Resenhas

Ebony – Condessa

Rapper carioca soa ousada, ácida e forte em projeto que crava seu lugar entre grandes representantes do Trap nacional atual

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Ano: 2020
Selo: Fresh Mind Co.
# Faixas: 6
Estilos: Trap, Rap
Duração: 14'
Produção: Celo1st, AJ Wav, Nagalli e Pedro Lotto.

“Disco, todo mundo quer que eu lance um disco” – sim, a gente queria muito mesmo. Desde março de 2019, Ebony tem chegado com força nos fones de ouvido dos fãs de Rap e pelos palcos do Brasil. Ao colecionar excelentes participações e singles bem-sucedidos, a ansiedade se acumulou entre a galera do Trap para uma obra assinada pela artista carioca. Valeu a espera. Condessa (2020) é uma coleção enxuta, mas certeira: em menos de 15 minutos, Ebony mostra a que veio e consolida seu espaço entre os Trappers Mais Brabos da sua geração.

Fora a tiração com as cobranças do público, na faixa “Disco”, Ebony rima brincando com as palavras e abre espaço para o também carioca Yunk Vino, outro nome dos mais promissores no Trap nacional, dono do ótimo 237 (2020). Juntos, os dois versam sobre carreira, sexo e drogas. Ao longo das seis faixas, Ebony nos conduz por várias situações de afeto e desafeto, consigo mesma e com o outro. Cada música é uma crônica de uma jovem mulher aprendendo a lidar com diferentes situações e tentando entender seu lugar dentro desse universo instável, em que tudo parece ser muito transitório – da maldade no flat a glock no banco de trás da Bugatti, passando pelo próprio sentimento romântico. Assim, da faixa de abertura até a metade do EP, “Paris”, Ebony vai de “eu sou seu troféu e isso é lindo” a “eu sou tipo medalha: você me quer, porque quer se exibir”. São emoções hesitantes borbulhando desordenadamente a partir de uma voz consistente.

“Lipstick”, “Paris” e “Bourbon” são os momentos mais entregues de Ebony, nos quais ela transparece suas vulnerabilidades, sem nunca, entretanto, descer de seu pedestal – “Fui treinada para ganhar, você quer competir”, ela canta na segunda faixa. É nessa dualidade que o conjunto se sustenta e ganha sabor. Ciúmes, mágoa e insegurança se contrapõem a carinho, devoção e barreiras impostas pelo ego. A margem de sentimentos contemplados é tão grande quanto as formas de interpretação propostas pela trapper, e é essa confluência de sensações e visões que dá ritmo para Condessa. Dos temas às sonoridades, a fluidez com que a MC coloca sua linguagem à mesa é o aspecto mais gratificante de um trabalho que solidifica sua persona. Ebony soa determinada, ousada, engraçada e forte – afinal, exige-se bem mais coragem para expor as ansiedades do que as glórias.

Na produção, vale destacar AJ (no beat tá) que assina três faixas, entre elas “Flat”, a mais cativante do disco. Contando com participação marcante de Sidoka, Ebony entoa um refrão que cria uma atmosfera sensual, com leveza e irreverência. É daquelas músicas que você escuta e canta com sorrisinho na boca. As viradas envolventes certamente terão efeito interessante nas pistas (quando isso for possível). Além de AJ, Celo, Nagalli e Pedro Lotto assinam as produções que servem de base para letras sagazes, profundas e ácidas.

A capa é uma ilustração que remete ao Nascimento de Vênus (1863), de Alexandre Cabanel. Nela, Ebony é um anjo deitado de costas, com querubins pairando a seu redor. É muito significativo que o autor da capa, Calvet, tenha escolhido uma referência de Vênus, a deusa da beleza, do amor e do desejo. Fazer o nascimento de uma Vênus, negra, cercada de anjos negros, é provavelmente a tradução mais sensível de Condessa. Não se deve presumir, portanto, que seja um disco de todo doce, mas, sobretudo, completamente passional.

(Condessa em uma faixa: “FLAT”)

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ARTISTA: Ebony