Cadê: “Ronaldo Foi Pra Guerra” de Lobão E Os Ronaldos (1984)?

Registro da antiga banda do cantor é um clássico perdido da Rock Brasileiro dos anos 80

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Vou confessar algo pra vocês, queridos leitores: eu não gosto do Lobão. Tenho como pensamento principal acerca dele que seu maior desejo em toda a carreira foi ser alvo de atenção, paparicos midiáticos e carinho dos fãs. Claro, sua natureza encrespada sempre esteve presente mas, repito, o maior desejo do Lobão sempre foi o de ser um popstar. Em 1984, ele estava praticamente neste patamar. Lobão (ou João Luiz Woerdenbag Filho), passara os anos 70 a bordo do grupo progessivo Vímana. Seus parceiros também teriam papel decisivo na gestação do rock nacional dos anos 80. Eram eles: Ritchie e Lulu Santos. Após o fim do trio em 1978, Lobão – que tocava bateria – participou de gravações de vários artistas, entre eles, Marina, Luiz Melodia, Gang 90 e de seus ex-companheiros, já arriscando em carreiras solo.

O grande movimento de Lobão foi, entretanto, associar-se a Ricardo Barreto e Evandro Mesquita na fundação de uma nova banda: a Blitz, cujo nome foi dado pelo próprio Lobão. Se participar das gravações do primeiro disco, As Aventuras da Blitz, lançado em 1982, foi uma boa forma de colocar seu nome no mapa do sucesso, Lobão preferiu concentrar esforços para gravar um disco solo chamado Cena de Cinema, que contou com participação dos ex-companheiros de Vímana, além de músicos da Blitz (o baixista Antônio Pedro e o tecladista William Forghieri, além do próprio Ricardo Barreto), Marina e Marcelo Sussekind. A falta de espaço criativo para ele na Blitz foi o principal motivo da gravação de Cena de Cinema e Lobão ainda capitalizaria sobre a fama da Blitz, participando de entrevistas com o restante da banda, já determinado a sair dele assim que fosse possível. Reza a lenda que ele fez isso logo após uma entrevista para a revista IstoÉ. Assim que a revista foi para as bancas, ele pegou um exemplar, as fitas de gravação de Cena de Cinema e foi à gravadora RCA, com quem negociou um contrato para sua estreia como artista solo. A RCA era rival da EMI, que apostara no primeiro disco da Blitz, não restando outro caminho a não ser a expulsão de Lobão da banda e sua eliminação das fotos de divulgação da Blitz e mesmo da capa do disco.

As canções de Cena de Cinema tiveram pouca projeção porque a gravadora e artista não se entenderam. A Som Livre entrara em contato com Lobão para escolher uma canção do disco para a trilha sonora de alguma novela da época, o que significava acesso rápido ao sucesso e a RCA se negara a fornecer, além de presentear Lobão com um bom tempo na geladeira, prejudicando seriamente a divulgação de Cena de Cinema. A sorte, porém, estava do lado dele, uma vez que a diretoria da RCA foi substituída logo depois e caiu no colo a oportunidade de renegociar o contrato, algo que fez Lobão ter a ideia de ter uma banda. Lobão e os Ronaldos (Lobão nas guitarras e vocal, Alice Pink Pank nos teclados e vocais, Guto Barros na guitarra, Baster Barros na bateria e Odeid Pomerancblum (baixo) tiveram então carta branca para gravar seu disco de estreia.Lançado em 1984, Ronaldo Foi Pra Guerra teve dois hits massivos nas rádios do país. Logo de cara Corações Psicodélicos assaltou os ouvidos de toda a juventude, sendo tocada em todos os canais possíveis.

A banda aparecia nos programas de auditório, colocara um clipe da canção em altíssima rotação nos programas especializados e abria caminho para o estouro ainda maior de Me Chama, canção lenta, que teria uma versão de Marina e, no início dos anos 1990, de João Gilberto. O original de Lobão é uma das canções mais tocadas do rock nacional dos anos 80. O disco com os Ronaldos era um representante digno de uma new wave brasileira, sem a comédia teatral da Blitz ou os flertes jamaicanos dos Paralamas, era pop bem feito e com boas sacadas. Canções com menor sucesso foram Tô A Toa Tóquio, Bambina e Homem Baile. Apesar do êxito total, a banda logo encerra atividades por conta de desentendimentos internos. Lobão para para sua carreira solo em 1985, gravando um compacto com Cazuza (Mal Nenhum), participando do filme Areias Escaldantes e registrando outro compacto, dessa vez com uma de suas melhores canções em todos os tempos, Decadance Avéc Elegance, que chegou a fazer parte do LP Globo de Ouro, lançado no fim do ano.

Ronaldo Foi Pra Guerra recebeu lançamento em CD em 1990, sem remasterização ou qualquer outro tratamento sonoro. Por conta de problemas jurídicos entre a extinta RCA e outras gravadoras, o disco jamais foi reeditado. É possível encontrar algumas canções em coletâneas e exemplares da época à venda em sites de compras da internet, com preço variando entre 250 e 350 reais. Capítulo essencial do início do rock oitentista brasileiro, Ronaldo Foi Pra Guerra clama por revisão e divulgação melhores.

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Autor:

Carioca, rubro-negro, jornalista e historiador. Acha que o mundo acabou no meio da década de 1990 e ninguém notou. Escreve sobre música e cultura pop em geral. É fã de música de verdade, feita por gente de verdade e acredita que as porradas da vida são essenciais para a arte.