Resenhas

Dan Auerbach: Waiting on a Song

Disco solo de produtor e multiinstrumentista é retrô por excelência

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Ano: 2017
Selo: Nonesuch
# Faixas: 10
Estilos: Rock, R&B, Pop
Duração: 32:50
Nota: 4.5
Produção: Dan Auerbach

Sabe The Black Keys, a dupla da qual Dan Auerbach faz parte? Esqueça completamente. Este disco é outro papo, ainda que haja uma conexão forte com o trabalho do projeto principal do músico e produtor. Se há algo capaz de distinguir a dupla entre vários imitadores e concorrentes é a capacidade de misturar sonoridades “antigas” do Rock, mais precisamente da década de 1970, com uma abordagem atual, capaz de soar suja e contemporânea ao mesmo tempo, produzindo um efeito bem legal, que tornou-se sua marca registrada por um bom tempo. Tal fato fez Auerbach assumir a produção de vários artistas que desejavam um resgate de suas próprias sonoridades, visando depurá-las de acúmulos indesejados ao longo do tempo, de Pretenders a Dr. John, fazendo de Dan uma dessas referências sonoras, responsável por um novo-velho som. Acontece de quando em quando no Pop e dá pra citar gente distinta como Jeff Lynne e Nigel Godrich como igualmente dotados de “marcas sonoras”.

Dan foi muito além disso em seu álbum solo. O que era enxuto (às vezes em demasia) deu lugar a uma produção mais convencional e uma temática que vai de encontro à sua (até então disfarçada) preferência por sons vintage, não só na abordagem de estúdio, mas na própria composição/execução. Resumindo: Dan gravou um álbum que poderia ser lançado em 1969, cheio de canções memoráveis, tocada por músicos de carne e osso, lembrando muito o que Bruce Springsteen disse uma vez, sobre ser educado por músicas que tocavam no rádio. Este formato de canção, com três minutos, refrão, solo, cheio de beleza melódica, arranjo marcante e temáticas existenciais/amorosas na medida certa, domina gloriosamente as dez faixas. Outra novidade: o Rock mais clássico é apenas um coadjuvante, com Dan navegando mares tépidos do Pop sessentista e do R&B, sem qualquer embaraço.

Falar que Waiting On A Song é um “disco de imitação” é uma burrice reducionista. Tal fato anularia a capacidade de composição que Dan ostenta ao longo das faixas, algo que vai muito além da cópia de formatos. As melodias são redondíssimas, os arranjos grudam na mente e há um time de raposas felpudas de estúdio emprestando talento em cada canção, todos residentes na mesma Nashville onde Auerbach mora, servindo para conferir carimbos de relevância e autenticidade por toda parte. Além deles, convidados especiais e pesos-pesados como Duane Eddy, John Prine e Mark Knopfler dão as caras aqui e ali, encrocantando as gravações e oferecendo nuances preciosas.

Durante quase 33 minutos, o ouvinte é brindado com um diadema de pequenas pedras preciosas de vários quilates e cores. Não é exagero dizer que inexistem faixas ruins ou algum equívoco por aqui. Mas, sim, há destaques inegáveis entre as composições: a faixa-título, logo na abertura, com arranjos de cordas e teclados, introduz uma levada que poderia ser da clássica Sugar, Sugar, sucesso atemporal da banda desenhada The Archies; Malibu Man tem órgão, metais e jeitão de sobra de estúdio de algum cantor da velha gravadora Stax; King Of A One Horse Town parece um épico de bandas como America, novamente com cordas e guitarras na medida certa e melodia perfeita, além de vocais dobrados bem à moda de como costumava ser. Shine On Me é um Rock/R&B invocadinho, com latinidade oculta e a guitarra de Knopfler, uma das mais reconhecíveis da música, logo saltando aos ouvidos. O encerramento com Show Me é a apoteose de fofura melódica vintage possível.

Dan Auerbach talvez não ganhe a atenção do fã menos saudosista, a fim de inovações e surpresas, mas, através de manipulação esperta do tempo, pode apresentar para este mesmo admirador uma ampla gama de sonoridades “inéditas” para ele, com inegável talento e conhecimento de causa para conquistá-lo de vez. No que depender da gente, vamos garantindo a boa cotação por aqui. Uma lindura de disco.

(Waiting On A Song em uma música: King Of A One Horse Town)

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BOM PARA QUEM OUVE: Benjamin Booker, Royal Blood, Jack White
ARTISTA: Dan Auerbach
MARCADORES: Classic Pop, Ouça, R&B, Rock

Autor:

Carioca, rubro-negro, jornalista e historiador. Acha que o mundo acabou no meio da década de 1990 e ninguém notou. Escreve sobre música e cultura pop em geral. É fã de música de verdade, feita por gente de verdade e acredita que as porradas da vida são essenciais para a arte.