Para os desavisados, pode ter parecido que Little Simz era uma figura nova na música quando seu álbum de 2019, GREY Area, começou a angariar elogios de críticos e aparecer em listas de fim de ano. Mas não se engane: a rapper britânica lançou sua primeira mixtape, STRATOSPHERE, em 2010, nove anos antes de seu terceiro álbum de estúdio ser indicado ao Mercury Prize e da artista viajar pelo mundo, apresentando-se em festivais como o Primavera Sound, em Barcelona, e o Popload Festival, em São Paulo.
É deste ponto alto de sua carreira que Little Simz lançou o EP Drop 6, no dia 6 de maio. Mas a concepção e produção do novo trabalho se deu a partir de um ponto baixo, não só para a rapper como para todo o restante do planeta: Drop 6 começou a ser feito após o primeiro mês de isolamento social devido à pandemia de Covid-19. “Não era um plano para esse ano”, contou Little Simz, em entrevista à BBC Radio 1. Ela disse que o projeto surgiu “out of the blue” – como a arte de capa.
Drop 6 abre com “might bang, might not” (que, respondendo à dúvida do título, é, sim, um banger), já chamando a atenção do ouvinte que se impressionou com GREY Area pela mudança de sonoridade. Muito do EP trabalha com essa mudança: no lugar de instrumentais de jazz rap utilizados no trabalho anterior, temos batidas sintéticas e graves bastante inspirados por gêneros como Drum and Bass e UK Garage – na linha de alguns dos contemporâneos britânicos, como Slowthai, e até de seus próprios trabalhos no início da carreira.
Na mesma entrevista, Little Simz conta que o processo de gravar o EP foi bem similar ao de quando ela começou a fazer a própria música. Isto é, apenas ela e seu equipamento na sala de casa, trabalhando com batidas recebidas dos produtores, sem ajuda externa – talvez por isso a sonoridade mais familiar. O título Drop 6 também é uma referência a uma série de EPs que ela lançou entre 2014 e 2015 e que levam o mesmo título.
Mas a própria Little Simz se encarrega de nos lembrar que, apesar das semelhanças, muito mudou de lá para cá. Faixas como “damn right” e “you should call mum” parecem fluxos de consciência da rapper, atualizando seus ouvintes sobre o que ela vem sentindo e passando após todo o sucesso no ano passado. Os flows também parecem mais dinâmicos e inconstantes, como se ela tivesse muito a falar em um curto período (ao todo, as cinco faixas do EP somam 12 minutos) e não soubesse o que dizer primeiro.
Uma confiança renovada e reafirmada constantemente ao longo do trabalho é o principal efeito do sucesso recente da rapper. Na primeira faixa, Little Simz diz que “vocês não viam nada como eu desde a Lauryn Hill nos anos 90” e conta toda a trajetória que a levou ao topo de seu jogo com GREY Area (“Nada de escada rolante / Tivemos que subir os degraus”, diz). Mas o EP também é uma lembrança de que nem tudo são flores após o sucesso, e, em suas faixas mais pessoais e íntimas, ela discorre sobre o medo de falhar e a insegurança envolvida em ter atingido o patamar pelo qual tanto trabalhou.
Drop 6 marca uma transição para Little Simz em muitos sentidos possíveis. Uma transição sonora e de momento de carreira e, especialmente, uma transição de vida e de modelo de sociedade com o isolamento social e a pandemia. Apesar de curto, é um trabalho inconstante, mas com uma razão para tal: funcionar como um mapa mental de uma artista enfrentando diversas mudanças em seu interior e exterior. Como a própria rapper escreveu num post sobre o lançamento do EP, “the only way out is through” (“o único caminho para o fim é através”).
(Drop 6 em uma faixa: “might bang, might not”)