Jazz – elemento chave na construção do que hoje consideramos a base da música. Por séculos, a música clássica dominou os grandes centros culturais e privilegiou os mais abastados com obras densas e inteligentes. No entanto, foi a partir da mistura étnica nos EUA, fruto de um colonialismo escravocrata, que um dos gênero mais populares do século passado moldou-se e veio a formar a base para outros irmãos: Blues, Rock, R&B e Funk, entre outros, são alguns dos frutos dessa interação experimental.

Em sua história, inúmeros grandes elencos de músicos ousaram criar algumas narrativas musicais que jamais haviam existido através de um objetivo: improvisar. Exemplos não faltam e uma simples busca na história das bandas de Charles Mingus, Miles Davis e Fela Kuti revela a exuberância de músicos por trás desses atos. Podemos dizer que ele nunca deixará de existir, assim como, afirmar que a sua evolução parece inteiramente conectada à arqueologia e à globalização da própria música.

VRUUMM é um desses grupos que parece nos remeter a outros momentos musicais enquanto se coloca à frente na sua própria concepção musical. Jazz Moderno? Provavelmente, mas é também Rock, Música Instrumental e Afrobeat, se tornando um folclórico exemplo do aspecto cosmopolita de sua cidade sede, São Paulo.

O caráter de grande banda passa pela sua impressionante formação: dois bateristas se degladiam de forma complementar, enquanto os sopros surgem nas mais variadas formas – auxiliados por um piano por vezes clássico, outras experimental e funky, além de um baixo que gruda em cada composição e uma guitarra que pulsa uma veia étnica. Nela, figuram Nico Paoliello (Garotas Suecas e Mel Azul), Fernando Perdido (Garotas Suecas e Pure), Ricardo Cifas (FingerFingerrr) e os jazzistas Marcelo Lemos, Mauricio Orsolini e Anderson Quevedo, o grande maestro do grupo. Dono da flauta e saxofone, seu instrumento conduz as narrativas que flutuam sob os mais variados gêneros nos poucos e excelentes lançamentos presentes no Soundcloud da banda.

“Variados” não é eufemismo: Como Diziam os Primatas é um Funk espacial com uma mistura dos melhores elementos do Jazz Fusion (cruzamento inesperado entre Sun Ra, Herbie Hancock e Funkadelic), Fandango é a clássica e atmosférica trilha-sonora de filmes orquestrados até uma quebra psicodélica e um retorno ao clássico no piano – provavelmente a composição mais bonita entre as lançadas até o momento. Figura ainda o Jazz modal de 4 e 20, único momento em que os cabarés e a vida noturna da década de 1940 parecem bater na cara do ouvinte: é a trilha perfeita para um filme Noir com bastante fumaça. Em uma pesquisa pelo YouTube, acaba surgindo uma nova pérola, dessa vez ao vivo, Uma Coisa Disco Funk, que diz tudo em seu título e nos convida para dançar.

Fandango

É chocante como cada composição soa única e, ao mesmo tempo, complementar e linear – VRUUMM conta histórias sem voz ou narradores, mas somente personagens por ventura principais, por ventura secundários em um grandíssimo elenco de Jazz Moderno. Se o gênero parece ganhar novo frescor com alguns artistas estrangeiros que querem trazê-lo ao público mais jovem, como Kamasi Washington, Badbadnotgood e todos os músicos do selo Brainfeeder, a banda paulistana parece trazer a mesma sensação com toques globais – seu Jazz passa por diversas partes do mundo mostrando que a infinita cena instrumental pode ser condensada em um grupo brasileiro.

Como Diziam os Primatas

Com um disco gravado no começo do ano junto ao produtor inglês Nick Graham-Smith, o mesmo do ótimo Feras Míticas (Garotas Suecas), a banda está em uma campanha no site Kickante para viabilizar a prensagem de sua estreia. Logo, certeiro é o fato de que teremos um álbum feito por músicos que transpiram o improviso, diferentes origens musicais e que traz o Jazz mais perto de um público jovem que enxerga o seminal estilo como “coisa de velho”. VRUUMM é objetivo, amplo como seu cacofônico nome e se mostra, desde o começo, um ato para se ouvir sem restrições e ver sem chances de tédio.

4 e 20

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ARTISTA: VRUUMM
MARCADORES: Ouça

Autor:

Economista musical, viciado em games, filmes, astrofísica e arte em geral.