Havia considerável expectativa para o segundo álbum de Daniel Caesar. Após a estreia laureada em Freudian (2017) – que rendeu um Grammy de Melhor Performance de R&B para “Best Part”, além de uma indicação a Melhor Álbum de R&B –, o canadense entrou em estúdio para gravar CASE STUDY 01. Mas, entre um disco e outro, a expectativa ganhou contornos estranhos, quando Caesar foi parar nos noticiários por conta de uma polêmica envolvendo YesJulz, uma questionável personalidade cibernética acusada de apropriação cultural. Em uma live, o cantor a defendeu dizendo que o movimento negro estava “muito sensível”. “Por que nós estamos sendo tão maldosos com os brancos?”, disse ele, entre outras falas controversas. Depois, voltou atrás e pediu desculpas, mas o Twitter já mostrava uma avalanche de postagens dizendo que Daniel Caesar deveria ser “cancelado”.
Lançado de surpresa, CASE STUDY 01 revela, na sonoridade e nas letras, um artista (nem tão jovem), de 24 anos, ainda pouco assertivo em sua postura. Há, claro, as mesmas bem executadas influências do R&B orgânico old school que tornaram Freudian tão celebrado. Contudo, elas chegam aqui mais escassas e dão lugar a tentativas de reinvenção, por vezes falhas, escoradas em produções digitais. A ousadia que traz o resultado mais interessante é “FRONTAL LOBE MUZIK”, produzida por Pharrell – também dono do refrão da faixa – com belos synths e graves imponentes marcando a harmonia.
O disco também conta com outras colaborações, como em “LOVE AGAIN”, com Brandy provando porque é uma das vozes mais populares do R&B dos anos 1990. “SUPERPOSITION” também é inteira guiada pela guitarra de John Mayer. Na segunda, Caesar canta: “Life’s all about contradiction / Yin and yang / Fluidity and things.” (“A vida é toda sobre contradição/ Yin e Yang/ Fluidez e tal”). A tentativa de balada introspectiva quase Pop é até bem-sucedida, mas, ainda assim, as letras são um tanto vagas e a saudade do cantor que já nos entregou R&Bs arrasa-quarteirão, como o hit “Get You”, permanece.
As letras do álbum, de modo geral, demonstram uma grande mudança do compositor Daniel Caesar em dois anos: ele parece estar com bem mais… tesão. O romantismo e a devoção a um amor platônico de Freudian perdem espaço para letras que falam sobre transar em cima do piano e papos meio tortos como “Baby, try to understand me/ I’m not a monster, I’m just a man with needs” (“Baby, tente me entender/ Eu não sou um monstro, sou só um homem com necessidades”), em “CYANIDE”.
Ele joga em casa na levada lenta e tradicional “OPEN UP” e se aventura dignamente em produções mais aceleradas baseadas em guitarra como em “ENTROPY” – faixa de abertura que mostra que seu falsete continua em dia. O disco termina com “ARE YOU OK?”, uma longa canção de duas partes, cuja segunda remete imediatamente a Frank Ocean e suas tão amadas transições. No caso de Caesar, entretanto, as passagens não soam tão naturais e arrebatadoras – como o projeto em geral, que é competentemente produzido e tem bons momentos, mas é menos comovente e coeso do que seu antecessor.
Quando o artista despontou há três anos, ele foi na contramão dos conterrâneos e astros canadenses The Weeknd e Drake e deixou para lá o tal “R&B alternativo”, de timbres sintéticos e fácil penetração no mercado. Se, em seu trabalho de estreia, ouvimos um alcance vocal primoroso cantar sob produções revivalistas – e que, por isso, arejaram uma cena tão saturada –, em CASE STUDY 01, temos um artista com pressa de inovar no som e na persona. O resultado ainda tem mais cara de percurso do que de linha de chegada, embora o talento permaneça ali e a evidência de lenha para queimar também.
CASE STUDY 01 em uma música: “FRONTAL LOBE MUZIK”
