Resenhas

Cameron Winter – Heavy Metal

Ótima surpresa, estreia solo do vocalista do Geese tem letras viscerais e instrumentação articulada

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Ano: 2024
Selo: Partisan Records
# Faixas: 10
Estilos: Art Rock, Orchestral Pop
Duração: 43'
Produção: Cameron Winter e Loren Humphrey

Heavy Metal, primeiro álbum solo de Cameron Winter, também conhecido por ser o vocalista da banda nova-iorquina Geese, é uma boa e efervescente surpresa musical para esse começo de ano. O título do álbum não se refere ao estilo musical, mas parece metaforizar um outro tipo de peso – o existencial. Consolidado em um período muito mais longo e conturbado do que o previsto, Heavy Metal é um atestado a favor da imagem do artista-perturbado.

Na foto de capa do Bandcamp vemos Winter afogado numa mesa de bar, como se estivesse intoxicado de si mesmo, de drogas, da vida. É esse o espírito, expresso de forma lírica, que temos por aqui. Ao longo de 10 faixas, Cameron Winter vomita e soluça uma bile musical em formato de sinceridade pura, como se Heavy Metal fosse seu âmbar-gris.

Como escrevi, Cameron Winter é vocalista do Geese, nome que acho engraçado porque pensar numa banda de rock com esse nome me remete a essa imagem aqui. De certa forma, embora com uma sonoridade bastante autoral e distinta de seu projeto anterior, é mais ou menos o mesmo espírito que o artista mantém em seu debute solo. Inflamado por angústias internas, Winter se exprime com verborragia, a voz sempre projetada em algum lugar estranho, direto da garganta, entre os dentes, no fundo da língua, em letras muito viscerais e uma instrumentação articulada.

O álbum possui uma oscilação de humores que contribui muito para a dinâmica do trabalho. Por um lado, temos “Cancer of the Skull”, que evoca o imaginário de um corpo envenenado, e de outro, temos “$0”, uma faixa autodepreciativa, mas com beleza reluzente, como se fosse o equivalente sonoro da luz de um fim de tarde que incide num copo de whisky. Como um todo, Heavy Metal flui muito bem, entre temas profundos e outros superficiais, construindo uma sonoridade difícil de definir e muito instigante.

Cameron Winter é uma figura que parece gostar de construir uma narrativa fantástica ao redor de si. Nos textos de lançamento de seu trabalho, por exemplo, declarou que seu álbum foi “composto em porões abandonados, bancos traseiros de táxi, contou com um baixista de cinco anos de idade, um metalúrgico de Boston e sessões ilícitas em várias lojas de guitarra”. Mais do que a necessidade pela verdade, Heavy Metal ajuda Winter a perseguir a sua mitologia própria, ainda em construção. Este é também um sintoma das músicas, e talvez o que melhor funcione por aqui: a mistura indefinida entre confissão e exagero, experiência e desejo, devaneio e memória.

(Heavy Metal em uma faixa: “$0”)

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Autor:

é músico e escreve sobre arte