Resenhas

Yussef Dayes – Black Classical Music

Depois de ótimas parcerias e registros ao vivo, baterista londrino realiza viagem grandiosa em seu disco estreia

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Ano: 2023
Selo: Brownswood Recordings / Warner Music UK
# Faixas: 19
Estilos: Jazz
Duração: 74'
Produção: Yussef Dayes

O baterista, produtor e compositor Yussef Dayes tem se provado, ao longo da última década, um dos nomes mais interessantes da tão prolífica cena jazzística de Londres. Embora sempre tenha trabalhado com outros artistas – como Kamaal Williams (no duo Yussef Kamaal) ou Tom Misch (no ótimo What Kinda Music, de 2020) – o que fez dele um desses nomes já conhecidos para quem acompanha o jazz moderno, Dayes não tinha um projeto de estúdio para chamar de seu. É espantoso que Black Classical Music seja sua estreia propriamente dita –  ainda que Welcome to The Hills, gravado ao vivo com o baixista Rocco Palladino e do tecladista Charlie Stacey, tenha chegado em 2020.

Todo esse tempo de espera valeu a pena. Black Classical Music é uma obra gigante – e não estamos falando apenas de sua duração (74 minutos) ou da quantidade de faixas (19 no total). O disco se mostra grandioso desde o título: uma fala de Miles Davis em que ele diz que esse termo libertaria o jazz de suas limitações, permitindo que o estilo fosse dissecado, discutido e apreciado por séculos. Para além da referência, o disco parece, sim, mostrar a “música clássica preta” – seja em nível pessoal (contando um pouco da trajetória e influências de Dayes), seja em nível histórico (passeando por diversos momentos e movimentos do jazz).

Porém, não se engane: este não é um disco com tom professoral ou uma mera coletânea de sons inspirados pelo que já foi feito no passado. Yussef tem uma habilidade única de imprimir seu estilo. Sua bateria sempre sincopada traz, de gêneros como R&B e rap, um senso de propulsão e modernidade, mesmo enquanto lida com gêneros como afrobeat ou jazz caribenho. Entre a vasta gama de influências do registro ainda podemos ouvir funk, fusion e até mesmo o dub – um extenso cardápio do qual Dayes se apropria e usa para criar momentos memoráveis dentro da obra.

Se a carreira de Dayes foi construída de maneira colaborativa até agora, em sua obra de estreia isso não é diferente. Além da volta de Rocco e Stacey e adição de Venna (saxofone) e Alexander Bourt (percussão) em sua banda “fixa” durante quase todas as faixas, o baterista convoca um time estelar de colaborações – Tom Misch (em “Rust”), Shabaka Hutchings (“Raisins Under The Sun”), Leon Thomas (“Cowrie Charms“), Masego (“Marching Band”) e Chronixx (“Pon Di Plaza”). Mas as participações mais especiais talvez venham em “The Light” e “Cowrie Charms”, faixas que contam, respectivamente, com sua filha, Bahia Dayes, e sua mãe (que faleceu em 2015). São músicas que apontam para o passado e para o futuro, e que, segundo Dayes, oferecem um pouco de cura para ele e sua família.

O resultado destes encontros é uma explosão de texturas e melodias, um caleidoscópio musical que leva o ouvinte a uma jornada frenética e diversa. Yussef Dayes consegue experimentar e transitar entre a tradição e o contemporâneo, sem nunca perder de vista sua própria noção sobre o que é o jazz ou, como diria Miles Davis, o que é a “Black Classical Music”. É um registro que, sem dúvidas, demanda tempo do ouvinte, porém o recompensa com um belíssimo mosaico de emoções e sons.

(Black Classical Music em uma faixa: “Tioga Pass”)

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ARTISTA: Yussef Dayes

Autor:

Apaixonado por música e entusiasta no mundo dos podcasts