Resenhas

Kelly Lee Owens – Inner Song

Entre o Dream Pop e o Techno House, a artista galesa apresenta disco sensível, reflexivo e dançante

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Ano: 2020
Selo: Smalltown Supersound
# Faixas: 10
Estilos: Dream Pop, Techno
Duração: 50'
Produção: Kelly Lee Owens

Ao se deparar com um disco chamado Inner Song, ainda mais com uma capa dessas, é provável que o ouvinte que nunca ouviu o nome de Kelly Lee Owens pense que está diante de uma dessas obras autorais intimistas, de alguém que abre o coração por cima de instrumentos orgânicos após um longo processo de introspecção. Bem, com exceção da instrumentação, o segundo álbum da artista é exatamente isso.

O som que a produtora galesa cria parece habitar uma intersecção entre o Dream Pop e o Techno House. Com relativamente poucos elementos e camadas a cada faixa, ela utiliza as possibilidades eletrônicas com grande sensibilidade, quer as músicas sejam instrumentais, cantadas ou apresentem palavras recitadas. Em 10 faixas espalhadas por 50 minutos, o álbum é desses que compartilham não uma mensagem, mas todo um estado de espírito.

Kelly aproveita o aspecto hipnótico de batidas e loops desde a primeira faixa, a instrumental “Arpeggi”, cujo desenvolvimento apresenta o que o título propõe. É a introdução ao universo de modulações e batidas que ganha também letras de frases curtas, baseadas em muitas repetições. “On”, a segunda música, se esbalda nessas qualidades e convida o ouvinte a dançar por um longo momento após a letra.

Tem um cara de “dance it off”, aquela atitude de cair na pista para sublimar os problemas. A partir dali, o público, já hipnotizado, participa da proposta mântrica nos versos e nas batidas para sacar como a artista se sente e como ela lida com suas reflexões. Apesar de alguns momentos de sintetizadores volumosos, como “Jeanette” e “Wake Up” – ambas um prato cheio para fãs de Dream Pop –, o som que marca a audição é o das batidas mais secas e ambientações menos densas.

É assim em “Melt!” e “Flow”, por exemplo, nas quais as batidas e demais elementos parecem espaçados o suficiente para o ouvinte também ter suas reflexões ali dentro (enquanto dança, é claro). Outro momento marcante, talvez o que mais chame a atenção, é “Corner of My Sky”, com a letra declamada pelo lendário John Cale (ex-The Velvet Underground), que também canta o refrão “The rain, the rain, the rain / Thank God, the rain”. Se estendendo por mais de sete minutos, é uma faixa que sabe aproveitar elementos que vão e vêm no loop de versos, assim como a força da interpretação do músico.

Criando uma unidade forte em conceito e em estética para as letras e até mesmo para seu vocal (que parece ter sido criado em laboratório para esse estilo), Kelly não deixa dúvidas sobre seu grande talento como produtora. Mais do que isso, ela se firma como uma artista completa, cuja “canção interior” é um prazer para os ouvidos.

(Inner Song em uma faixa: “On”)

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Autor:

Comunicador, arteiro, crítico e cafeínado.