Resenhas

Os Mutantes – Fool Metal Jacket

Grupo brasileiro retorna em uma formação praticamente gringa. Canções em inglês se misturam a volta de uma psicodelia intensa, confira aqui o resultado final.

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Ano: 2013
Selo: Krian Music Group
# Faixas: 12
Estilos: Rock Psicodélico, Rock Progressivo
Duração: 45:19
Nota: 3.0
Produção: Os Mutantes

Os Mutantes são um exemplo claro da teoria do inconsciente coletivo do psicológo Carl Jung. Nela, de forma simplista, podemos considerar o mundo como uma grande cabeça pensante, em que mentes de todos os lugares compartilham ideias e fazem curiosamente surgir em lugares diferentes, pensamentos indiretamente semelhantes. Foi assim que o grupo brasileiro em plena ditadura militar criou uma das vertentes do Rock Psicodélico nacional, que ultrapassou fronteiras e se tornou incrivelmente popular nos EUA e Reino Unido, durante o auge do movimento hippie e posteriormente com fãs distintos, tendo declarado o seu amor pela banda tipos como Kurt Cobain e David Byrne. É por isso que após a sua volta no morno Haih or Amortecedor, o grupo (ou o que sobrou dele) começou a gravar composições em inglês, fugindo do típico rítmo dos verbetes brazuca. Em Fool Metal Jacket vemos uma continuidade de tal escolha artística, um disco surpreendente.

Digo isso porque aqui Os Mutantes são basicamente Sérgio Dias, e só. Arnaldo Baptista ou Rita Lee já não fazem mais parte do grupo há longas décadas, salvo algumas esparsa reuniões pontuais. Logo, um disco em inglês, feito por um único membro remanescente poderia ser um tiro no pé certeiro. Entretanto, a psicodelia envelheceu bem e o advento de músicos mais novos trouxe uma certa energia perdida por Dias com o passar do tempo. A obra é divertida e encontra uma musicalidade e orquestração semelhante às décadas de 1960 e 1970. Aqui vemos os instrumentos sendo realmente tocados e experimentados enquanto temas famosos naquele período são abordados livremente. Exemplos como Ganja Man, faixa tropical com sua guitarra ritmada e percussão latina, falando sobre maconha. Ou a orquestral canção de encerramento Valse LSD, composta a partir de cítaras e um tom mais épico.

Aliás, a unidade que conduz todo o disco é a própria psicodelia e suas diferentes formas. O peso é imposto na faixa título, baseada em um baixo distorcido e bem marcado enquanto Dias emana momentos semelhantes ao que vemos recentemente com Nick Cave & The Bad Seeds. Tal tema também é visto em Picadilly Willie versão mais intensa de um Rock feito exaustivamente pelos Beatles no seu período de existência. No entanto, o toque irônico e ácido do grupo “tupiniquim” faz estas faixas se tornarem bem mais interessantes do que a simples constatação de uma semelhança musical.

Belas baladas são feitas como na confessional The Dream is Gone, “I lost my home, my dream is gone, I on the road, nowhere to go”, feita com uma sanfona e uma guitarra bem delineada pela faixa, enquanto o refrão traz um momento bem Pink Floydiano. Ou To Make It Beautiful que tem um toque de Led Zeppelin, lembrança de suas faixas calmas e cuidadosamente feitas para realmente impressionar. A brasilidade aparece timidamente em Once Upon A Flight, música que lembra muito Novos Baianos e o seus momentos de Rock Psicodélico do sertão brasileiro, assim como no único momento cantado em português Eu Descobri. Esta, aliás, só é interessante devido à quebra temática ao trazer de volta a língua materna do grupo original.

Voltando as origens e trazendo um disco coeso e muito bem produzido, Os Mutantes conseguem desempenhar um bom papel ao realizar um trabalho que honra o selo que o nome da banda pede. No entanto, vemos aqui grandes recriações ou inspirações alheias, fenômeno curioso para um grupo que costumava inspirar os outros e não ser facilmente influenciado em seu som. O que tornou o grupo único foi a sua capacidade de agradar públicos que nem conseguem pronunciar corretamente a palavra “brasileiro”, e assim se tornarem grandes nomes da música Psicodélica. Em inglês, e lançado primeiramente para o público externo demonstram que Fool Metal Jacket tem uma maior preocupação em agradar os gringos do que os brasileiros. Talvez este seja um grande mercado para Os Mutantes, mas ouso dizer que muitas pessoas aqui admiram ainda mais o trabalho do seminal grupo, valorizando a música nacional. Quem sabe, uma volta às origens não traga uma obra, além de bem produzida, mais enraizada no nosso país? Enquanto tal fato não ocorre, o inglês é propagado e curiosamente diverte, mesmo soando um pouco genérico.

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Autor:

Economista musical, viciado em games, filmes, astrofísica e arte em geral.