Resenhas

Yacht – I Thought The Future Would Be Cooler

Novo disco do duo americano revisita os anos 1980 de forma original

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Ano: 2015
Selo: Downtown Records
# Faixas: 11
Estilos: Synthpop, Pop Alternativo, Eletrônica
Duração: 46:23
Nota: 4.0
Produção: Justin Meldal-Johnsen e Jona Bechtolt

Confesso que iniciei as audições deste novo trabalho do duo americano Yacht com certa má vontade, afinal de contas, as canções, a natureza do projeto, a origem descolada (a cena Indie de Portland, Estados Unidos), tudo parecia levar a mais uma galera fazendo mera revisão/chupação de clichês Eletrônicos dos anos 1980 sem qualquer pingo de criatividade. E é isso, uma chupinhagem ao cânon daquela década, porém, há algo que distingue o produtor e multiinstrumentista Jona Bechtolt e a cantora Claire L. Evans: talento como compositores. São pessoas capazes de escrever boas melodias, pensar em bons arranjos, em obter certa personalidade onde gente sem recursos apenas chafurdaria na mesmice. E de mesmice, galera, estamos fartos, certo?

O que Yacht faz em I Tought The Future Would Be Cooler é um bom álbum Pop, típico de 2015. Temos batidas dançantes, tem Synthpop para as massas, tem apreço pelas sonoridades New Wave primordiais, tem esperteza lírica, cortesia de Evans, fã de tecnologia, visual andrógino, uma espécie de Annie Lennox Jr, sem o carisma e a voz da original, mas com boas referências. Há, no entanto, um diferencial raro de se ver/ouvir hoje em dia: o baixista Rob Kieswetter, que acompanha o duo ao vivo, foi para o estúdio e enfiou linhas de baixo muito acima da média, com precisão técnica, feeling de música dançante, noção de que as quatro cordas têm seu lugar de direito em toda composição que vise sacolejar o esqueleto alheio, algo que a modernidade nem sempre tem o cuidado de lembrar. Rob dá um molho muito bem azeitado na faixa-título, por exemplo, lá pela metade do disco, em meio a uma levada Glam/Disco dolente, ele rouba o arranjo com sua linha simples e eficiente.

O álbum começa bem, logo com uma canção que vai além dos oito minutos de duração, Miles & Miles, com dancinhas e palminhas, tecladinhos e baterias eletrônicas, tudo no lugar certo. White Mirror vem logo depois, com refrão infeccioso, arranjo correto e o baixão sintetizado lá no meio de tudo, engordando a massa no tempo certo. A primeira grande canção do álbum chega com Matter, igualmente propulsionada por linha de baixo galopante e simples, em meio a ambiente esvoaçante, bateria correta e clima de pista de dança de 1986/87. Ringtone vem logo depois, com muita cara de 1982, novamente com palmas e batidas robóticas intencionais servindo de pano de fundo para a voz entediada de Evans pairar sobre o terreno. L.A Plays Itself é, ironicamente, totalmente criada a partir de alguma conexão primária do Hip Hop novaiorquino da virada dos anos 1970/80, lembrando canções como Rapture, do sensacional grupo Blondie, mas também soando como outras pepitas daqueles tempos aventurosos, talvez New York, New York, da alemã Nina Hagen.

Quando você espera mais dessa linhagem Eletrofunk branquela oitentista, a dupla se sai com uma sensacional I Wanna Fuck You Till I’m Dead, que, em meio a este título auspicioso, enverga (opa) um arranjo totalmente ensolarado e Pop, lembrando, veja você, algumas canções que o grupo Sugar Ray lançou em fins dos anos 1990. Hologram retoma o curso do álbum, novamente com robôs dançando em câmera lenta, mas com umas batidas safadas , irresistíveis e efeitos primários de voz, tudo ritmado e no seu devido lugar. Don’t Be Rude chega em seguida, com introdução climática de pouco mais de cinco segundos abrindo espaço para um andamento New Wave legítimo e muito simpático, com melodia chiclete e ar inocente de menina dos anos 1960 sonhando no quarto com seu namorado ideal. War On Women tem letra feminista em meio a instrumental eficiente e refrão 100%, caminhando para a última faixa, a saltitante The Entertainment, outra crocância sintetizada e bem ornamentada.

Yacht prova aqui a possibilidade total de encontrar segmentos e detalhes inexplorados dentro da tendência revisionista da música Pop atual. Faz isso naturalmente, com elegância e eficiência, fazendo deste álbum uma audição pra lá de legal. Vocês vão gostar.

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BOM PARA QUEM OUVE: Disclosure, Deerhunter, Neon Indian
ARTISTA: Yacht

Autor:

Carioca, rubro-negro, jornalista e historiador. Acha que o mundo acabou no meio da década de 1990 e ninguém notou. Escreve sobre música e cultura pop em geral. É fã de música de verdade, feita por gente de verdade e acredita que as porradas da vida são essenciais para a arte.