Resenhas

Torres – Three Futures

Cantora/compositora norte-americana diversifica musicalidade em ótimo disco

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Ano: 2017
Selo: 4AD
# Faixas: 10
Estilos: Rock Alternativo, Indie Rock
Duração: 46:06
Nota: 4.0
Produção: Rob Ellis

Torres, também conhecida por Mackenzie Scott, seu nome de batismo, chegou a uma espécie de ápice criativo neste seu terceiro disco, Three Futures. A cantora e compositora resolveu deixar de lado o ataque sonoro característico de seus dois primeiros trabalhos e partir para uma evolução estética, na qual o espírito contestador e emocional/emocionante segue presente, mas posto de forma implícita e em simbiose com uma sonoridade em que a Eletrônica é a pedra de toque. Não significa que Torres gravou um disco de Synthpop, longe disso, mas todas as dez faixas do disco apontam para um momento de evolução, no qual há maior domínio da própria sonoridade, do estúdio, em suma, do que ela mesma deseja para si como artista e pessoa. Um trabalho confessional.

Quem conhece os dois álbuns anteriores de Torres sabe bem que seus questionamentos sentimentais guardam muito de suas impressões sobre a doutrina cristã batista, fé na qual foi criada e na qual cresceu. Mesmo que não seja mais tão próxima da igreja, sua música conserva esses questionamentos sobre criação, vida, morte, tudo dentro de uma perspectiva bastante pessoal, que é aliada ao posicionamento engajado que uma mulher pode ter em tempos como os atuais, consciente, atuante e, acima de tudo, independente de conceitos. Torrer é, como diríamos na Internet, um “mulherão da porra”, justamente por exalar um misto de autoconfiança com vulnerabilidade, mistura que talvez habite a maioria das pessoas que conhecemos, além de nós mesmos. Essa impressão de que ela está expondo os nossos problemas e passagens de vida, dá crédito e empatia à moça.

Ainda que o discurso da moça seja sempre afiado, apontando comportamentos criticáveis de homens, mulheres e suas variações, arrisco dizer que as melodias e o trabalho de estúdio sejam as grandes maravilhas que Three Futures traz aos fãs. Repetindo a parceria com o produtor Rob Ellis e debutando no prestigioso selo inglês 4AD, Torres consegue, enfim, entregar uma musicalidade com muito a oferecer em termos de surpresas e passagens memoráveis. Como já dissemos, é um disco mais “tranquilo”, porém muito mais sensual e insinuante, com timbres e sonoridades que vão direto aos sentidos de uma forma, digamos, não muito usual.

A segunda faixa, Skim, tem uma sensacional levada Eletro-Blues, com bateria marcante e efeitos tradicionais de teclados, mas com uma impressionante simbiose com a voz de Torres, gerando uma sensação de que nasceram juntas e umas pra outra. Mais pra frente surgem efeitos hipnóticos de guitarra, que lembram o que PJ Harvey poderia fazer se tivesse começado a carreira há uns cinco anos. A faixa-título é outro exemplo dessa excelência sonora, com timbres fragmentados de bateria e percussão, que planam em meio à estrutura da canção, à medida em que ela vai ganhando força. No meio do caminho, sonoridades de cordas sutilíssimas vão emoldurando versos como “I got hard, in your car, in a parking lot”, nos quais, evidentemente, Torres demonstra facilidade em assumir a “pessoa masculina”. Righteous Woman também dá pistas de uma musicalidade que dialoga bem com o Rock Alternativo dos anos 1990, do mesmo jeito que Helen In The Woods surge totalmente atual e frenética, com Torres falando sobre a sexualidade adolescente com uma voz próxima do limite.

Three Futures é um disco com várias possibilidades. Seja qual for a sua escolhida, a musical, a literal ou ambas, é possível perceber o quanto Torres oferece sinceridade ao ouvinte, de várias formas, literal e metaforicamente. Este é seu melhor trabalho.

(Three Futures em uma música: Three Futures)

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BOM PARA QUEM OUVE: Waxahatchee, Cat Power, PJ Harvey
ARTISTA: TORRES

Autor:

Carioca, rubro-negro, jornalista e historiador. Acha que o mundo acabou no meio da década de 1990 e ninguém notou. Escreve sobre música e cultura pop em geral. É fã de música de verdade, feita por gente de verdade e acredita que as porradas da vida são essenciais para a arte.