Resenhas

Neil Young – Storytone

Novo disco de Neil Young é decepcionante e confirma má fase

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Ano: 2014
Selo: Reprise
# Faixas: 20
Estilos: Rock, Folk, Blues
Duração: 78:37
Nota: 2.0
Produção: Niko Bolas e Neil Young

Um esforço de memória é necessário para apontar o último grande álbum lançado por Neil Young. Lampejos de relevância vieram em Le Noise (2010, mais pela produção de Daniel Lanois), em Chrome Dreams 2 (2007, mais pelo fato de ser um compêndio de canções antigas) e em Praire Wind (2005) e Silver And Gold (2000), muito por serem discos puxados para a persona Folk de Young, talvez a sua mais bem resolvida mutação permanente. O fato é que o velho cantor e compositor canadense está em grave entressafra autoral, tendo recorrido até a álbuns de regravações, como o horroroso Americana (2012), que destruía canções tradicionais dos ianques e A Letter Home (deste ano, com produção de Jack White), com utilização de material obsoleto de registro sonoro, mais como forma de protesto contra a indústria musical malvada do mp3 e sua compressão, responsável pela perda dos timbres mais graves.

Tal discussão sobre a modernidade e as formas de ouvir música, além da obsessão por carros elétricos e ecologia (sob a ótica só dele) levaram Young a se tornar um chato, algo inédito em sua carreira. Não é a primeira entressafra criativa que ele atravessa, sua produção na década de 1980 tem vários álbuns considerados fracos como Trans (1983), Old Ways (1985) ou This Note’s For You (1988) mas todos eram mais inquisidores, audaciosos, inventivos. Termos como “chato”, “aborrecido”, “ranzinza”, eram adjetivos que não cabiam nas descrições sobre Neil, mas sua aparição no filme Sound City* (2013), defendendo de forma xiita a preponderância das velhas formas de gravar, fazer e ouvir música já apontava para um momento mala. Agora, com o lançamento de Storytone, eu vos aviso: está liberado dizer que Neil Young é um mala. Trata-se um álbum equivocado, enorme e com ares de grandeza, algo também inédito na trajetória do homem. São dois discos, com dez canções cada. O primeiro traz o repertório de Storytone gravado com acompanhamento reduzido, seja com violão/guitarra ou piano. O segundo volume contém abomináveis versões das mesmas canções em arranjos inexplicáveis para big band ou orquestra com 92 (!) integrantes.

O manejo da orquestra, algo que poderia jogar a favor em casos de composições fracas, é banal, empapuçado, mal feito. A primeira canção, Plastic Flowers se sai muito melhor na versão voz/piano. Quando surge a orquestra, logo no início do segundo disco, a impressão é de estarmos diante de uma montagem, tamanho o desajuste entre o timbre de voz de Neil e o arranjo. Who’s Gonna Stand Up passa de uma canção Folk de protesto ingênua para uma massaroca sonora com cordas dramáticas e sem sentido. A letra, falando de boicotar petróleo e fontes de energia poluentes poderia ter a autoria de um aluno do ensino médio. I Want To Drive My Car é outro exemplo do péssimo nível das composições: Young repete o título exaustivamente, evocando a tradição das canções de canto/reposta, em meio a um arranjo blueseiro interessante para, mais tarde, soterrar qualquer mérito pela sutileza numa levada de Big Band constrangedora e sem qualquer motivo.

Say Hello To Chicago tem um arranjo econômico de piano e gaita, tudo a cargo de Neil, que alia a fragilidade de sua voz com a delicadeza esparsa dos instrumentos, para, mais tarde, fazer da canção um pastiche do pop americano cinquentista de Sinatra e tais, com constrangimento de sobra. A mesma regra vale para todo o álbum: composições fracas no primeiro disco, constrangimento musical no segundo. Para não ser injusto, há uma canção com força para sobreviver a essa fase ruim: a versão solo de All Those Dreams, com melodia linda, mensagem positiva de Natal e Young no meio do caminho entre a doçura e o desespero vocais. A variação orquestral não chega a irritar, apesar de ser, como todas as outras nestes termos, dispensável.

Storytone é um exercício vazio de megalomania, vindo de um artista com crédito na praça mas que está há tempos no vermelho. A essa altura do campeonato, Neil deveria se dedicar aos relançamentos de seus trabalhos mais clássicos e gravar álbuns acústicos e delicados, algo que ele sempre fez bem. Uma pena.

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BOM PARA QUEM OUVE: David Crosby, Ryan Adams, Fleet Foxes
ARTISTA: Neil Young
MARCADORES: Blues, Folk, Rock

Autor:

Carioca, rubro-negro, jornalista e historiador. Acha que o mundo acabou no meio da década de 1990 e ninguém notou. Escreve sobre música e cultura pop em geral. É fã de música de verdade, feita por gente de verdade e acredita que as porradas da vida são essenciais para a arte.