Aviso importante sobre Lambrini Girls e seu disco de estreia: nada do que você vai ouvir aqui é uma grande novidade. O duo britânico canaliza toda sua raiva em músicas de natureza punk que soam familiares porque denunciam problemas de nossos tempos que se tornaram praticamente tradições ocidentais: brutalidade policial, misoginia, desigualdade e o abuso institucional que permeia nosso cotidiano. Se Who Let The Dogs Out não é exatamente um remédio para as situações que descreve, é um diagnóstico (talvez, um desabafo) preciso sobre o atual estado das coisas. O registro serve como um grito coletivo, carregado de raiva e frustração, mas entoado com muito sarcasmo e humor corrosivo – uma mistura potente que resulta em 11 músicas altamente explosivas.
Formada por Phoebe Lunny (vocais e guitarra) e Lilly Macieira (baixo), a dupla de Brighton começou sua carreira com singles iniciais que abordavam questões de gênero e sexualidade, como “Help Me I’m Gay” (2022), e rapidamente conquistou alguma notoriedade por suas performances explosivas e altamente politizadas. Após ganhar reconhecimento de nomes como IDLES e Iggy Pop e ser apontado como uma espécie de descendente do movimento Riot Grrrl (de bandas icônicas como Bikini Kill e Bratmobile), o duo tem se provado como uma das bandas mais interessantes e provocativas a sair da atual cena inglesa. O disco dá continuidade a essa trajetória de forma feroz e barulhenta.
Volto a dizer: as letras das Lambrini Girls abordam temas que alimentam o punk por décadas, porém o toque sardônico do duo oferece outros contornos às temáticas. “Bad Apple” abre a obra falando sobre brutalidade policial (citando o caso real da inglesa Sarah Everard), enquanto “Big Dick Energy” e “Company Culture” atacam a masculinidade tóxica, com versos como “Michael, I don’t want to suck you off on my lunch break”. Já “You’re Not From Around Here” critica a gentrificação, enquanto “Filthy Rich Nepo Baby” ironiza os filhos da elite que fetichizam espaços e estéticas da classe trabalhadora. Até mesmo questões mais pessoais entram em cena, como em “Nothing Tastes as Good as It Feels”, que fala sobre transtornos alimentares (e até mesmo cita a modelo Kate Moss e a indústria que ela representava).
Musicalmente, o disco é tão intenso quanto suas letras. As faixas transitam entre o punk e o pós-punk, sempre alicerçados no baixo distorcido de Macieira e nos versáteis riffs de Lunny, que ainda conta com um potente vocal em seu arsenal (muitas vezes berrando as letras). A produção de Daniel Fox (membro do Gilla Band) consegue acentuar a energia visceral das canções, injetando um ritmo frenético ao já caótico som da dupla. Feroz, verborrágico, debochado, “cunty”: chame como quiser, esse disco é mais uma potente amostra dessa dupla que tem muito a dizer e vai esfregar tudo isso na sua cara.
(Who Let The Dogs Out em uma faixa: “Cuntology 101”)