Resenhas

Car Seat Headrest – Twin Fantasy

Regravação de disco gravado na juventude traz revisão emotiva e sincera de acontecimentos passados

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Ano: 2018
Selo: Matador Records
# Faixas: 10
Estilos: Lo-fi, Indie Rock, Power Pop
Duração: 71:16
Nota: 4.5
Produção: Will Toledo

Às vezes, em nossa vida, nos pegamos em um momento de nostalgia intenso repassando episódios de nossa juventude e adolescência e os analisando à luz de novas experiências. Neste exercício, por mais que sejamos direcionados a considerar que aqueles momentos traduziam uma experiência ingênua e adolescentes de nós mesmos, ainda os guardamos com certo preciosismo, reconhecendo que são parte fundamental de nossa história. Will Toledo, nome a frente do projeto Car Seat Headrest, é um artista que entende bem o significado da nostalgia e, por isso, decidiu fazer algo que é curioso, ao mesmo tempo que complexo e profundo: regravar um disco composto quando ele tinha 18 anos.

Twin Fantasy fora lançado originalmente em 2011, de forma tímida e despretensiosa no Bandcamp. Apesar de escondido, fóruns de discussão levantavam este disco como um clássico da juventude hipster, apegando às letras sinceras e irônicas, bem como à sonoridade Lo-fi típica do Indie do começo dos anos 2010. Toledo disse que este disco nunca pareceu completo e terminado para ele, sentindo que as limitações estéticas o impediam de ir mais longe. Sete anos após o lançamento, agora acompanhado por um selo musical e uma banda, ele decidiu regravar o famoso disco e, apesar disso parecer apenas uma regravação cujo objetivo é apenas uma melhoria técnica, o produto final se revela um encontro com sentimentos passados que parece ter requerido muita força e compreensão.

Apesar de possuir melhorias técnicas ao seu dispor, é curioso como Will Toledo ainda permanece fiel à estética Lo-fi – embora haja uma significativa melhora na produção do disco. O apego parece vir do respeito que o compositor tem por esses acontecimentos, uma vez que a história do romance dos dois garotos narrada aqui é baseada em sua vida. Assim, tudo o que pode ser feito para recapturar o espírito de 2011 é feito, desde as sonoridade escrachadas de guitarras lamentosas até o melodias Indie evocando uma efervescência adolescente. O que tantos desdenham e consideram esteriótipos do Indie-Hipster é a matéria prima desse registro, e não há nada que possa convencer Will do contrário. Em outras palavras, ele não usa esta estética pela conveniência, mas porque ele sentiu e literalmente viveu estes acordes.

My Boy já nos mostra a dualidade do romance, entoando uma melodia triste mas que nos últimos acordes provoca uma reflexão mais otimista de que a solidão não é eterna. Beach Life-In-Death, com seus treze minutos, é uma epopeia oscilante sobre o que existe de mais clichê e real na juventude, a transgressão. Sober To Death traz uma balada sobre o momento da relação em que a raiva toma conta (jogando tudo na cara do outro), mas que secretamente reserva um espaço para a compaixão.

Bodys reflete sobre o dilema da juventude de aceitar que você gosta de algo que seus amigos odeiam, usando uma metáfora sobre julgar pessoas que dançam, ao mesmo tempo em que você quer dançar também. High To Death, quase encerrando o disco, traz uma lamentosa guitarra que sustenta um triste relato de uma pessoa bêbada que se torna amorosa, como se essa fosse a condição para manter o relacionamento narrado no disco. Por fim, Twin Fantasy (Those Boys) ainda tenta fazer as coisas darem certo neste relacionamento, nos deixando com a dolorosa frase “They´re not kissing/They’re not fucking/They’re just having fun”.

Esta nova versão de Twin Fantasy é arrebatadora. Ao invés de trazer uma versão realista do que aconteceu no passado, Will nos entrega a versão carregada de memórias emocionais e afetivas e, com isso, ganhamos de brinde um dilúvio de sentimentos. Não só isso, mas o disco traz a visão adulta sobre esses fatos, então considere que cada uma dessas canções foi refletida centenas de vezes nestes últimos oito anos. Assim, temos um disco difícil, mas necessário. Uma revisão madura e infindável sobre a própria vida do compositor.

(Twin Fantasy em uma faixa: Beach Life-In-Death)

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Autor:

Produtor, pesquisador musical e entusiasta de um bom lounge chique