Resenhas

Tom Petty & The Heartbreakers – Hypnotic Eye

Novo álbum do veterano grupo americano é cru, mas cheio de sutilezas

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Ano: 2014
Selo: Warner
# Faixas: 11
Estilos: Rock, Blues Rock, Folk Rock
Duração: 44:46min
Nota: 4.0
Produção: Tom Petty, Mike Campbell, Ryan Ulyate

Jovens, aqui cabe um aviso: Tom Petty e seus “Partidores de Coração” estão na estrada há décadas. Nunca deram mole, afrouxaram seu som, quase sempre mantendo o foco sonoro de suas canções na encruzilhada “dylanesca”/”byrdiana”, cheios de vocais anasalados, instrumental básico, calcado nas guitarras de Mike Campbell e uma tendência para levíssimos toques de psicodelia. Tudo isso sempre foi devidamente amarrado por visões de uma América setentista em mutação constante. Petty e cia. deixaram sua Flórida natal e rumaram através do país para a California e lá se estabeleceram, pintaram sua versão do sonho americano e cravaram seu nome na história. É admirável que ainda estejam por aí, lançando discos, se reinventando e teimando em parecer jovens. Este novíssimo trabalho é endiabrado, cheio de desejo de mudança.

Petty lançou um álbum chamado Mudcrutch em 2008, nome da banda embrionárias de The Heartbreakers, o que poderia significar uma espécie de parada e reconfiguração sonora. Mesmo que tenha sido fiel às tradições descritas no primeiro parágrafo, o veterano guitarrista voltou-se para o início de sua carreira, lançou este álbum, excursionou pouco e voltou à ativa revigorado, lançando o simpático Mojo, em 2010. Quatro anos depois ele retorna ainda mais disposto. Dividindo a produção com Campbell e o engenheiro Ulyate, Petty decidiu despir a já pouca roupa de sua sonoridade principal. Com o que aparece, ele decidiu turbinar ainda mais a presença das guitarras, produzindo um efeito de simplicidade = relevância, ressaltando o que havia de melhor nas canções.

A abertura já coloca o ouvinte direto na estrada, com o sintomático título de American Dream Plan B, sobre esse país que muitos americanos já não conhecem mais. Os riffs erguidos por Petty e Campbell são crus, curtos e desembocam em ambiências nas quais a guitarra Rickenbacker tradicional de Tom transita impávida. Parece um AC/DC dos Everglades, se isso fosse possível. A próxima canção, Fault Lines, segue num remelexo dos infernos, cheia de ambiência de bateria, guitarras em bumerangue e baixo subterrâneo suingado, lembrando uma velha canção de Dylan, safra 1989, Political World. O Petty mais tradicional dá as caras em Red River, com aquela mistura de crueza/melodia tão peculiar. O piano de Benmont Tench parece absolutamente necessário em Full Grown Boy, com cara de canção sulista sobre como foi difícil chegar até aqui.

Mais riffs musculares surgem abrindo All You Can Carry, cheia de paisagens motociclísticas, enquanto Power Drunk mergulha na sagrada/profana encruzilhada do Blues, com andamento elegante e guitarras sinuosas entrecortando a harmonia da canção. Forgotten Man é outra faixa feita sob medida para a estrada, cheia de bateria rápida, lembrando o primeiro sucesso de Petty, American Girl e abrindo a passagem para a autobiográfica Sins Of My Youth, conduzida por uma elegante bateria de aro, guitarras harmônicas e teclados de Tench, tudo amarrado numa belezura de canção. Mais riffs secos e cortantes impulsionam U Get Me High enquanto novamente surge o Blues para conduzir Burnt Out Town, preparando o ouvinte para outra canção pantanosa e direta, Shadow People.

Hypnotic Eye é, com o perdão da expressão, uma cacetada bem aplicada. Não é um disco barulhento. Sua crueza é sutil e bem colocada. Coisa de quem é gente grande.

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Autor:

Carioca, rubro-negro, jornalista e historiador. Acha que o mundo acabou no meio da década de 1990 e ninguém notou. Escreve sobre música e cultura pop em geral. É fã de música de verdade, feita por gente de verdade e acredita que as porradas da vida são essenciais para a arte.