Resenhas

Nicolas Jaar – Telas

Sexto disco oferece imersão no universo sinestésico e ilimitado do produtor a partir de projeto multiplataforma

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Ano: 2020
Selo: Other People
# Faixas: 4
Estilos: Experimental, Avant-garde
Duração: 58'
Produção: Nicolas Jaar

“Por onde começar a escutar?” é uma pergunta capciosa, principalmente quando se trata de uma obra tão rica quanto a de Nicolas Jaar. O produtor chileno-americano colocou à mesa formas tão inventivas de se abordar gêneros como House, Techno e Minimal que uma escuta cronológica por seus discos seria meramente uma formalidade.

Cada proejto pesca a atenção do ouvinte em determinados pontos e, assim, o universo rico que Nicolas Jaar construiu em sua carreira não segue aquela típica máxima de “evoluir” a cada disco e de encontrar, em um registro específico, um auge criativo. Tudo parece ser um grande auge. Sua obra evoca a imagem de um solo fértil, no qual não existe começo ou fim. Apenas uma totalidade de criatividade pulsante e inquieta, que a cada investigação arqueológica traz novas descobertas.

Nicolas Jaar não se firma em lugares específicos e delimitados – e seu sexto disco de estúdio comprova isso de forma simples e categórica. Telas é um trabalho multiplataforma sobre a construção de um terreno visual, em parceria com o artista gráfico Somnath Bhat e o criador digital Abeera Kamra e disponível online. Segundo Jaar, esta obra audiovisual foi imaginada inicialmente como um terreno relativo a panspermia, no qual nenhuma matéria (seja ela física ou em outra forma) tem uma sólida e imutável origem. Assim, quando nos deparamos com as quatro faixas de cerca de 15 minutos cada, adentramos no solo fértil de Jaar por meio de um recurso visual extremamente pedagógico.

As texturas nebulosas se juntam a elementos étnicos e sintetizadores em uma grande amálgama pulsante. A sensação de movimento produzida no visual ganha sentido quando colocada junto aos sequenciadores analógicos lotados de reverb. Mesmo a aparente mistura de elementos gráficos difusos – e confusos em determinado momento – é orientada pelo flerte com a Ambient Music. Tudo isso para mostrar a particularidade do universo jaariano: a multiplicidade de focos. O produtor consegue captar nossa atenção de diversas formas e, muitas vezes, simultaneamente. Talvez dessa sensação surja o alicerce para uma outra definição que Nicolas Jaar dá para Telas: um disco em sua forma líquida. A maneira como essas composições preenchem diferentes formas e significados para espectadores traz um sentimento muito imersivo. Tal qual o registro visual, temos a sensação de adentrar naquilo que o álbum propõe.

Telas é um dos inícios possíveis para começar a se conhecer os fantásticos microcosmos de Nicolas Jaar. O trabalho audiovisual potencializa as sinestesias vivenciadas, colocando o ouvinte também como ativo neste processo – afinal, cedemos parte de nossas vivências para completar os significados ocultos desse disco. O aspecto liquido do trabalho vem como uma metáfora eficaz dentro do trabalho do produtor. Como a água que nutre o solo em variadas direções e, ao mesmo tempo, é um universo fechado em si mesma.

(Telas em uma faixa: “Telencima”)

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ARTISTA: Nicolas Jaar

Autor:

Produtor, pesquisador musical e entusiasta de um bom lounge chique