Resenhas

Audrey Nuna – Liquid Breakfast

Disco de estreia impressiona pela personalidade multifacetada e por transitar naturalmente entre diferentes influências

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Selo: Arista Records/Sony Music
# Faixas: 10
Estilos: Indie, Rap, R&B
Duração: 28'

Se você tiver a impressão de que Liquid Breakfast é muito maior do que sua duração (menos de meia hora ao longo de 10 faixas), saiba que você não está sozinho. Em seu álbum de estreia, Audrey Nuna conseguiu compactar várias das suas facetas musicais de uma só vez, equilibrando coesão entre as músicas e muita personalidade a cada segundo. Ao final da audição, por mais rápida que ela aconteça, o que fica é um impacto tão volumoso quanto o grave de suas faixas.

A norte-americana de 22 anos seguiu a risco a estratégia de um primeiro disco que sirva como uma grande apresentação de sua identidade – palavra que ganhou ainda mais força no zeitgeist desta geração –, seja ao firmar-se dentro do universo Indie, como mulher e como coreana nascida nos EUA. Se esses dois últimos acabam sendo base para grande parte dos comentários, ou escolhas editoriais, a seu respeito, ela vai contra essa maré e investe muito mais de sua energia criativa na parte musical em si.

Digo isso porque a não ser por alguns detalhes, como referências culturais em “Cool Kids” e uma inserção de sua avó falando coreano em “Blossom”, sua ascendência não parece estar no primeiro plano do disco, a não ser quanto a essa ser uma parte formativa de sua identidade – assim como ser mulher, jovem ou estadunidense, por exemplo. Audrey assimila com naturalidade cada componente que faz parte de sua pessoa e, ao invés de cantar sobre isso especificamente, narra algumas situações e sentimentos que já experimentou em um diálogo intencional com o universo musical que o álbum ocupa.

Seja pela escolha de palavras comuns no Trap, Rap e Hip Hop de hoje (como a repetição de “shawty” em “Get Luv”) ou os vários maneirismos em sua interpretação (como as frases de fôlego curto em “Typical”), Liquid Breakfast permite que a artista entre pela porta da frente na festa da estética que transita entre essas linguagens no meio Indie – ou melhor, que ela tenha lugar garantido na ala VIP. Com uma atitude braba, Audrey canta sobre não se importar com o que os outros dizem (“damn Right”) e encarna uma persona cheia de atitude, como manda o figurino desse filão.

Daí ser tão interessante também notar como, à medida com que o repertório se desenvolve (e, acredite, é um disco para ser ouvido na ordem proposta), ela parece baixar a guarda aos poucos e se tornar cada vez mais vulnerável a partir de “Baby Blues”, ou seja, o “lado-B” do álbum. Ela sai de uma postura blindada para ser uma mulher mais “gente como a gente” – igualmente talentosa, mas com outras qualidades. Tem a ver com o conteúdo sentimental que ela canta (“Long Year”, “Space”), mas também com uma linguagem por outros cantos do Indie.

Há espaço para um autotune entre o R&B e o Psicodélico (“Blossom”) até um lado mais Soul e mesmo Pop (“Top Again”, com Saba). Ao passo que as batidas ficam menos agressivas, Audrey explora outras nuances de sua voz, e se mostra uma vocalista ainda mais impressionante que nos momentos versados, tanto na potência vocal quanto na força dramática de sua interpretação.

A mudança não é lá tão drástica entre a primeira e a última faixa justamente pela sensação gradual que toma conta da experiência de escutar Liquid Breakfast na ordem, mas sempre deixa o gosto de uma obra completa. Isso acontece em paralelo à maneira com que Audrey Nuna revela a si mesma através de sua música e, em uma época em que as pessoas são tão reduzidas a apenas um ou dois rótulos, desenha um panorama deliciosamente complexo de sua pessoa.

(Liquid Breakfast em uma faixa: “Baby Blues”)

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ARTISTA: Audrey Nuna

Autor:

Comunicador, arteiro, crítico e cafeínado.