Resenhas

Dinosaur Jr. – You’re Living All Over Me

Ainda no final dos anos 1980, a banda já apontava para o que aconteceria na música da década seguinte sem abandonar as suas raízes

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Ano: 1987
Selo: SST Records
# Faixas: 9
Estilos: Rock Alternativo, Noise, Indie
Duração: 35'
Nota: 4.5
Produção: Wharton Tiers

Na época em que o Dinosaur Jr se preparava, há mais de 30 anos, para o lançamento de You’re Living All Over Me (1987), o trio liderado por J Mascis, com certeza, não imaginava que estava prestes a soltar um clássico do Rock Alternativo. O velho clichê “não-esperávamos-por-isso-estávamos-apenas-fazendo-música”, aqui, é verdade como em poucas ocasiões. Não apenas devido a falta de pretensão evidente nas gravações do disco – o que resultou em uma (hoje, certeira) mixagem meio desatinada –, mas também porque o Dinosaur Jr. foi capaz de antecipar uma série de sons e comportamentos que ecoaria (e muito) durante a década de 1990. Isso tudo em contraste absoluto à rebeldia vendável do Guns N Roses e dos hinos pré-programados para estádios do U2.

Bem mais encorpado e coeso do que o trabalho homônimo de estreia lançado dois anos antes, o segundo álbum da banda revela o seu desejo urgente de dar um novo significado ao peso e à raiva do Rock. “Little Fury Things”, a faixa de abertura, com participação de Lee Ranaldo, é uma explosão de guitarras sujas conduzindo a linha de voz melódica de Mascis. Por sua vez, “Sludgefeast” é uma fábrica de riffs à la Black Sabbath, mas com ganchos lamuriosos que, em certa medida, funcionaram como um ensaio para o que o My Bloody Valentine viria a fazer. O disco ainda conta com pérolas como “In A Jar” e “Raisans”, dois indicadores para o que se tornaria o Post-Hardcore de Hot Water Music e Mineral. “The Lung”, uma canção que conta apenas com duas frases (“No where to collapse the lung / Breathes a doubt in everyone” [Nenhum caso de colapso do pulmão / Respira-se uma dúvida em todo mundo”]) que é transformada em uma sobreposição contundente de guitarras e solos virtuosos.

Ainda há espaço para “Lose”, uma uma vez com Mascis sentando a mão na guitarra, e “Poledo”, faixa acústica composta pelo baixista Lou Barlow, que seguiria o mesmo caminho desplugado com o Sebadoh, banda que formou depois de sair do Dinosaur Jr. Em um relançamento do disco em 2005, foi incluída uma enérgica versão para “Just Like Heaven”, do The Cure, comprovando que o grupo, já naquela época, dirigia para frente, mas de olho no retrovisor. A banda bebeu de fontes antigas – da pungência do Heavy Metal, passando pelo vigor Punk do Buzzcocks, à doçura das melodias de Neil Young – e as regurgitou em embalsamadas pela apatia e angústia de uma geração de adolescentes que viveram os últimos anos da Guerra Fria. Traduzir desencanto em agressividade e inabilidade social em gritaria soou como uma resposta bem mais nervosa ao Pós-Punk, além de ajudar a escancarar a extravagância cínica do Hard Rock reinante.

Vale lembrar que o Pixies havia feito sua estreia meses antes com Come On Pilgrim (1987) – e faria bem mais barulho com Doolitle (1989) – e o Sonic Youth preparava-se para lançar o definitivo Daydream Nation (1988). Portanto, YLAOM surgiu como um farol que virava as costas para o fim dos anos 1980 e passava a iluminar o que ficaria conhecido, enfim, como Rock Alternativo durante a década seguinte. Do Nirvana ao Sunny Day Real State, do Smashing Pumpkins ao Pavement. Após o disco seguinte, o ótimo Bug (1988), Barlow deixou o grupo e o Dinosaur Jr. se tornou banda de um homem só, sob tutela de Mascis, que seguiu com uma discografia sólida. Mas, You’re Living All Over Me é aquele que se destaca como o disco perfeito para o momento perfeito, premeditando o Indie, antes mesmo de se saber o que era o Indie, injetando gás no Grunge e no Shoegaze e coroando a banda como ícone indiscutível do underground. Em entrevista ao The Guardian, há alguns anos, J Mascis, ao ser perguntado se ele se considerava o “padrinho” do Rock Alternativo, encarnou todo o espírito alternativo do Dinosaur Jr. e respondeu: “não sei”.

(You’re Living All Over Me em uma música: “Little Fury Things”)

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