Resenhas

You Blew It – Abendrot

Banda americana mistura experimentalismo ao som “Emo” e se sai bem

Loading

Ano: 2016
Selo: Triple Crown Records
# Faixas: 12
Estilos: Emo Revival, Punk Experimental, Rock Alternativo
Duração: 36:35
Nota: 3.5
Produção: Evan Weiss, Matt Jordan, Adam Beck

Interessante. O termo “Emo” sempre foi muito controverso em sua utilização. Enquanto ele surgiu nos anos 1990, especificamente para denominar a sonoridade angustiada que era produzida por boas bandas como Fugazi e Sunny Day Real Estate, foi massificado anos depois para dar identidade a uma série de formações menos talentosas/intensas, que pegaram emprestados alguns elementos e misturaram com uma gororoba Punk Pop, formatada e propagada por gente como Blink 182. O resultado conhecemos bem, com ressonância – lamentável – até mesmo por aqui, em nosso combalido cenário Rock do início dos anos 00. Há algumas formações em atividade nos Estados Unidos, atendendo pelo rótulo de “emo revival” que parecem dispostas a recolocar o estilo no seu caminho original, reatando os vínculos com a intensidade de outrora, reaproximando-o do Rock Alternativo e injetando alguma dose de experimentalismo.

As 12 faixas de Abendrot, terceiro disco do quinteto americano (de Orlando, Flórida) You Blew It é um trabalho que se insere nessa nova/velha visão. Para ouvidos destreinados, soará como um bom álbum de Rock Alternativo, com parentesco noventista, bem tocado e bem produzido. Um olhar além do óbvio vai mostrar suas conexões com este pedigree Emo perdido pela massificação boba que tomou lugar a partir dos anos 00. As canções são climáticas, não precisam de arranjos rapidinhos e puladinhos, também não abusam de vocais torturados e gritados demais. Tudo parece correr dentro de seu próprio tempo, no seu próprio ritmo. As melodias são singelas, as guitarras protagonizam as ações, mas se posicionam de forma harmônica, com mais investimento nos climas e acordes do que em solos ou algo que vá além do trabalho em grupo. É como se alguém pingasse gotas d’água sobre algum quadro não acabado, conseguindo um efeito de fluidez e experimentalismo sobre uma paisagem que muitos já julgam conhecer.

A diferença desta sonoridade para a do trabalho anterior, The Past In Present é enorme. As ideias surgem mais nítidas e auspiciosas do que nunca e o grupo ainda tem habilidade para compor melodias que têm alguma familiaridade Pop mas que evocam climas de saudade, nostalgia e passado. Há várias pequenas gemas ao longo dessas doze faixas, sempre numa fronteira não definida entre “música rápida” e “música lenta”, com andamentos que se confundem intencionalmente e se misturam em mudanças súbitas. Um bom exemplo dessa dinâmica surge em Greenwood, que ostenta várias surpresas de timbres e levadas ao longo de menos de quatro minutos. O que é intensidade e experimentalismo se transforma em flerte com paradas de sucesso – as menos óbvias, claro – na faixa seguinte, Hue, que é arejada e ensolarada, na medida do possível, cheia de imagens de pessoas no parque depois do almoço.

Mesmo nas faixas que se assemelham ao que o senso comum entende por “Emo”, caso de Canary, há um toque de inventividade capaz de transformar a audição, levando o ouvinte a vislumbrar possibilidades até então ignoradas. É nas faixas mais contemplativas que You Blew It se sai melhor, caso de Forecasting, que mescla silêncios e vocais intensos, mas nunca chatos ou exagerados. Boas guitarras fazem companhia a uma bateria bem tocada e intencionalmente soterrada na mixagem, dando uma ideia de uniformidade aos arranjos. O anda-e-para de instrumentos e batidas mostra que os sujeitos são criativos e pensam em todos os aspectos. Até o fim do disco há belezuras climáticas de sobra, especialmente Minorwye, que resgata uma interessante fagulha Grunge introspectiva há muito não ouvida; e Arrowhead, torturada na escuridão e chegando a lembrar uma espécie de versão 2016 de Fugazi.

Este disco é uma agradável surpresa, propondo um caminho novo para um gênero que foi desqualificado do debate musical logo quando começou a ser confundido com bandecas de pós-adolescentes coloridos. Aqui a paisagem é cinza, oprimida/opressora e longe da banalidade dos “white people problems” que vimos por aí, travestidos de questões sérias. Ouça.

(Abendrot em uma música: Forecasting)

Z

Loading

Autor:

Carioca, rubro-negro, jornalista e historiador. Acha que o mundo acabou no meio da década de 1990 e ninguém notou. Escreve sobre música e cultura pop em geral. É fã de música de verdade, feita por gente de verdade e acredita que as porradas da vida são essenciais para a arte.