Resenhas

Iron & Wine – Beast Epic

Sam Beam entrega mais um disco de lindas canções ao lado de banda

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Ano: 2017
Selo: Sub Pop
# Faixas: 11
Estilos: Folk , Folk Alternativo
Duração: 35:47
Nota: 4.0
Produção: Sam Beam

Não sei quanto a vocês, mas eu prefiro os primeiros álbuns de Sam Beam à frente de seu Iron & Wine, The Creek Drank The Cradle (2002) e Our Endless Numbered Days (2004). Um motivo justifica minha escolha: a simplicidade cortante destes discos, feitos apenas com a voz (e que voz) de Beam e seus instrumentos de cordas, boas histórias, uma capacidade rara de explorar figuras narrativas e mais nada. Este vazio que ficava para o ouvinte preencher, com suas visões, lembranças e pensamentos é que era o grande charme. Desde então, ainda que tenha feito álbuns maravilhosos, Iron & Wine foi deixando cada vez menos espaço para a imaginação da gente, algo que tornou seu trabalho quase genérico em meio a tantos outros artistas por aí. Repito, o cara é bom, mas nunca poderia abrir mão dessa capacidade de “senta aqui que eu te escuto enquanto canto” que os dois primeiros discos tinham. A boa notícia que este Beast Epic traz é que há mais espaços para preenchermos com autocomiserações e isso é bom.

Com esta proposta mais enxuta, volta também o instrumental econômico. Não se trata de um disco gravado com violões no quarto de casa ou num estúdio próximo, há toda uma (excelente) banda acompanhando Sam Beam. Guitarras, bateria, baixo, teclados, cordas, tudo está aqui, sob a batuta do próprio, mostrando o quanto ele evoluiu como produtor nesses quinze anos (tempo voa) de carreira. Sua persona se adapta melhor ao Folk gentil, calcado ainda na intimidade de um Nick Drake mas com um talento de contador de histórias próprio de um Neil Young ou de um Colin Maloy (The Decemberists), com possibilidade de algumas canções por aqui soarem como composições tradicionais do século 18, caso de Thomas County Law, que tem um arranjo solene, que permite a inserção de cordas em doses homeopáticas até elas tomarem conta de tudo, de About A Bruise, que é sol e verão por todos os seus acordes e achados melódicos e da solene faixa de abertura, Claim Your Ghost, quase trilha sonora de retorno de exploradores dilacerados pelas condições climáticas e saudosos da família.

As canções de amor, ambientadas numa dobra temporal em que o mundo se parece com uma floresta temperada do Hemisfério Norte, são o forte do álbum. Elas assumem várias formas e nuances, movimento no qual Beam exercita sua habilidade – adquirida ao longo do tempo – de diversificar seu discurso estético. Song In Stone é um mini-épico de natureza vanmorrisoniana, com juventude e amor como tópicos principais, representados aqui pela conversa de pianos, violões e violinos, uma coisa linda de se ver. Summer Clouds já é mais dolorida, lenta, em câmera lenta, praticamente um Blues Folk, com uma bateria marcial e arranjo econômico que privilegia a belíssima melodia que caminha sem pressa, como se olhasse para os lados em busca de algo. Novamente o violino vem surgindo como o sol que vence a sombra – ou vice-versa, dependendo do clima do ouvinte, daí a noção de espaço à qual me referi mais acima – e tudo passa a fazer mais sentido na canção.

Há surpresas pelo álbum adentro. Um espírito lúdico e inesperado dá o tom em Last Night, enquanto uma boa levada conduz Right For Sky, dando a ela um espírito simpático de canção de acampamento. Apesar delas, a estrutura do álbum é mais focada num modelo já explorado anteriormente, priorizando os terrenos e artimanhas que Beam já usa. Por exemplo, a contemplação da natureza, outra impressão que a musicalidade de Beam transmite, surge pimpona em The Truest Stars We Know, enquanto a canção de encerramento, Our Light Miles, investe num andamento quase estático, com belo trabalho de vocais de apoio dobrados, dando profundidade ao arranjo. No fim das contas, a familiaridade é total em relação ao ouvinte mais tarimbado e todo o álbum é caloroso e simpático com os neófitos.

“Menos é mais”, “um passo atrás para dar dois à frente”, ou qualquer outra expressão similar, podem traduzir o movimento dado por Iron & Wine por aqui. A decisão foi sábia, ainda que seja possível ver a evolução musical adquirida ao longo dos anos sendo empregada como ferramenta para obtenção de um disco redondíssimo, belíssimo e cheio de canções candidatas à lista de melhores do ano. Escolha a sua e venha caminhar com a gente neste fim de tarde sonoro.

(Beast Epic em uma música: Song In Stone)

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BOM PARA QUEM OUVE: José González, Fleet Foxes, Bon Iver
ARTISTA: Iron & Wine

Autor:

Carioca, rubro-negro, jornalista e historiador. Acha que o mundo acabou no meio da década de 1990 e ninguém notou. Escreve sobre música e cultura pop em geral. É fã de música de verdade, feita por gente de verdade e acredita que as porradas da vida são essenciais para a arte.