Resenhas

Emile Haynie – We Fall

Com vários convidados, produtor faz bom álbum Pop sobre dor de cotovelo

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Ano: 2015
Selo: Polydor
# Faixas: 11
Estilos: Chamber Pop, Baroque Pop, Neo Psychedelia
Duração: 46:13min
Nota: 3.0
Produção: Emile Haynie

Discos de produtor não são novidade no Pop, tampouco obra dessa modernidade sem face. Phil Spector, gênio e assassino, já imprimia sua marca – conhecida como Wall Of Sound – em discos de muita gente até lançar um álbum natalino, no qual produzia e arregimentava uma série de artistas com quem havia trabalhado. Se você nunca ouviu falar na figura ímpar de Spector, aconselho que pare de ler agora e vá saber quem foi o cara. Depois volte.

Voltou? Então continuemos. Emile Haynie está longe de ter um décimo do talento e inventividade do velho Phil, mas tem seus méritos na vereda da música dos anos 2010. Ele já assinou produções de vários artistas inseridos no contexto Rap/Hip-Hop, entre eles Kid Cudi e Tinie Tempa e, a partir de 2012, embrenhou-se na mata da canção Pop. Deixou seu nome nas notas de rodapé de álbuns gravados por Bruno Mars, Lana Del Rey, The Rolling Stones, entre outros e solidificou sua presença como um dos importantes pilotos de estúdio da atualidade. Há pouco tempo, Haynie passou por uma decepção amorosa e, subitamente, viu-se envolvido com a concepção de um álbum de canções luxuosas e luxuriantes, supostamente, segundo declarações do próprio Haynie, sua verdadeira paixão musical. E o que ele fez? Hospedou-se num hotel em Los Angeles, montou um estúdio de gravação no quarto e chamou amigos famosos para levar adiante o projeto.

O resultado chega agora com We Fall, na forma de onze canções, interligadas pela ancestral dor de cotovelo e o sofrimento que delas advêm. O instrumental é barroco, cheio de cordas, teclas, vozes, efeitos, bateria solene e um clima que, mais que um pântano de sofrimento ou emoções confusas por conta da ausência da pessoa amada, mais parece um meticuloso roteiro de musical da Broadway ou algo parecido. A impressão que surge é que Haynie já imaginara como seria seu sofrimento desde muito tempo, rascunhando arranjos e situações que estão no álbum. O início já apresenta Adryan Wyatt e ninguém menos que Brian Wilson nos vocais e aclimatação de Falling Apart, sintomática canção que encapsula todo o álbum. É uma canção que tenta atingir a estética beachboyana mas mostra-se deliberadamente nublada e chuvosa.

O desfile de estrelas tem continuidade com o surgimento de Rufus Wainwright e a elíptica Little Ballerina, que tem seus méritos, mas abre mão do potencial dramático que uma interpretação de Rufus pode ter em nome de uma relativa banalidade melódica. Lana Del Rey empresta sua voz à tristonha e fugidia Wait For Life, conduzida por batidas esparsas e efeitos salpicantes aqui e ali. Dirty World, que não traz nenhum convidado, é outro aceno à lógica de canção de Beach Boys sob a chuva, bonita e climática. Kiss Goodbye tem Charlotte Gainsbourg nos vocais e ambiência levemente eletrônica, contrastando com a tendência “orgânica” do resto do álbum. Um tal de Nate Ruess empresta seus vocais para Fool Me Too e suas credenciais o apontam como vocalista de uma banda com temerário nome de Indie Fun. A canção? Bonitinha mas ordinária.

Nobody Believes You repete a presença de Andrew Wyatt e traz um gigante da canção inglesa dos anos 60, Colin Blunstone, ex-Zombies. A canção tem andamento bonitinho e pianos crocantes aqui e ali, abrindo espaço para Come Find Me, com presença de Lykke Li, trazendo sua habitual competência e charme etéreos. Outro monstro sagrado do Pop americano aparece em todo o seu esplendor: Mr.Randy Newman toca piano e canta em Who To Blame e Haynie tem a sabedoria de não interferir em sua performance, exceto por alguns vocais de apoio que não chegam a atrapalhar. O mestre aparece cru e intenso com seu registro cada vez mais castigado pelo tempo, produzindo interessante contraste com Father John Misty e Julia Holter, que conduzem Ballerina’s Reprise com mais intensidade e sofrimento do que o esperado. O fim chega com The Other Side e mais emulações de vocais dos Garotos da Praia e aquela sensação agridoce de esperança e sofrimento, tudo junto, ao mesmo tempo, agora.

Emile Haynie prova com este álbum que tem boas intenções e certo talento como produtor, mas talvez obtivesse resultado melhor se seu álbum não soasse tão planejado. Um pouco de caos e linhas tortas poderiam dar o toque complementar em We Fall, tornando-o realmente uma obra oriunda da dor e da ausência. Como está, ao contrário, parece um trabalho de alguém que quase ansiou pelo sofrimento para poder externá-lo.

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Autor:

Carioca, rubro-negro, jornalista e historiador. Acha que o mundo acabou no meio da década de 1990 e ninguém notou. Escreve sobre música e cultura pop em geral. É fã de música de verdade, feita por gente de verdade e acredita que as porradas da vida são essenciais para a arte.