Falamos de Paul Simon recentemente, documentando sua despedida dos palcos, que aconteceu há poucos dias, em Nova York. Ali, perto de seu lugar de origem (Simon é de Newark, Nova Jersey), ele se reencontrou com público e pendurou seu violão. Nada mais justo, é hora de descansar, certo? Errado. Ele planejou um outro evento, praticamente paralelo, para marcar esse momento e manter acesa a ideia de que, mesmo longe dos shows, seguirá atento e, dependendo da inspiração, produtivo. Este é o cenário que assiste à chegada de In The Blue Light.
O conceito do álbum é reler canções que Simon julga importantes em sua carreira mas que jamais receberam a devida atenção. Sabemos que o compositor nem sempre escolhe seus hits e acaba cantando faixas com diferentes apelos. Sendo assim, este álbum é uma rara ocasião para que um dos mais importantes compositores do século 20 mostre ao público quais suas criações mais idiossincráticas, preferidas, injustiçadas. O critério é generoso com as interpretações que gera. De fato, das dez composições pinçadas, apenas uma – Darling Lorraine – está numa coletânea de Paul Simon intitulada The Essential Paul Simon. As outras nove são azarões e/ou propriedade mais afeita aos fãs.
Simon é um grande artista e não entregaria releituras simplórias. Ele recrutou um timaço de músicos que vão do Jazz ao Pop/Rock e tangenciando o Clássico, para refazer essas canções. Gente como Wynton Marsalis, Bill Frisell, sua esposa Edie Brickell, o grupo YMusic e até Bryce Dessner, de The National, para materializar suas ideias de releitura. O resultado é sempre inserido uma espécie de “pop de câmara”, com variações para os estilos originais. A voz segue firme e com timbre doce característico, escondendo facilmente seus quase 77 anos de idade. Outro dado interessante: das dez faixas, cinco são releituras de composições gravadas originalmente entre 2000 e 2011, espaço de tempo em que ele lançou três álbuns.
Nenhuma gravação do disco supera seu original, é bom que se diga. Mas há versões que igualam a força ou mostram novas dimensões. A beleza surreal de Rene And Georgette Magritte With Their Dog After The War, de 1983, ressurge com arranjo de cordas e violão, ganhando solenidade e cerimônia, porém perdendo a narrativa original. Love, de 2000, tem a melodia belíssima ressaltada, ganhando em emoção, enquanto a beleza espiritualística de Questions For The Angels, a mais recente, de 2011, é levada para um ambiente quase sacro, talvez mais apropriado para sua narrativa de questionamentos sobre outras esferas.
Paul Simon ainda é um cronista do cotidiano e capaz de colocar em letra e música suas observações. Às vezes a aposentadoria, por melhor e mais justa que seja, pode ser um elemento de potencialização criativa. Seria mais legal – e aqui falo como admirador do trabalho do cara – que ele se despedisse com um álbum de inéditas. Vamos acompanhar.
(In The Blue Light em uma música: Rene And Georgette Magritte With Their Dog After The War)