SAYA é o quarto volume na discografia de Saya Gray, mas, de certa forma, tem cara de obra de estreia. Não só por ser batizado como o próprio nome da artista (como a tradição ditou que os primeiros discos deveriam ser chamados), mas por como se apresenta em relação aos anteriores, demonstrando estar em um estágio de evolução superior. Nele, há experimentação e bom humor mais uma vez, mas estão acompanhados de algum refinamento que ela antes ignorava e, agora, intencionalmente traz para sua obra.
19 Masters (2022), como seu nome indica, é uma coleção de produções que dão belas pistas de seu potencial criativo, entre composições de um minuto e a beleza de músicas como “IF THERE’S NO SEAT IN THE SKY (WILL YOU FORGIVE ME???)”. Seus experimentos continuaram fortemente em QWERTY (2023) e QWERTY II (2024), dois EPs que formam uma só obra com sua atmosfera eletrônica e alto grau de experimentalismo. Desta vez, neste que é considerado seu segundo álbum, Saya trouxe seus aprendizados para desenvolver composições dentro de uma tecnologia muito conhecida: a canção.
Os primeiros segundos da faixa de abertura, “..THUS IS WHY (I DON’T SPRING 4 LOVE)”, sugerem uma continuidade da eletrônica de outrora, mas logo recebem dois dos pilares com os quais SAYA foi construído: a guitarra country e o violão folk – elementos que, para quem estava mergulhado nos dois QWERTY, podem ser tidos como escandalosos. Não quer dizer que ela se distancia agora de um pop-alternativo-experimental-meio-estranho, mas que aprendeu a explorar esse ambiente aproveitando outras estéticas, e com grande autenticidade.
Ao longo das 10 músicas que compõem o disco, Saya Gray é tão Dolly Parton quanto é FKA twigs. Com uma irreverência delicada, ela canta sobre cancelar um casamento para não repetir os erros do passado em “SHELL (OF A MAN)”, para depois mergulhar na atmosfera densa do R&B indie em “H.B.W”. O caminho entre as duas faixas é construído pelas características que já conhecíamos da artista, acompanhadas da estética proposta para esta obra.
SAYA é um álbum mais polido e bem acabado, no qual a influência country e folk reflete uma nova apreciação pelo formato da canção. Ainda há espaço para vinhetas, títulos brincalhões e narrativas fragmentadas, mas, desta vez, a impressão que fica é de um amadurecimento — sem perder a inquietação de quem sempre vê possibilidades para um novo começo.
(SAYA em uma faixa: “SHELL (OF A MAN)”)