Resenhas

Future Islands – The Far Field

Novo trabalho do grupo mantém fórmula quase inalterada

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Ano: 2017
Selo: 4AD
# Faixas: 12
Estilos: Eletrônica, Pop Alternativo
Duração: 45:14
Nota: 4.0
Produção: John Congleton

Vou confessar uma coisa: sempre que ouço algo de Future Islands, a figura extravagante do vocalista Samuel Herring dançando como se não houvesse amanhã sempre me vem à mente. Da primeira vez que o vi, interpretando o sucesso mundial do grupo, Seasons (Waiting On You), no talk show de David Letterman, não pude evitar a pergunta: “que maluco é esse?”. Não foi com crítica, mas com intensa surpresa, afinal de contas o sujeito não parecia ter qualquer medo de parecer “intenso”, um bom eufemismo para “ridículo” ou algo assim. Tal atitude me fez simpatizar de cara com a banda e seu bom decalque de timbres e maneirismos Tecnopop oitentista. Isso era 2014 e, três anos depois, cá estamos nós com o novo álbum do grupo, este simpático The Far Field.

Em primeiro lugar, é preciso que saibamos que este trabalho segue os mesmíssimos passos do anterior, Singles, o que é bom. As canções, os vocais intensos, o instrumental intencionalmente gélido, evocando memórias de trinta e tantos anos estão no mesmo lugar, mostrando que Future Islands abraça o estilo com amor e convicção, se permitindo transitar por vários matizes, do mais lento ao mais catártico, sem medo de ser feliz. A audácia/fidelidade do grupo em relação ao que acredita como passaporte sonoro é seu supertrunfo na hora de defender as composições. A produção de John Congleton, um habituê em discos alternativos que aspiram grandes audiências, é prova de que o vôo que os sujeitos têm em mente é de altitude elevada e a chancela promovida pelo prestigioso selo 4AD no álbum é a garantia de que a viagem é boa, pode vir, tá quase partindo, partiu.

Congleton conferiu um pouco mais de “organicidade” ao disco, materializada no uso de alguns timbres mais “indies”, medida que limou um pouco da tecladeira admirável que o grupo ostentava no trabalho anterior. Isso não significa que os sintetizadores foram substituídos por guitarras/violões, mas a sonoridade obtida parece menos ousada por aqui. Talvez seja implicância ou purismo do crítico, principalmente porque há canções divertidas como North Star, por exemplo, com sua programação percussiva, que parece ter saído de engenhocas eletrônicas de 1985, feita por algum músico latino tentando soar muito sutil. Samuel dá seu quinhão para compensar eventuais encolhimentos, assumindo de vez o papel de esteio do grupo e unificando tudo, assumindo de vez o papel de “marca registrada”.

O que fica evidente por aqui é o talento dos sujeitos em compor belas melodias Pop, que funcionam em abordagens distintas. Se a desfaçatez em assumir como uma formação Tecnopop oitentista em plenos anos 10 ficou meio comprometida pela abordagem indie, as canções compensam tudo. Há belezuras como Ancient Water, com teclados saltitantes, o baticum de Beauty On The Road, o dramalhão adorável do single Ran e a sensacional participação de Debbie Harry em Shadows, a melhor faixa do álbum, disparado, com um clima de loop temporal, parecendo gravada ontem, gravada hoje, olhando para o amanhã com otimismo, drama e uma paixão que beira a ingenuidade, infelizmente soterrada por um deslizamento de cinismo, pragmatismo e ceticismo.

Future Islands é um esforço sincero e simpático em nome de arroubos, exageros e pouco medo de parecer diferente. Num mundo como o nosso, isso é muito sério e importante. Lindeza total.

(The Far Field em uma música: Seasons)

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Autor:

Carioca, rubro-negro, jornalista e historiador. Acha que o mundo acabou no meio da década de 1990 e ninguém notou. Escreve sobre música e cultura pop em geral. É fã de música de verdade, feita por gente de verdade e acredita que as porradas da vida são essenciais para a arte.