Resenhas

King Krule – The Ooz

Álbum propositalmente incômodo sabe chegar exatamente aonde se propõe

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Ano: 2017
Selo: XL Recordings
# Faixas: 19
Duração: 1h06
Nota: 4.0

“Tudo o que você faz subconscientemente, como o ranho, a cera de ouvido, seu cuspe, seu gozo, seu mijo, sua merda, sua barba, suas unhas. Você não pensa: “Uau, estou fabricando todas essas coisas constantemente, meu cérebro está criando toda essa meleca, esse campo de força’” – As palavras de Archy Marshall para explicar a inspiração por trás do nome The Ooz (“a meleca”, em tradução livre e, veja só, “porca”) revelam também muito sobre o espírito com que ele trabalhou o álbum, o primeiro em quatro anos sob o nome King Krule.

Logo na superfície, uma audição do álbum percebe facilmente um incômodo bastante proposital, uma vontade de perturbar quase adolescente – a mesma que usa os termos citados acima para descrever a música. The Ooz é longo, repetitivo e, em certos momentos, monótono (literalmente, insiste em um só tom). Ele espanta mais do que convida, discursa mais do que conversa, atormenta mais do que facilmente agrada.

Essa certa grosseria, porém, chega amparada por uma postura Punk que fica muito bem na ambientação de um Indie Rock tenso e obscuro, com influências de um Jazz torto e chapado (as inserções de timbres de sopro, por exemplo, são sempre muito bem-vindas no disco, como na excelente Dum Surfer) e do que ficou conhecido como Pós-Punk, aquele clima pesado e grave que envolve as músicas. E é aí que toda aparência azucrinante ganha novos significados.

The Ooz é um álbum bastante visceral, com narrativas que narram não meras situações, mas as sensações diante delas. Algumas são bastante diretas (“I’m this worthless you see/ Nothing’s working with me”, em Slush Puppy), enquanto outras constróem relações um tanto mais subjetivas, seja no paralelo “Parásito/Paraíso” de Bermondsey Bosom (Left) ou nos ares mais eruditos de Czech One (“As simple as his faith had gone/The burning of the spire/And yet he still searched for warmth/But it was cold by the fire”).

Da leveza forçada de Half Man Half Shark ao tédio melancólico de Lonely Blue, King Krule consegue colocar o ouvinte na situação incômoda que deseja, e quem se permite entrar na obra encontrará mais do que “cuspe, gozo, mijo” etc., estará diante de um daqueles casos de uma produção que faz as escolhas certas para passar sua mensagem, mesmo se ela for muito diferente do ideal publicitário, “instagramado” e plastificado que recebemos diariamente. Ser Punk em 2017 tem a ver com isso.

(The Ooz em uma música: Czech One)

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BOM PARA QUEM OUVE: Crusader De Deus, HOMESHAKE, Savages
ARTISTA: King Krule

Autor:

Comunicador, arteiro, crítico e cafeínado.