Resenhas

Bobby Gillespie / Jehnny Beth – Utopian Ashes

Dupla usa os aspectos mais atemporais do Rock Alternativo para criar “canções de fim de amor” cativantes e lúdicas

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Das muitas possibilidades de um álbum conceitual, talvez o formato mais amigável seja o de “contar uma historinha”, ou seja, o disco que se propõe a ser uma narrativa propriamente dita na unidade de suas faixas, para além da poesia das letras e do primor dos arranjos. É algo que vem à mente em Utopian Ashes, disco que une duas forças criativas de diferentes gerações: Bobby Gillespie e Jehnny Beth.

Juntos, os dois criaram personagens para narrar o término de um relacionamento ao longo das nove faixas do álbum. Para isso, eles contaram com três membros da banda do músico escocês (a lendária Primal Scream) e o baixista que acompanha a artista francesa em seu projeto solo, paralelo ao que ela faz com Savages. Mas o som trabalhado ao longo do disco tem menos relação direta com o trabalho que ambas as bandas ficaram conhecidas e mais a ver com um Rock Alternativo de caráter bastante atemporal, aquele que mudou relativamente pouco nos últimos 40 anos.

A estética cai como uma luva na temática romântica e melancólica da história proposta, que dá às “canções de fim de amor” uma aura lúdica, de uma grandiosidade quase mítica, de uma nostalgia de um tempo que nem sequer vivemos, abastecida por discos antigos, Sessão da Tarde e qualquer hipsterismo que dobre o tempo recente e reúna todas essas últimas décadas. É um lugar afetivo compartilhado por todos os que acompanham Bobby e Jehnny em qualquer um de seus projetos.

Essa atmosfera se torna a própria narrativa de Utopian Ashes, mais ainda do que a história contada. É uma obra para ouvir com o coração afinado ao melodrama de faixas chamadas “Your Heart Will Always Be Broken”, “You Don’t Know What Love Is” e “Remember We Were Lovers”, todas interpretadas apaixonadamente aos moldes dos clássicos que nunca deixaram as rádios.

Lançado em uma época de muitas “cinzas distópicas” por todo o globo, o álbum traz o ouvinte para um lugar emocional tão sofrido enquanto tema universal (fim de relacionamento), quanto idealizado enquanto o romantismo próprio da cultura pop. Em um pós-mundo sem muita perspectiva de futuro, faz bem cantar um drama como se fazia em um passado tão distante quanto ingênuo.

(Utopian Ashes em uma faixa: “Remember We Were Lovers”)

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Autor:

Comunicador, arteiro, crítico e cafeínado.