Bianca Casady e o Lado Sombrio de CocoRosie

Novo projeto da cantora estreia em disco de inéditas

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CocoRosie, você já deveria saber, é uma dupla formada pelas irmãs Sierra e Bianca Casady. É uma coisa exótica, uma vez que as meninas têm uma queda por sonoridades experimentais, esquisitas, praticando um estilo que se enquadra naqueles rótulos Freak Folk, Surreal Folk, ou seja, música deliberadamente estranha, feita por e para pessoas… incomuns. Nada errado nisso, há uma série de argumentos a favor, apesar dos detratores encherem o saco ocasionalmente. E há gente interessante nessa seara, de Devendra Banhart (amigo delas, inclusive) a Joana Newsom, gente adoravelmente fora dos padrões e isso, amigos, hoje em dia, num mundo tão padronizado e cinzento, é virtude das mais louváveis.

Essa introdução sociológica serve para dizer que Bianca Casady, a mais nova das irmãs, responsável pelo toque definitivo de surrealismo dark nas criações com Sierra, vem aí com um projeto paralelo, chamado Bianca Casady And The C.I.A, através do qual ela vem excursionando e solta um álbum de canções inéditas por estes dias, intitulado Oscar Hocks. Bianca tem preferido fazer shows em lugares pequenos e quase de surpresa, procurando surpreender o público local e apresentando as novas canções. Ela nasceu em 1982, no Havaí, filha de pai americano e mãe descendente de sírios e índios. Com o tempo e as idas e vindas pelos Estados Unidos, as irmãs cresceram e seguiram rumos diferentes, voltando a se encontrar somente na virada do milênio, em Paris. Sierra morava na cidade e Bianca e encontrou, passando a morar com a irmã em seguida. Mesmo que o interesse pela música surgisse desde cedo para ambas, ela não foi suficiente para dar conta da curiosidade e necessidade de expressão das meninas. Os temas mais amplos, como feminismo, religiosidade e a própria sociedade levaram Bianca a enveredar pelo caminho das artes plásticas com exposições em lugares interessantes ao redor do mundo. Era certo que a música produzida por ela não seria… convencional.

E não foi. Uma vez unida à irmã sob o nome CocoRosie, junção dos apelidos de criança das duas (Bianca = Coco, Sierra = Rosie) elas gravaram as canções do primeiro álbum em tom informal e amador, dentro do minúsculo apartamento parisiense de Sierra, com especial predileção pela sonoridade do banheiro, lugar onde Bianca, segundo consta, passava a maior parte do tempo. Com as canções prontas, gravaram para alguns amigos mais chegados e deram de presente. Um desses registros chegou aos ouvidos da Touch And Go Records, que perseguiu as irmãs pela cidade, atrás de um contrato para lançamento comercial. Devidamente regularizadas como artistas da gravadora independente, Sierra e Bianca, sob o nome CocoRosie, lançaram seu primeiro disco, La Maison De Mon Rêve em 2004, iniciando sua carreira com o pé direito. A partir daí, a dupla iniciou uma trajetória bem sucedida, com afinidade entre outros sujeitos estranhos como Devendra Banhart e Antony Hegarty (do grupo Antony And The Johnsons), totalizando, até 2015, seis álbuns lançados.

Apesar de bem sucedida e atuante, CocoRosie nunca foi suficiente para dar vazão à criatividade de Bianca Casady. Além de cantar e manipular vários instrumentos nos shows ao vivo, incluindo alguns bem estranhos e outros infantis, Bianca não conseguiu deixar de lado sua veia de artista plástica, mantendo-se bem ativa no setor. Continuou com suas exposições pelo mundo, sendo que, em 2014, ao lado de Antony Hegarty, a irmã Sierra Casady e os artistas Johanna Constantine e Kembra Pfahler, levou Future Feminism para os Estados Unidos, exposição considerada uma das mais importantes daquele ano. Consistia de trabalhos em pedra, leituras, performances e um manifesto sobre a questão do feminismo nos dias atuais e como fazer para enfrentar o mundo tecnológico, supostamente moderníssimo e, ainda assim, conservador e preconceituoso em tantos aspectos. Enquanto também produzia com a irmã os trabalhos da dupla, recentemente, Bianca encontrou espaço para um projeto paralelo, o qual ela batizou de Bianca Casady And The C.I.A. Detalhe: C.I.A, neste caso, não quer dizer “Central Intelligence Agency”, mas “Cult International Alliance”, que é o grupo que acompanha a moça, integrado por músicos, dançarinos, performers em geral. Interessante.

Duas canções já são conhecidas: RoadKill e Poor Deal. A primeira, com alguma percussão e batidas eletrônicas, efeitos e barulhinhos aqui e ali, mostra o quanto a voz de Bianca segue a escola Björk de canto, ainda que haja bastante identidade no registro, talvez puxando para um tom um pouco mais infantil e estranho. Poor Deal, por sua vez, é mais noturna, pianística e contemplativa. Ambas seguem a linha de CocoRosie, porém com mais liberdade para adentrar este terreno do estranhamento sem muita responsabilidade de conferir beleza colorida e padronizada ao assunto. Estas duas primeiras canções acenam para um álbum com livre trânsito pelo lado negro da Força, algo que Bianca sempre pareceu bem à vontade para fazer, estando, por assim dizer, em casa.

Em pouco tempo, Oscar Hocks, o álbum, já deve estar disponível em sua totalidadee vamos conferir com detalhes essa nova viagem da moça rumo aos porões da alma. Quando voltarmos desses lugares sombrios, diremos pra você o que encontramos no meio do caminho. Ou não.

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Autor:

Carioca, rubro-negro, jornalista e historiador. Acha que o mundo acabou no meio da década de 1990 e ninguém notou. Escreve sobre música e cultura pop em geral. É fã de música de verdade, feita por gente de verdade e acredita que as porradas da vida são essenciais para a arte.