Moças e rapazes, que beleza de disco. Ryley Walker, um nativo de Chicago, de 24 anos, é um dos raros militantes do que entendemos por British Folk, o que apontaria uma contradição de termos, digamos, geográficos. Mesmo nascido na América, Walker é adepto das obras de gente como Bert Jansch e Tim Hardin, mestres britânicos do estilo em sua forma mais pura e capaz de transmitir com precisão a miríade de emoções intencionais típicas do Folk. É canção de convivência, relato de cotidiano, de conversa na porta de casa, tudo isso devidamente repaginado para a vida urbanoide que levamos neste conturbado século 21. O que estes ingleses, escoceses, irlandeses e galeses conseguiam com seus violões e arranjos surpreendentes era converter um relato literário em um contido e pungente oceano de tristeza e contemplação. Claro, nem tudo aqui é britânico, uma vez que Walker também tem carinho e influência de gente como Tim Buckley, o que torna sua música interessante e livre de alguns cacoetes ianques que se tornaram marca registrada do estilo para uma audiência neofita.
All Kinds Of You é a estreia de Walker em disco. Lembra alguma coisa do personagem central de Inside Llewyn Davis – A Balada de um Homem Comum, mas vai além. Não há ingenuidade por aqui, apenas uma variante lírica e bela de sofrimento, lamento, gente olhando pela janela de um apartamento com vista para a estrada da vida, na qual parece sempre chover. Ou nevar. O clima é urbano, cinzento, passivo, reflexivo. Há algum tempo, Walker era mais um músico na noite de Chicago, em busca de algo mais sólido em sua carreira. Fez parte de grupos de Post Rock, mas achou-se numa forma bem mais enxuta de expressão musical. A abertura do disco com West Wind, dolorida como a condução do cello que a pontua desde o começo. O violão de Walker tece tramas orbitantes, enquanto a bateria levíssima e totalmente jazzística se faz notar aqui e ali.
Blessings também é triste e dolorida, cheia de lamentos de cello, mas algo em seus acordes lhe confere a aura de amanhecer, de redenção, de algo funcionando em meio ao caos, que trará o mínimo de solidez para lider com a derrubada de várias estruturas. A introdução longa, lenta, dá a impressão da faixa ser instrumental, até que surge a voz de Ryley como se emergisse do nevoeiro. Twin Oaks pt.1 é instrumental capaz de mesclar violão, viola e bateria pulsante, numa aparente falta de ordem, pontuada por coesão impressionante.
Great River Road é música para se dirigir pelos rincões da América que não aparece nos filmes, enquanto Clear The Sky obtém resultado impressionante pela alternância entre violão e o próprio silêncio, numa pequena e delicada tapeçaria sonora. A segunda parte de Twin Oaks já encarna ambiência distinta, da primeira versão, dando espaço para o desfile triste e inexorável de vários tons baixos e escuros, dando passagem para novo instrumental, Fonda, belo, inspirador, alto e cheio de gotas de piano aqui e ali. A faixa seguinte, On The Rise, prepara o terreno para a gloriosa chegada de Tanglewood Spaces, instrumental de encerramento, outra faixa feita sob medida para dirigir e contemplar as paisagens que a estrada é capaz de trazer.
All Kinds Of You é um trabalho atemporal, capaz de conferir a Ryley Walker bem mais idade que seus 24 anos. É um disco delicado, sofrido e belo, feito sob medida para quem quer conhecer novas texturas na música simples, urbana e tradicional. Altamente recomendado.