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Por: Lucas Borges Teixeira

LENINE comenta "Na Pressão"

Revisitando Meus Clássicos é um quadro no qual os próprios músicos destrincham grandes álbuns e pérolas escondidas de sua discografia.

Foto: Nana Moraes

Lenine já tinha duas décadas de estrada quando gravou Na Pressão, em 1999. Se, na união entre composições antigas e inéditas, ele pode enxergar uma coletânea de contos, é a produção que traz o ar redondo do que se tornaria um dos seus maiores sucessos comerciais.

Foto: Reprodução

Na grande redoma que é chamada a MPB, ele fala, com carinho, que fez um disco de Rock, mas que, no fim, não faz tanta diferença, porque lhe interessa mais a forma com o que Na Pressão foi feito – importa mais o meio que o fim. Ao Monkeybuzz, ele fala de como foi esse processo, relembra histórias de gravações e pira no processo musical.

Foto: Jairo Goldflus

Ao mostrar para [o produtor] Tom Capone o esqueleto do que seria o disco, eu entendi. ‘Isso não tem nada a ver com o que eu quero fazer agora.’ E fui para casa. Aí eu fiz o tema, e a primeira canção que saiu desse lote foi a “Na Pressão”, que, não por acaso, virou título do disco. Eu tive uma sensação de estar fazendo o aqui e agora pela primeira vez. Depois, isso transformou até minha maneira de compor, até hoje.

Na hora de mostrar para um cara que eu confiava pra cacete, eu entendi que o enredo não era esse. Foi um insight que eu tive naquele momento. Não por acaso tudo girou em cima desse conceito: na pressão. Veja que não é Sob Pressão, é Na Pressão, é inserido nela.

Eu escolhia a canção, já imaginava a pessoa, chegava e dizia assim: ‘Vamos coproduzir? Se diverte aí, depois manda pra mim’. O Na Pressão foi todo feito muito nesse tipo de brodagem, nesse tipo de troca, sabe? Muita gente bacana, competente junta.

O que precede a fazer um projeto novo é ter um banco de ruídos legal e diferente, só seu. Porque é fácil recorrer a um tipo de som que todo mundo tem acesso. E aí… Me incomoda muito quando eu vejo uma música e ‘ih rapaz, mesmo timbre…’. Tem umas coisas que me incomodam muito. Uma coisa que eu garanto é ter sons que eu mesmo traduzo.

Sempre foi uma pesquisa sonora para mim. Na minha trajetória, sempre andou junto o fato de ser compositor, mas, na hora que eu sou interprete, até de mim, eu tenho uma maneira de produzir, eu procuro um caminho, entendeu?

Não me interessa, como criador, ficar repetindo. A sensação de repetição é algo que me incomoda.

Assim, quando houve essa migração do analógico para o digital, o fato de a música se transformar em artes plásticas bidimensionais na frente da tela do computador, isso mudou tudo para mim. Isso foi uma ferramenta que eu podia brincar de outras maneiras.  E eu tenho muita facilidade de ver e entender aquela onda. E de brincar com ela.

Eu acho Na Pressão um disco de Rock. Até porque, naquele momento, era o início dos intercâmbios entre as ilhas que formam a loucura que é a música popular brasileira.

No Humaitá, descendo ali uma ladeira, você fica ali num lugar que é uma confluência, perto de um hospital, que é muito trânsito. Então a música [“Rua de Passagem (Trânsito)”], toda a base dela é montada em cima de um áudio que eu fiz saindo do estúdio. Eu pego o elevador, desço os três andares do estúdio, saio andando, caminhando até esse cruzamento. [imita barulho de trânsito] Isso rola o tempo todo da música.

[“Jack Soul Brasileiro”] É, de alguma maneira, minha tentativa de mostrar o nosso DNA. Ó, a gente é assim. Evidenciar a história da tradição rítmica que a gente tem, a ligação com a afrodescendência, a cultura poderosa dos tambores, toda a questão melancólica e árida dos mouros da Península Ibérica.

Eu acho que esse débito que a gente tem como branco que somos com a cultura indígena, acho que existe, a gente continua massacrando. A gente como branco, que falo. “Tubi Tupy” fala um pouco dessa culpa.

A questão do meio ambiente, a adequação do ser humano neste meio ambiente, é um tema central da minha obra, em todos os meus discos você vai ver esse meu olhar sobre o planeta. Esse olhar solidário.

Quando eu jogo com “Paciência”, paciência não é uma coisa que você consegue, é uma coisa que você persegue. Você entende a diferença? Você corre atrás de ter paciência. E é difícil de conseguir essa paciência.

Eu me considero um homem procurando melhorar. [risos] E uma das questões que eu preciso sempre melhorar é a necessidade de conter o impulso. Eu sou sempre muito impulsivo. É como a coisa do compositor: você deve desconfiar da primeira ideia. Mesmo que ela seja boa.

Você vai mais fundo nas coisas. Por isso eu tô dizendo, num primeiro momento é tudo intuitivo: vou assim, me entrego, depois tem a burilarem. Você tem de lapidar o diamante, se não é só uma pedra transparente.