Resenhas

Death Cab for Cutie – Thank You For Today

Banda retorna afiada em novo álbum

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Ano: 2018
Selo: Atlantic
# Faixas: 10
Estilos: Rock Alternativo, Indie Rock
Duração: 38:30
Nota: 4.0
Produção: Rich Costey

“Eu, você, nós dois já temos um passado, meu amor”. Este verso, composto por Caetano Veloso há cerca de 50 anos, cai como uma luva na obra de Death Cab For Cutie. A banda e seus fãs definiram a natureza de sua relação naturalmente, ao longo do tempo e dos agora nove álbuns gravados, fora alguns ótimos EPs de tempos idos. Agora, com a chegada deste belo Thank You For Today, esta relação, este compromisso, esta sensação são devidamente reafirmados e revistos. Todo mundo ficou mais velho, algumas novas pessoas chegaram – algumas surpreendentes e próximas de tão distantes – e tudo, de certa forma, mudou. Assim é a vida e a banda é uma das poucas/pouquíssimas que sabe usar este passar do Tempo (maiúscula intencional) a seu favor.

A sonoridade do grupo não mudou, se você quer saber. Tudo que veio à tona com seu primeiro disco, Something About Airplanes, lançado há inacreditáveis 20 anos, continua por aqui. Benjamin Gibbard, o cérebro da banda, é o responsável por esta façanha. Com essas duas décadas nas costas, correspondentes à maturidade e a metade do caminho na ampulheta dessa nossa vida, Gibbard, claro, deixou de ser este pós-adolescente nerd de música e hoje é um quarentão sentimental, perdido num país governado por um brucutu aberrante. Para este tipo de estadunidense, este fato é quase como um mergulho no precipício do inaceitável. Sendo assim, um disco com tantas canções emocionais – e emocionantes – já é, por si, uma declaração de resistência aos tempos truculentos e lamentáveis de hoje.

Death Cab é sobre esse tipo de coisa e escrevo isso com a tranquilidade do não-fã da banda. A capacidade de perceber o modus operandi dos caras, no entanto, é minha tarefa e o que carecteriza essa gente é a sinceridade. Gibbard é um cara que acredita no poder curativo e misterioso das canções. Ele está certo, especialmente quando já tem uma composição como Brothers On A Hotel Bed, que já tem 13 impressionantes anos de idade e ainda é capaz de carregar vibrações sentimentais adjacentes como poucas – mas isso é outra história. As dez faixas presentes no novo disco são portadoras do mesmo DNA, ainda que o exibam de forma mais e menos intensa.

O destaque vai para um casal de canções. Gold Rush, o primeiro single, é uma pequena masterclasse de rock alternativo dos anos 1980, devidamente polido, pujante, remixante, dançante, intenso e portador de boas novas. Seu par é a climática When We Drive, que parece um sol poente entrando pela fresta da janela. Dá pra pensar que se ouve ruídos de gaivotas ao longe, até que a voz de Gibbard surge mixada bem próxima de seu ouvido, com a impressão de estar te aconselhando. Além delas está a beleza de Autumn Love, com pegadas de New Order na areia da praia, as percussivas You Moved Away (que lembra The Postal Service) e Summer Years, que traz a autorreferência em relação a primas distantes como We Laugh Indoors ou Blackin Out Of Friction. Tem espaço até para uma canção rapidinha e melancólica com cara de banal Near/Far bem próxima do fim do percurso.

Thank You For Today não é o melhor disco do grupo, mas é, inegavelmente, sua versão mais atual e fidedigna, que obriga o ouvinte a deixar o passado para trás, conviver com ele e entender que, se tudo der certo, dará para acessá-lo a qualquer hora, sem riscos e com o olhar calibrado pela maturidade do tempo. Parece óbvio, mas é um grande feito.

(Thank You For Today em DUAS músicas: When We Drive e Gold Rush)

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BOM PARA QUEM OUVE: Nada Surf, Modest Mouse, The Shins
MARCADORES: Ouça, Rock Alternativo

Autor:

Carioca, rubro-negro, jornalista e historiador. Acha que o mundo acabou no meio da década de 1990 e ninguém notou. Escreve sobre música e cultura pop em geral. É fã de música de verdade, feita por gente de verdade e acredita que as porradas da vida são essenciais para a arte.