Nota-se uma intenção metalinguística já no título de Radiosoul. Um passeio por suas 11 faixas revela também o diagnóstico: Alfie Templeman sofre de “saudade do que nunca viveu” – no caso, uma época quando a música que hoje é tida como “clássica” no pop e no rock era o que fazia sucesso, por exemplo, nas rádios. Não à toa, o álbum deixa a impressão de querer prestar homenagem a esse tempo que podemos acessar por meio dos discos.
A abertura com a faixa-título é eficaz em convidar o ouvinte a essa viagem temporal. Psicodélica na medida certa, a canção brinca com o conceito da boa música ser sempre uma boa companhia (mesmo que ninguém preste atenção no rádio ligado) – e que escutar a própria alma é garantia de nunca estar sozinho. A melodia é cíclica, com um saxofone que circula pelo espaço sonoro criando quase um mantra, um estado hipnótico para quem quer se deixar pela música.
Na sequência, o carro-chefe “Eyes Wide Shut” mostra Alfie brincando de ser Prince no baixo, guitarra e falsete. O refrão ensolarado chega a ofuscar o conteúdo crítico da letra, do medo de enxergar a vida como ela é e a tentação de permanecer de olhos fechados. É o tipo de questionamento que o britânico quis fazer ao entrar nos 20 anos, após sair da casa dos pais para morar sozinho em Londres e enfrentar de vez uma vida adulta que já o cercava desde os 17 anos (quando lançou seu primeiro disco).
Se as letras não escondem a nova maturidade, faixas como “This is Just the Beginning”, “Drag” e o single “Hello Lonely” mostram sua intenção de apresentar hoje um pop ainda mais juvenil do que em seus dois projetos anteriores. Mais interessante ainda é notar que esse teor popular está de mãos dadas com uma forte vontade de experimentar no estúdio. Em Radiosoul, Alfie toca não só guitarra, baixo e drum machine, mas teremim, sitar e violoncelo, por exemplo.
O resultado é mais um daqueles trabalhos que parecem ter sido feitos para os fones de ouvido, já que cada faixa é sempre muito rica nos detalhes que compõem o espaço sonoro – com destaque para as três músicas mais “sérias” do disco: “Vultures”, “Switch” e “Run to Tomorrow”. “Just a Dance”, nas mãos de um produtor genérico, poderia ser qualquer coisa, mas ganha aqui um brilho extra vindo desse esmero, além do reforço de um certo Nile Rodgers na guitarra.
Mais uma vez, Alfie Templeman comprava seu bom gosto e talento, agora com o bônus da experiência refletida nos versos, nas composições e, principalmente, na intenção de fazer uma música tão atemporal quanto pop. Radiosoul é ainda mais especial para quem não só compartilha da mesma saudade, mas sorri largamente ao ver a qualidade da música popular de hoje. E esse disco é um sorrisão do início ao fim.
(Radiosoul em uma faixa: “Radiosoul”)