Resenhas

Bruna Mendez – Corpo Possível

Sem abdicar de uma fórmula Pop, Bruna Mendez combina sua voz com timbres eletrônicos para desbravar conteúdos pessoais que ressoam

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Ano: 2019
Selo: Independente
# Faixas: 11
Estilos: Pop Eletrônico, MPB
Duração: 36'
Produção: Gianlucca Azevedo, Machado, Pedro Soares e Lucas Romero

Os últimos segundos de Corpo Possível levam o ouvinte de volta à sua faixa de abertura, “Avisa”, com os mesmos versos que iniciam o disco. Nesse breve bis, a música pode ser até irreconhecível para alguns, já que Bruna Mendez canta aqui acompanhada apenas do violão após todo um repertório majoritariamente composto por timbres eletrônicos. É um pequeno bônus que nos mostra que, despida de todos os arranjos, a composição ainda funciona. Mais do que isso, reforça a tese de que há um conteúdo pessoal e sensível nessas canções, materializadas aqui através dos instrumentos e – veja só – do corpo de uma artista.

A voz é um dos elementos principais do álbum, mais do que em seu trabalho de estreia (O Mesmo Mar que Nega a Terra Cede à Sua Calma, 2016). Se antes o vocal se abria como se estivesse em um palco, Corpo Possível parece ter sido feito para os fones de ouvido. Bruna canta baixinho na maior parte das faixas, com pouco ar e quase nenhuma projeção. Com menor volume, a voz fala mais perto do outro e é assim que o clima de intimidade é estabelecido para a cantora ficar à vontade entre seus versos românticos e reflexões sobre sua identidade.

“Corpo Miragem”, a segunda faixa, é a que melhor exemplifica esse universo pessoal presente no disco – mais ainda do que o verbo “sou” presente na primeira música. Climática, vagarosa e lânguida, a canção sussurra: “Quando você me nota/tudo se transforma em imensidão/faz tempo que eu te procuro/faz tempo que eu me procuro”. Mais do que a dinâmica “relação de amor x relação consigo”, a justaposição das pistas de voz, que repousa por cima dos graves, dá a dica de que há sempre muito mais por trás do que ouvimos naquilo que entendemos como a superfície – o primeiro plano musical. 

É um recurso que desaproxima Corpo Possível do território que seu formato e estética o inserem: O da música Pop contemporânea. Sabemos que outras vozes bonitas que falam de amor aproveitam os recursos da música eletrônica para criar canções descartáveis. Bruna, no entanto, segue aqui na mesma direção de seus lançamentos anteriores e aposta em um conteúdo autoral mais denso, de uma poesia que pode ser desvendada com uma calma não encorajada pela pressa do mercado. 

E a boa notícia é o disco funciona também para quem quer só uma audição descompromissada. “Licença” e “Tropical” seguem a tradição daquele Pop brasileiro caprichado, de nomes como Marina Lima e Mahmundi, para você dançar enquanto canta. Já “Pele de Sol”, com Tuyo, pode ser guardada para aquele momento quando o choro precisa vir, enquanto “Transbordo Longe” faz o oposto e traz uma serenidade nem sempre encontrada em um formato Pop como esse.

Talvez seja esse o maior trunfo de Corpo Possível, a maneira como ele consegue utilizar os recursos à mão para criar músicas familiares aos ouvidos na estética, mas que sabem ressoar  mais profundamente com seus significados. No processo, Bruna Mendez ganha notoriedade ao mostrar que não só cresceu dentro do combo compositora+produtora, como também em uma nova maneira de usar sua voz.

(Corpo Possível em uma faixa: “Corpo Miragem”)

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ARTISTA: Bruna Mendez
MARCADORES: MPB, Pop Eletrônico

Autor:

Comunicador, arteiro, crítico e cafeínado.