Resenhas

Youth Lagoon – Rarely Do I Dream

Entre sintetizadores e guitarras distorcidas, Trevor Powers realiza uma arqueologia de si mesmo

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Ano: 2025
Selo: Fat Possum
# Faixas: 12
Estilos: Indie, Indie Pop
Duração: 42’
Produção: Trevor Powers and Rodaidh McDonald.

Trevor Powers, o compositor e produtor por trás do pseudônimo Youth Lagoon, passou por poucas e boas nos últimos anos. Como escreveu André Felipe na resenha de Heaven is A Junkyard, “o músico tinha desistido de seu Youth Lagoon, dizendo que se sentia sufocado pelo projeto e preferiu mudar de ares com dois discos lançados sob seu próprio nome. Em outubro de 2021, uma reação alérgica a um medicamento simples fez com que sua laringe e cordas vocais fossem prejudicadas pelos ácidos estomacais, a ponto de ele ficar um bom tempo sem conseguir falar (e, é claro, cantar)”. Depois de renascer, portanto, em 2023, a saga segue com Rarely Do I Dream, que funciona mais ou menos como uma continuação espiritual de seu antecessor.

Na montanha-russa de emoções que é a vida – ou tempestade elétrica, como Powers prefere chamar – o compositor foi encontrando detalhes que fazem a vida ser o que ela é, um emaranhado de momentos simples que a definem como algo que vale a pena: “irmãos conversando em walkie-talkies, o cachorro latindo na porta dos fundos, uma voz suave no rádio, a mãe fumando na varanda, a cor da luz do sol”, e assim por diante. De acordo com o artista, “são pequenos momentos que definem a nossa experiência na terra, sempre debaixo dos nossos narizes e tão fáceis de perder. Frequentemente, um simples tesouro.”

No outono de 2023, esse tesouro veio na forma de uma caixa de sapatos cheia de vídeos caseiros que Powers encontrou no porão de seus pais. Dando continuidade a Heaven is A Junkyard, Trevor Powers propõe a música como uma arqueologia de si mesmo, coletando os seus fragmentos que foram deixados para trás, construindo e reconstruindo quem é.

Mito e memória se confundem nas letras e gravações de Rarely Do I Dream. Com faixas preenchidas por pequenos momentos reais que Powers encontrou nas fitas, o álbum é construído de momentos de intimidade de uma infância retratada na casa de Powers. As composições começaram com ele sampleando o áudio e manipulando-o em uma espécie de cinematografia musical, fundindo passado com futuro. “O que realmente me consumia era o quanto eu poderia me aproximar da minha história real”, diz Powers. “Eu queria realmente fazer alguém sentir como se estivesse dentro da minha sala de estar em 1993, mas rearranjar um pouco os móveis. Algo sobre combinar esse nível de hiper-realidade com contos de fadas de demônios e detetives estranhamente parecia a maneira mais verdadeira de imortalizar esses pedaços da minha família.”

Rarely Do I Dream é preenchido pela voz característica de Powers – frágil e, ao mesmo tempo, agressiva – em músicas cheias de sentimento, unindo sintetizadores e guitarras distorcidas. Versos simples e verdadeiros, mas com um profundo sentido poético ocupam esse imaginário. Em “Seersucker”, por exemplo, ele canta “Every song that Momma wrote, Pop learned to play / When the old piano broke, the music went away.” Em Rarely Do I Dream, a música volta, preenchendo o espaço vazio de uma infância passada no deserto, mais do que geográfico, existencial.

(Rarely Do I Dream em uma música: “Seersucker”)

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ARTISTA: Youth Lagoon

Autor:

é músico e escreve sobre arte