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Por: Thaís Regina

AMELINHA comenta "Porta Secreta"

Revisitando Meus Clássicos é um quadro no qual os próprios músicos destrincham grandes álbuns e pérolas escondidas de sua discografia.

Foto: Marcelo Tabach

Porta Secreta é o encontro da música cearense com composições não-tradicionais e guitarras progressivas, sem permitir, no entanto, que esses elementos descaracterizem sua identidade – trata-se do encontro que não sucumbe, emerge.

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Entre colaborações de Moraes Moreira, Toquinho e Vinicius de Moraes, produções de Zé Ramalho, Robertinho de Recife e Mauro Motta, uma coisa é certa: Porta Secreta pede uma degustação atenta. Amélia brinca que é como uma Caixa de Pandora, que se abre sem saber o que espera do outro lado – o mais provável é que se ouça no fundo a juventude de Amelinha, a angústia gerada pela ditadura militar e a rebeldia profundamente criativa do Pessoal do Ceará.

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["Porta Secreta" (1980)] Veio no vácuo do “Foi Deus Quem Fez Você” estourado. Quando eu fui para o Festival MPB 80, a gravadora não imaginava que a música fosse fazer tanto sucesso. Tinha “Foi Deus Quem Fez Você” de um lado, e do outro “Galope Rasante”, que foi a primeira música que o Zé Ramalho fez para mim. O LP foi feito correndo depois, então a gente tinha que ter ideias muito rápidas.

Quando vi que eu tinha ficado entre as seis colocadas, eu não acreditei. Até porque tinha um fundo de ficar pensando que não tinha como eu ganhar, era carta marcada. Ah, e o bom do festival daquele tempo é que ninguém conhecia as músicas; tentaram fazer festivais depois, mas não tem graça se você conhece a música antes. Festival tem que ser sobre o impacto do momento.

Todos tem um lado roqueiro, né? O que se mistura com a vivência nordestina. Mas eles tinham banda, Robertinho e Zé, e eu gostava muito dos Beatles.  Quando fui morar em São Paulo foi a época daquele festival Woodstock, eu fui morar numa república – minha irmã já morava lá e estudava artes plásticas na FAAP. Eu não entendia nada do que eles falavam, porque era uma galera de artes plásticas, então foi uma escola para mim.

Era um momento assim: Caetano, Gal, Gil, Bethânia, Woodstock, Jimi Hendrix, Rolling Stones, esse povo todo. Enquanto isso, eu estava ouvindo também as grandes cantoras do Jazz, um outro clássico, sabe? Ella Fitzgerald, Billie Holiday, Sarah Vaughan. Eu tinha 24 anos e era amiga de Vinicius de Moraes. Essas coisas são impagáveis, a convivência com Toquinho, entende?

Zé ainda estava viajando e falou que tinha feito uma música para mim. 

“E como é?”, perguntei. 

Ele cantou para mim no telefone. “Ah, está certíssimo”, falei, “porque aqui na varanda tem uma ventania diferente, uma brisa do mar que vem e é exatamente um Quero-te bem ventania…”

Agora essa é perigosa: “Quero-te mais furacão”. Aí é a magia do futuro do jovem. Mas é também, eu acho, uma coragem do jovem de enfrentar tudo que vier pela frente.

É, eu sou muito romântica, realmente. Eu sou muito sensível.

O Pedro Osmar, que escreveu “Beijo-Morte-Beijo”, sempre foi muito político. Eu estou cantando a poesia dele, que remonta toda essa situação política, mas eu me coloco como cantora, não necessariamente que eu esteja cantando uma verdade minha, do que eu acho.

Fui ouvir o disco de novo anteontem e achei que “Beijo-Morte-Beijo” poderia terminar o disco para deixar a coisa no ar, sabia? “Lucas” o Geraldinho fez para o filho dele.

Quem tá antenado sabe que tem música que não tem validade, é atemporal.