O músico dublinense Aaron Corcoran, mais conhecido como Skinner, despontou na vibrante cena musical irlandesa como um “underdog” e, ao mesmo tempo, como um dos artistas mais provocativos do pós-punk local. Corcoran começou a chamar atenção já nos seus primeiros lançamentos, com os EPs Gunge (2021) e Commander Trainwreck (2022), que trazem uma mistura interessante de um irrequieto indie rock aos moldes dos 2000 e influências do no wave nova-iorquino. Seu álbum de estreia, New Wave Vaudeville, chega em um momento em que a Irlanda apresenta uma das melhores safras do pós-punk (de bandas como Fontaines D.C., Gilla Band e The Murder Capital), porém se destaca por cruzar para muito além das fronteiras do gênero, experimentando com elementos que vão da música tradicional irlandesa ao free jazz.
Liricamente, o disco mergulha em temas como frustração social, identidade irlandesa contemporânea e o peso das tradições culturais, sempre abordados com uma mistura de sarcasmo, melancolia e crítica afiada. As letras se mostram na mesma medida viscerais e poéticas, sem medo de tocar em questões espinhosas – o sentimento de inadequação (“I never know what to do, And I never know what to say”, de “Tell My Ma”), o “marasmo” da cena irlandesa (“That’s the kinda shit that you just can’t teach, Because the radio is poison, The journalists are dry”, de “Geek Love”) e desconstrução da cultura católica (“Dying for their sins, And I am lying from within, To try and keep my secret in the bag, Cause Jesus can’t be seen in drag”, na absurda “Jesus Wore Drag”).
Não bastasse a abordagem cáustica das letras, Skinner consegue amplificar os sentimentos que quer causar através da instrumentação explosiva de suas canções. Guiadas por variantes do rock, que percorrem o pós-punk, dance punk e no wave, as faixas ora pendem para um lado dançante, ora para um lado raivoso – sempre refletindo o estado caótico da mente de Aaron. A faixa-título, por exemplo, combina saxofones abrasivos com uma linha de baixo pulsante, criando um clima quase claustrofóbico, enquanto os vocais rasgados de Skinner parecem bradar um manifesto contra a conformidade. Já em “Do Re Mi Fa”, as guitarras angulares e a percussão caótica evocam um senso de urgência teatral. Por sua vez, “Here Comes the Rain” desacelera o ritmo para mergulhar em texturas mais atmosféricas, com sintetizadores dissonantes se combinando a uma melodia melancólica e revelando o lado mais introspectivo de Corcoran. Essa união é capaz de criar pequenos manifestos sonoros que pendulam entre a catarse e a reflexão crítica – uma música que te coloca para pular, porém, também consegue te fazer refletir.
(New Wave Vaudeville em uma faixa: “New Wave Vaudeville”)