Resenhas

El Guincho – Hiperasia

Produtor espanhol volta com faceta muito mais experimental

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Ano: 2016
Selo: Nacional Records
# Faixas: 13
Estilos: Eletrônico, Música Latina, Hip Hop
Duração: 41
Nota: 3.0
Produção: Pablo Díaz-Reixa

HIPER ASIA (escrito assim, tudo em letras maiúsculas) é uma franquia de lojas chinesas localizada em Madri que, embora eu não conheça pessoalmente, imagino que corresponda ao equivalente brasileiro do camelô (exemplificado, entre outros, na cidade de São Paulo, pelos shoppings do bairro da Liberdade ou pela Rua 25 de Março).

O ambiente deve ser familiar à maioria, ou seja, lugares abarrotados de pessoas, objetos desorganizados e, em geral, muito baratos e de baixa qualidade. Além disso, numa generalização próxima da caricatura, existe a apropriação de culturas estrangeiras reproduzida em grande escala e fora de contexto: capinhas de celular da Hello Kitty adornadas em glitter, peças de vestuário estampadas de oncinha e DVDs piratas são alguns dos exemplos mais característicos.

De fato, esse tipo de ambiente é marcante, dadas suas cores fluorescentes, seu barulho alto e, em geral, seu caos institucionalizado. E é justamente o fascínio de Pablo Díaz-Reixa (que ataca pelo codinome de El Guincho) por esse lugar que marca o terceiro álbum de sua carreira, intitulado justamente Hiperasia.

El Guincho resolve “transcriar”, portanto, esse ambiente em seu álbum. Por isso, o que observamos ao longo de Hiperasia, musicalmente, são batidas desconexas, um ritmo anti-intuitivo (que parece sempre “puxar para trás”), um cenário abafado e timbres abrasivos, estilhaçados e distorcidos. Tematicamente, além do visual “videogame tosco” com pitadas de Tumblr, temos títulos que circundam o universo do Comix, da Pizza e do Wi-Fi.

A colaboração com a artista islandesa Björk em Biophilia, por sua vez, parece ter influenciado Díaz-Reixa em outra instância além da musical. É claro, é possível deduzir a herança indireta do jovem venezuelano Arca (co-produtor de Biophilia) imersa no caos de Hiperasia, todavia, assim como Bjork, El Guincho expande a experiência de seu álbum para outras dimensões, ao lançar um conjunto de wearables que contém material inédito e exclusivo do trabalho.

Você deve se lembrar do clipe (incrível, aliás) de Bombay, não? Novamente, El Guincho firma uma parceria com o coletivo CANADA para promover seu trabalho com um excelente video, desta vez para o single Comix.

Embora seja difícil de censurar qualquer tentativa experimental do produtor espanhol, vale ressaltar o “perigo” de transformar seu projeto em um fabricante de souvenirs (e merchandising) interessantes ao invés de investir em sua música. A palavra “perigo”, aqui colocada entre aspas, porque, no fundo, não há mal se for essa a intenção da banda (veja os caso dos malucos do Ok Go, por exemplo, que produzem videos tão surpreendentes que acabam por deixar sua música em segundo plano). Coloco essa ressalva aqui apenas porque me parece que El Guincho não pretende (não me parece que deveria, ao menos) abdicar de seu exotismo Afro-Beat Tropicália Eletrônico em nome de um exotismo meramente esquisito.

Afinal, vale termos em mente que El Guincho produziu um álbum temático, quase espotâneo, após visitar uma loja de produtos chineses. Neste álbum, observamos uma parcela muito mais experimental e caótica (e muito menos dançante e digestiva) do que antes. El Guincho não experimenta, além disso, apenas em sua música, mas propõe uma série de acessórios (videos e wearables) que incorporam essa expriência. Não temos, obviamente, o mesmo El Guincho acessível de seis anos atrás, o que pode não ser fácil, mas pode ser muito interessante.

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Autor:

é músico e escreve sobre arte