Resenhas

Francisco, El Hombre – SOLTASBRUXA

Primeiro disco de grupo campineiro propõe um grito forte contra a conjuntura político-social do país

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Ano: 2016
Selo: Independente
# Faixas: 13
Estilos: Folk, Marcha, Axé
Duração: 38:18
Nota: 3.5
Produção: Zé Nigro e francisco, el hombre

Na ocasião do lançamento do EP La Pachanga, pudemos perceber o quão poderosas são as vozes dos integrantes de Francisco, El Hombre. Entoando belíssimas melodias e arranjos, o grupo campineiro nos emocionou com cantos extremamente honestos que nos mostravam com orgulho a descendência latina e, ao mesmo tempo que amplas, tinha um aspecto bastante introspectivo, com temas permeando a esfera do imaginário dos próprios compositores. Entretanto, quase um ano depois deste lançamento, parece que as coisas tomaram uma nova e maior perspectiva. A voz do hombre Francisco era muito poderosa para ficar contida no plano individual e agora a força do coletivo se alia ao talento do grupo para produzir um disco que é mais que um registro, é um brado.

SOLTASBRUXA é uma expressão de um descontentamento, porém longe de ser algo frágil. É uma crítica que, de tão certeira, se revela ácida e, ao mesmo tempo, doce. Com uma produção muito bem executada, tirando de cada instrumento a potência devida para que este grito seja escutado, a base instrumental mantém sólida as influências latinas do grupo, passeando por gêneros como a música Folclórica mexicana, Axé, Marchas e outros. Neste disco, não é só o grito que serve como instrumento para entregar a mensagem, mas também os susurros, a delicadeza e o coro. Afinal, que mensagem é essa?

O primeiro disco da banda resume um sentimento misto que vivemos na atual conjuntura político-social brasileira e, por isso, é natural que ele seja plural em suas temáticas. Seria impossível conceber um trabalho que fala sobre 2016 se apoiando por um único tema. Começamos com Calor Da Rua, nos chamando para a guerra e transmitindo toda a frustração e ânsia pelo protesto. Bolso Nada opta por ser mais direta na crítica, juntando forças com Liniker E Os Caramelows em uma frente única ao deputado Bolsonaro, ou, como a banda prefere se referir, “esse cara escroto/mucho escroto”.

Triste, Louca e Má se encolhe nos arranhos, mas não na mensagem, imprimindo uma denúncia do patriarcado machista e um grito feminino ao proferir com força “Minha carne não me define/eu sou meu próprio meu lar”. Tá Com Um Dólar, Tá Com Deus traça um interessante paralelo com as marchinhas típicas do carnaval dos anos 30, evidenciando uma crise econômica na qual o capital estrangeiro é claramente mais valorizado, afinal, “o dólar vale mais que eu/eita, fudeu!”. E, por fim, Muro Em Branco clama uma esperança pelos anos tensos que se sucederão na política brasileira, com uma analogia fantástica do indivíduo aos pixos de protestos espalhados pelo Brasil: “Eu não nasci para ser muro em branco, não!”.

SOLTASBRUXA faz jus ao título que tem, pois reúne todas as emoções que tem misturadas e nos joga na cara em uma tacada só. É um disco poderoso e edificante, pois traz um reflexo vivo de uma situação complicada no país, ao mesmo que tempo que é uma válvula de escape para as nossas frustrações (que por vezes se confundem com a da banda). Um trabalho bastante maduro por uma banda que tem cada vez mais certeza do caminho que escolheu.

Um registro que não nos deixa Temer jamais.

(SOLTASBRUXA em uma faixa: Muro Em Branco)

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Autor:

Produtor, pesquisador musical e entusiasta de um bom lounge chique