Resenhas

Morrissey – Low in High School

Bardo inglês volta em disco equivocado

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Ano: 2017
Selo: BMG
# Faixas: 12
Estilos: Pós-Punk, Rock Alternativo
Duração: 53:25
Nota: 2.0
Produção: John Chiccarelli

Guardando algumas proporções, Morrissey é uma espécie de Caetano Veloso britânico, pelo menos em termos de grau de polêmica e do misto de amor/ódio que a imprensa nutre por sua persona. Se o espectro musical do “mais importante inglês vivo” não é tão amplo quanto o do nosso baiano, Moz é um cara no qual devemos prestar atenção, nem que seja para discordar do que ele diz. No caso, suas frases, letras e álbuns são peças de quebra-cabeças dispostas sobre um grande espaço para seu encadeamento que, já avisamos logo, nem sempre fará muito sentido. Sendo assim, é com este misto de interesse e pé atrás que saudamos a chegada deste décimo-primeiro trabalho de sua carreira solo, Low In High School.

É bom que se diga: este disco é fraco e bem inferior ao anterior, o ótimo World Peace Is None Of Our Business (2014), tanto em termos líricos quanto musicais. Ambos são álbuns em que Morrissey se permitiu certa ousadia estética, com elementos eletrônicos salpicados pela produção eficiente de John Chiccarelli e com o próprio uso de metais e cordas em algumas faixas, trazendo certo frescor ao esquemão morrisseyano de sempre, calcado no bom e velho Rock de têmpera Glam/Pós-Punk. A canção que talvez seja mais emblemática dessas adições seja I Bury The Living, com mais de sete minutos de duração e um ar que lembra alguma coisa que Moz poderia ter feito em fins dos anos 1990, mas que preferiu deixar pra lá. O maior problema do disco, no entanto, é sua carga lírica, bem confusa e, porque não dizer, conservadora e desorientada. Parece que Morrissey não teve muita habilidade em manipular seu humor negro, que lhe rendeu tantas glórias no passado, mas que, hoje, 2017, parece uma sucessão de piadas confusas de mau gosto. Só para ficarmos na mesma I Bury The Living, uma canção que se pretende anti-guerra, ele vem com o temerário verso “Gimme an order, I’ll blow up a border, Gimme an order, I’ll blow up your daughter”, que, sim, pode falar sobre a questão de termos o mundo nas mãos de quem porta armas, mas que soa totalmente descuidado em meio ao contexto mundial atual.

Infelizmente, os erros são maiores em Low In High School. Sendo bem justo, há uma única canção digna de figurar no melhor do cânon do cantor, é a bela e intensa Home Is A Question Mark, que traz uma das melhores performences vocais recentes do sujeito, envolta no seu ambiente natural de guitarras e melodias em câmera lenta, lembrando alguma faixa de Vauxhall And I, de 1994. Além dela, dá pra passar a mão na cabeça de Jackie Is Only Happy When She’s Upon The Stage, correta; I Wish You Lonely e, vejamos, do single Spent The Day In Bed, ainda que esta seja uma das mais bobinhas canções já assinadas pelo bardo de Manchester.

Há inúmeras pisadas na bola, quase sempre no campo opinativo político internacional, no qual Moz não vai muito além de um inglês típico de 50 e tantos anos de idade. In Your Lap é uma desencarnada balada de piano e voz, que soa pretensiosa e desconexa. Ela é sucedida pela péssima The Girl From Tel-Aviv Who Wouldn’t Kneel, que se constitui num momento raro de coerência, falando sobre uma peça de teatro cuja personagem principal é uma escritora judia que foi assassinada pelos nazistas em Auschwitz. Israel volta a ser tema, com uma canção homônima, que encerra o álbum, fazendo uma apaixonada saudação ao estado judeu, materializada no verso “They who rain abuse upon you, They are jealous of you as well, Love yourself as you should, Israel”, abertamente contra os boicotes culturais que muitos outros artistas defendem em relação ao país. When You Open Your Legs, a despeito do título que poderia ser de um funk proibidão, fala novamente sobre política no Oriente Médio, sempre sob um ponto de vista questionável e que sugere certa desinformação. Em seguida, num movimento contraditório, ele engata Who Will Protect Us From The Police?, atacando as forças policiais de uma maneira geral, dizendo de que “We must pay for what we believe, we must be killed for what we believe”, com direito a uma menção á Venezuela e a questão eleitoral no país sulamericano, a qual talvez Moz não conheça completamente.

Resumindo a ópera: este é um dos discos mais fracos da carreira de Morrissey, equivocado, conservador e que não mostra – ou só agora mostra – a face do artista. Isso é um assunto para fãs e/ou não-fãs. Nosso amigo Stephen faria mais negócio se soltasse apenas um single, a bela Home Is A Question Mark e voltasse, quem sabe, no ano que vem. Bola foríssima.

(Low In High School em uma música: Home Is A Question Mark)

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BOM PARA QUEM OUVE: Suede, Joy Division, Pulp
ARTISTA: Morrissey

Autor:

Carioca, rubro-negro, jornalista e historiador. Acha que o mundo acabou no meio da década de 1990 e ninguém notou. Escreve sobre música e cultura pop em geral. É fã de música de verdade, feita por gente de verdade e acredita que as porradas da vida são essenciais para a arte.