Resenhas

JARV IS… – Beyond The Pale

Gravado majoritariamente ao vivo, estreia do projeto de Jarvis Cocker usa sarcasmo e toques literários para explorar o nó cultural civilizatório

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Ano: 2020
Selo: Rough Trade
# Faixas: 7
Estilos: Alternativo, Indie, Art Rock
Duração: 40'
Produção: Jarvis Cocker, Jascon Buckle

Beyond the Pale é o álbum de estreia do projeto JARV IS…. Liderado pelo astuto músico britânico Jarvis Cocker (fundador do Pulp) e gravado majoritariamente ao vivo, com algumas intervenções feitas em estúdio, o álbum é uma espécie de híbrido, chamado de “alive album” pela banda. Assumindo o formato de um mini épico, ele investiga os passos da civilização e os motivos de estarmos neste planeta.

A faixa de abertura, “Save the Whale”, traz um vocalista grave e um tom declamatório. O estilo, uma óbvia homenagem a Leonard Cohen, serve para que Cocker faça um elogio à escuridão. Conceitualmente, a música traz o maior clichê de nossa preocupação ecológica enquanto humanidade – a proteção das baleias –, em voga desde os anos 1980. Em 2020, já passamos para o lado de lá da linha de nossa responsabilidade com o planeta, mas a resposta nunca foi alcançada: evoluímos tecnologicamente, mas o que significa esse tipo de evolução que ignora o ecossistema do qual dependemos para viver?

Mas nem tudo é tragédia por aqui. Cocker, sem dúvida, usa do sarcasmo para compor, mas também se escora em sua verve literária para experimentar novos pontos de vista. Em “Sometimes I Am Pharoah”, por exemplo, ele vê o mundo do ponto de vista de uma estátua. Com um tédio vertiginoso, Cocker explora o nó cultural civilizatório que é a edificação de monumentos e a sua destruição.

Apesar dos temas, que parecem levantar grandes perguntas sem respostas, a produção das músicas não oferece a mesma gravidade. A banda conversa entre arranjos dinâmicos e tudo flui com naturalidade. Mesmo com seu caráter híbrido, tudo se encaixa. “Must I Evolve?” e “Sometimes I Am Pharoah”, por exemplo, são fantasmagóricas e foram gravadas dentro de uma gruta na Inglaterra: nelas, Cocker parece usar o eco enquanto metáfora de uma humanidade que avança sempre se apagando gradativamente. Na teoria e na prática, Beyond The Pale é um pequeno exercício de autocrítica, que traz uma banda saturada construindo ruínas para o deleite da próxima geração.

(Beyond the Pale em uma faixa: “Save the Whale”)

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Autor:

é músico e escreve sobre arte