Resenhas

Nobat – Estação Cidade Baixa

Novo disco do mineiro comporta sensibilidade e descobertas em uma trilogia de EPs

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Ano: 2017
Selo: Ultra Música
# Faixas: 9
Estilos: Folk, MPB, Post-Rock
Duração: 38:23
Nota: 4.0
Produção: Leonardo Marques

Uma das coisas mais fantásticas de ser um compositor é como seu olhar sobre diferentes objetos tende a revelar percepções novas. O mineiro Nobat já mostra isso há algum tempo em sua discografia. Mais do que experimentos sonoros, suas canções parecem ser quase um sexto sentido pelo qual o músico conhece seu mundo, tateando seu cotidiano com sensibilidade e desvendando suas possibilidades. Dessa forma, faz sentido pensar que sua mente musical não para nunca, fato este que fez de sua turnê uma experiência completamente nova para que sua percepção pudesse criar novas sensações. Assim, surge seu novo disco e, diferente dos outros, o compositor resolveu tratá-lo não como um registro só, mas uma trilogia de curtos EPs, o que traz uma dinâmica bem interessante a ser apreciada.

Estação Cidade Baixa traz respectivamente em seu título os nomes dos pequeno EPs contidos no disco. É interessante que Nobat faz questão que esta divisão fique clara e, embora o ato de dividir possa passar a sensação de uma espécie de separação e desunião, na verdade, é justamente o contrário que vemos por aqui. Tratar da Estação, da Cidade e da Baixa confere a cada parte uma atenção especial, como se a percepção de Nobat criasse microcosmos sobre estes elementos. Ou seja, a divisão vem aqui como uma atenção especial e, por ser dada de forma igual, as formas acabam dialogando entre si. Dessa forma, podemos interpretar o disco de duas maneiras: observando e escutando as peculiaridades de cada EP ou entendendo o processo e as relações que surgem entre eles contemplando as melhores características da sonoridade do mineiro. Entre elas, a introspecção, a criação de texturas hipnóticas, a sinceridade, o cotidiano fantástico e o eterno apego pela música brasileira.

Estação lança um olhar sobre as idas e vindas das pessoas em nossa vida. Assim, ela tem um olhar bastante contemplativo, como se estivéssemos realmente em uma estação de trem olhando estas passagens. Maria Clara, por exemplo, é como se estivéssemos observando o nascer deste fluxo de pessoas e Bia*, o auge da movimentação – claro, feita de uma forma doce conhecida das canções do mineiros.

Em seguida, o músico nos convida para sair desta estação e explorar os arredores da Cidade, no caso Belo Horizonte. Aqui as coisas são mais expansivas, mas sempre tendo em vista que estamos vendo as coisas pelo olhar de Nobat. mar_la fica cada vez maior em seus arranjos mas consegue captar uma espécie de aura urbana, que mistura a grandiosidade das edificações, mas reconhece uma espécie de solidão introspectiva neste processo.

Por fim, Baixa completa este processo, tornando o olhar para o não-concreto: as relações, os abusos e o afeto. O cover de Desentoado, originalmente interpretado pelo Grupo Raízes em 1974, traduz bem o aspecto pessoal do disco de Nobat em que, mesmo que ele toque música de outros, ele o faz de sua maneira. Outra faixa desta terceira parte da trilogia que merece destaque é Eu Não Morreria Por Ti que, por meio de uma mistura de humores sobrepostos, nos guia pelos labirintos claustrofóbicos das relações e seus caminhos enrolados.

Nobat nos entrega em Estação Cidade Baixa uma nova forma de olhar para seu trabalho. É uma tentativa de potencializar ao máximo sua capacidade musical, ao mesmo tempo que investigando o espaço que o rodeia e a si mesmo. Um disco sobre descobertas fantásticas e cotidianas.

(Estação Cidade Baixa em uma faixa: Eu Não Morreria Por Ti)

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BOM PARA QUEM OUVE: César Lacerda, Los Hermanos, Cícero
ARTISTA: Nobat
MARCADORES: Folk, MPB, Ouça, Post-Rock

Autor:

Produtor, pesquisador musical e entusiasta de um bom lounge chique