Resenhas

Travis – Everything At Once

Novo álbum da banda escocesa é fiel ao seu estilo elegante e eficaz

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Ano: 2016
Selo: Red Telephone Box
# Faixas: 10
Estilos: Rock Alternativo, Britpop, Pop Alternativo
Duração: 33:21
Nota: 4.0
Produção: Michael Ilbert

Antes de mais nada: Everything At Once, oitavo disco da banda escocesa Travis, é uma belezinha. Os motivos, é claro, você vai ler nesta resenha, mas já pode ir aprontando seu serviço de streaming favorito ou o programa de P2P de sua preferência em busca das dez faixas que Fran Healy e sua galera estão entregando por agora. Se você é dessas pessoas que estão sempre em busca de novidades apenas pelas novidades, no entanto, o que você terá aqui é, no máximo, a certeza de que a banda está animadíssima, em forma, satisfeita com o que produziu e gravou. A alegria dos rapazes é palpável nas canções, seja na eficiência das letras ou da execução dos instrumentos, bem como no leve conceito que norteia o disco: a questão neoliberal, detectada por sociólogos e acadêmicos como Zygmunt Bauman, de que a sociedade do início do século 21, movida pelos valores materiais de toda sorte, quer, como diz o título, “tudo de uma vez” ou, mais apropriadamente, “tudo agora, pra ontem, de uma vez”.

Além disso, dessa questão circunstancial, é sempre bom ouvir uma banda que toca e compõe tendo em vista um padrão mais clássico de Rock noventista, derivado direto do que U2 obteve em suas incursões eletrônicas nos belos álbuns Achtung Baby (1991) e Zooropa (1993). É representante honroso da mesma geração de Radiohead, Coldplay, Keane e Muse, mas sempre adotou para si um perfil discreto e pouco afeito a badalações. Canções de amor e observação da vida sempre foram sua pedra de toque e, depois de quase 20 anos na ativa, pouco desta disposição inicial de credenciais, influências e predileções não mudou. Às vezes, é interessante pensar em como seriam seus colegas de geração se mantivessem suas configurações originais em suas respectivas carreiras. Sendo assim, Travis surge como banda de princípios e fiel ao que seus fãs consideram válido e legal.

Everything At Once foi gravado no prestigioso Hansa Studio, em Berlim, cidade em que David Bowie experimentou artefatos eletrônicos em obras como Low. As intenções da banda não contemplavam avanços estéticos, mas a viagem e o ambiente no estúdio fez bem a todos. O resultado está por toda parte no novo álbum. A voz de Fran Healy, doce e sentimental, está em seus melhores momentos e o instrumental seguro do trio restante, formado por Andy Dunlop, Neil Primrose e Dougie Payne, confere o contraponto necessário para tudo funcionar bem. Há até a participação de um contemporâneo, o tecladista e cérebro de Keane, Tim Rice-Oxley, na composição da simpática Magnificent Time, fazendo sentido.

Dentre estas novas criações do pessoal, que, juntas, perfazem um total de 33 minutos, há algumas belezuras, senão vejamos. A abertura com a supimpa What Will Come tem o padrão de timbragem de guitarras travianas desde sempre, com cara de outono de 1998 na Inglaterra. Radio Song também tem a marca sonora típica da banda, que vem através do bom registro vocal de Healy e mais guitarras erguidas com precisão em torno da melodia, tudo explodindo controladamente no refrão. Animals traz alguns timbres sinfônicos sintetizados em meio a uma melodia que poderia ser do início dos anos 1960, devidamente repaginada pelo arranjo com o jeitinho de 2016. Novamente a boa voz de Fran marca pontos aqui. A faixa-título é novidade e traz uma inesperada rendição à música, digamos, psicodélica, no sentido Acid Rock do termo. Na verdade isso chega através de alguma instrumentação pesada no refrão, no jeito das guitarras surgirem e dos próprios vocais de apoio mixados ao longe. Outras faixas que preservam as tradições dos melhores momentos da banda são as bela 3 Miles High e All Of The Places. Surpreendente também é o dueto com a compositora e cantora inglesa Josephine Oniyama, na pungente Idlewild.

Travis é como aquele velho amigo que você não vê há tempos. Ele pouco mudou, mas a sensação de familiaridade, as boas histórias e a noção que, apesar dos anos, a impressão é de que nos falamos ainda ontem, compensam qualquer coisa. Para quem não conhece a banda, no entanto, o que os escoceses oferecem aqui pode ser, sim, grande novidade e tornar-se atraente para novos e novíssimos adeptos em potencial. Grande disco.

(Everything At Once em uma faixa: 3 Miles High)

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BOM PARA QUEM OUVE: Snow Patrol, Keane, Coldplay
ARTISTA: Travis

Autor:

Carioca, rubro-negro, jornalista e historiador. Acha que o mundo acabou no meio da década de 1990 e ninguém notou. Escreve sobre música e cultura pop em geral. É fã de música de verdade, feita por gente de verdade e acredita que as porradas da vida são essenciais para a arte.