Resenhas

Sun Kil Moon – Universal Themes

Mark Kozelek retorna com mais canções personalíssimas e invólucro Folk

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Ano: 2015
Selo: Caldo Verde
# Faixas: 8
Estilos: Folk, Folk Alternativo, Lo-Fi
Duração: 70:13
Nota: 4.5
Produção: Mark Kozelek

E cá estamos nós, imersos no novíssimo álbum de Sun Kil Moon, o alter-ego criativo de Mark Kozelek. Sabemos, após um artigo escrito há pouco tempo e durante um tempo razoável de observação/admiração pelo estilo confessional/sentimental de Kozelek, que ele vive um momento dourado em termos de inspiração. Aliás, seria injusto restringir essa boa forma ao terreno da confecção de suas canções, Mark também encontrou uma maneira de expressar-se por meio de canções que coloca em dúvida as fronteiras da narrativa pura e simples e de sua existência com o auxílio de melodia, harmonia e outros elementos, digamos, meramente musicais.

Não é uma discussão nova, a de valorizar discurso e letras através da redução da importância dos mecanismos que asseguram que as palavras sejam entendidas como canção e não como, sei lá, prosa. O fato é que o Folk praticado atualmente por Sun Kil Moon é igualmente poderoso em narrativa e em melodia, com sutilezas aqui, tensões instrumentais ali, tudo amarrado intencionalmente sob as palavras de Kozelek, enfatizadas, promovidas, colocadas em posição superior. Talvez seja casual, mas gosto de pensar que esse formato seja totalmente pensado, o que seria genial, uma vez que o resultado é tão natural que é possível imaginar que o cantor só se comunique desta forma ao longo do seu dia a dia. Talvez, vá saber…

O fato é que Kozelek entrega mais um belo álbum em Universal Themes. Ao contrário do anterior, o assombrosamente belo Benji, este novo trabalho é mais diverso e capaz de abraçar uma gama maior de assuntos e perspectivas do autor/cantor/narrador diante do mundo. Se o disco anterior trazia reflexões poderosas e espontâneas sobre morte, perda e as diferentes formas que elas podem assumir em nossas vidas, aqui Mark reflete sobre o próprio mundo e sua participação nele. É um compêndio de oito canções que dizem respeito aos pontos de vida de Kozelek, algo que o ouvinte deve ter sempre em mente, pois a sensação é de ler um diário pessoal. Alguém mais ranheta poderia clamar que o título não é apropriado, justo porque as narrativas giram em torno – e somente – das observações de Mark Kozelek, porém, ele e os fãs não parecem padecer dessa confusão semântica.

Em termos de arranjos, Universal Themes é melhor que Benji. Canções como o primeiro single, The Possum, apresentam mudanças de andamento e arranjo que podem fazer o ouvinte desavisado pensar que está diante de duas obras distintas. Enquanto o formato voz/violão/efeitos predomina, há exemplos de mudanças, entre elas a abordagem “de banda” em With a Sort of Grace I Walked to the Bathroom to Cry, que, pelo título, já uma boa ideia aos não-iniciados na poesia kozelekiana do que Mark pretende atualmente com suas canções. Outro bom exemplo é a anti-épica Cry Me a River Williamsburg Sleeve Tattoo Blues, com participação de Steve Shelley, ex-baterista de Sonic Youth. A canção é um não-mantra, cheia de palavrões e maledicências mil, versando sobre questões sobre a própria carreira do cantor/autor e como ele lida com a vida a partir disso. Em Little Rascals a narrativa à la Nirvana é ciclicamente interrompida por momentos “psicoacústicos” que valorizam as nuances e conflitos da própria letra, que é retomada após algum tempo, como se nada tivesse acontecido.

Garden Of Lavender se vale da alternância entre os registros mais grave e mais agudo de Mark, num mecanismo que lembra outro gigante do estilo, Neil Young, talvez mostrando a dualidade entre o sujeito que enfrenta com certo humor negro as porradas da vida e o cara frágil, assombrado pelos fantasmas e pela violência do habitat em que foi atirado pela modernidade. A última canção, This Is My First Day and I’m an Indian and I Work at a Gas Station, fala sobre o ator Martin Sheen e sua atuação no filme Apocalipse Now, sobre outro ator, Jon “pai de Angelina Jolie” Voight e sua presença em outro longa, Amargo Regresso (ambos épicos sobre a Guerra do Vietnã) e, a exemplo da última canção do álbum anterior, conta com a presença – na letra – de Ben Gibbard, citado como protagonista de um set acústico assistido por Mark em um lugar chamado Noise Pop, onde ele encontrou com Bob Mould nos bastidores.

Sun Kil Moon não é para novatos e sua apreciação completa – que pode trazer enorme prazer e contemplação – só será atingida após algum esforço estético por parte do ouvinte. Uma vez atingido esse ponto, será difícil ouvir as letras convencionais das canções convencionais.

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Autor:

Carioca, rubro-negro, jornalista e historiador. Acha que o mundo acabou no meio da década de 1990 e ninguém notou. Escreve sobre música e cultura pop em geral. É fã de música de verdade, feita por gente de verdade e acredita que as porradas da vida são essenciais para a arte.