Resenhas

Ruthven – Rough & Ready

Com estética “retrô-futurista”, estreia do músico londrino combina influências clássicas a uma produção moderna

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Ano: 2024
Selo: Paul Institute
# Faixas: 12
Estilos: R&B, Pop
Duração: 48'
Produção: A.K. Paul, Ruthven

Ruthven, nome artístico do músico londrino Sean Nelson, trilhou um caminho singular até o lançamento de seu disco de estreia, Rough & Ready. Antes de se dedicar exclusivamente à música, ele passou quase uma década como integrante do corpo de bombeiros de Londres. Lá, começou a escrever suas canções entre períodos de calmaria e emergência, criando esboços do que viria a ser sua primeira obra. Em 2017, foi descoberto por A.K. e Jai Paul e convidado a integrar o Paul Institute, selo e incubadora de talentos (que em 2024 também lançou o ótimo debut de Fabiana Palladino), comandado pelos irmãos Paul. A parceria foi essencial para Sean lançar naquele mesmo ano o single “Evil”, o pontapé inicial em sua carreira que seguiria com bons, porém esparsos, lançamentos. O tempo foi crucial para o amadurecimento do artista e das ideias que viriam a se tornar as 12 canções que ouvimos aqui.

A produção de Rough & Ready foi um processo longo, não só pelo fato do músico ter refinado suas ideias iniciais ao longo do tempo, como também pela perda de muito material por falhas técnicas. Esse contratempo o fez estreitar laços com A.K., que também assina a obra como produtor. Vem dessa parceria boa parte das texturas detalhadas e arranjos luxuosos que ouvimos nesse disco que transita entre gêneros como jazz, funk, R&B dos anos 80 e 90 (rendendo comparações como nomes Prince e D’Angelo), além do yacht rock, de artistas como Michael McDonald e Steely Dan. A riqueza estilística se reflete num som retrô-futurista, combinando diversas influências clássicas em meio a uma produção moderna – que se encontra no limiar entre a sofisticação e a extravagância.

As escolhas estéticas do álbum são cuidadosamente alinhadas ao conteúdo emocional das letras. Trata-se de um convite ao mundo particular de Ruthven, que fala não só da reconciliação com herança familiar, como da vivência de um amor que perdura por mais de 10 anos. São versos intimistas que exploram temas como relacionamentos, vulnerabilidade, sobrevivência e a busca por autonomia artística. Em faixas como “I Can’t Go There”, o músico equilibra uma melodia cheia de groove a uma narrativa introspectiva sobre incertezas amorosas. Já “Thru The Walls” traz uma reflexão bem-humorada sobre a intimidade e barreiras — ou a falta delas nos prédios modernos de paredes finas demais. Ruthven consegue combinar um lirismo acessível e uma produção requintda, experimentando nos arranjos sem nunca perder de vista a essência pessoal da obra.

Outros destaques estão em “123 Days”, que evoca a aura de Paul Simon; “Don’t Keep It To Yourself”, que evolui de um funk dançante para uma balada introspectiva; e a sensual “Itch”. As canções têm em comum a influência de Prince, que fica clara, tanto na sensualidade das melodias, quanto no uso criativo de sintetizadores e nos grooves envolventes, além, é claro, do uso singular das guitarras mais “princianas” possíveis (como em “Don’t Keep It To Yourself” ou “Drive It”). Mas Ruthven consegue entregar sua própria identidade, seja no estilo moderno da produção ou no teor das letras. Apesar de sua diversidade sonora, Rough & Ready soa coeso e bem encadeado. Um disco com o potencial de atravessar gerações.

(Rough & Ready em uma faixa: “Thru The Walls”)

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ARTISTA: Ruthven

Autor:

Apaixonado por música e entusiasta no mundo dos podcasts