7 canções para conhecer Samira Tawfik

Uma introdução à obra da libanesa que, depois de se mudar para Jordânia, espalhou sua potente e bela voz pelo Mundo Árabe

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Fotos: Reprodução

Ainda durante o mandato francês no que viria a ser, alguns anos depois, a República do Líbano, nasceu Samira Ghastin Karimona, em 1935, no pequeno povoado de Rmeileh. Ela recebeu seu nome artístico, Samira Tawfik, do músico egípcio Tawfik Bayoumi e começou sua carreira ao longo dos anos 1960. No entanto, não ganhou muita atenção com seu trabalho na época, ao menos não em um Líbano em que, pelos palcos, competiam verdadeiras lendas da música nacional como Fairouz e Sabah. Tawfik, então, decidiu buscar por novos ares.

Se você for à Jordânia – pequena monarquia que faz fronteira com a terra dos cedros –, a opinião popular sobre Tawfik muda. Isso porque ela encontrou no país uma oportunidade para se desenvolver como artista, sendo profundamente admirada pelo próprio Rei Hussein bin Talal e se tornando a representante oficial da música jordaniana no Mundo Árabe. Se houve algum artista jordaniano que chegou perto da sua influência nos anos 1990, foi o cantor Umar Al-Abdallat.

Como homenagem a esse ícone subestimado, recomendamos aqui sete canções que servem como introdução à obra de uma cantora brilhante, de voz doce e potente, beleza incomparável e looks estonteantes inspirados na indumentária beduína.

 

Asmar [اسمر] (1995)

A palavra اسمر significa em árabe a cor marrom. No entanto, quando usada como adjetivo para descrever alguém, refere-se a uma pessoa de pele morena, bronzeada, demarcando uma percepção de racialidade e etnia com a qual não estamos habituados. Tawfik faz uma descrição profundamente apaixonada – como costumam ser as canções de amor em língua árabe – de um homem lindo, jovem, sensível, com olhos cor de mel que a fazem derreter e pelos quais o coração dela clama.

Há algo interessante de se notar nessa e em outras canções de Tawfik: diferente de suas contemporâneas Fairouz e Sabah, Tawfik não se ateve apenas ao tarab ou música de orquestra árabe. Ela se aventurou muito mais pelos gêneros musicais populares e os ritmos beduínos entoados pelos povos do deserto em celebrações e na vida cotidiana em que a música está presente. Isso também se nota na decisão da cantora de se especializar num sotaque jordaniano específico, frequentemente usado por pastores de ovelhas do norte do país. A faixa está presente no disco de mesmo nome lançado em 1995.

Barda Barda [بردة بردة] (1995)

Essa canção – já interpretada também na voz de Fairouz – se torna algo totalmente diferente com a performance de Samira Tawfik, ganhando mais gingado, por meio de percussões ritmadas, e fugindo do estilo clássico da música árabe predominante na discografia de Fairouz.

A presença do coro dá um tom diferente à canção, ainda que os versos transmitam algo totalmente diferente da sonoridade para um par de ouvidos ocidentais. No fundo, a letra tem um aspecto melancólico e fala sobre a perda de um amor. O título se traduziria em algo como “frio, frio”, e os versos usam essa sensação, bem como o sintoma de febre enquanto metáfora para se referir aos efeitos corporais pela perda do seu amado. Essa faixa está presente no mesmo disco da canção anterior.

Habibi Domeni Dam [حبيبي ضمنى ضمة] (1973)

A belíssima faixa lançada em 1973 num EP, mas depois relançada em outros discos e coletâneas da cantora. Fala sobre um relacionamento de forma profunda e íntima, transformando o ato de ser abraçada pelo seu amante em experiência divina. A canção transmite uma série de emoções, tanto a pureza do amor e o desejo de estabelecer uma conexão com Deus através da paixão que arde entre os dois, mas também a ideia de que eles estariam cometendo atos pecaminosos. Ela pede ao amante para prestar contas com Deus a fim de que esse amor encontre resolução e cura da dor da distância que os separa.

Com esses versos, Tawfik cria uma experiência de um relacionamento muito real e, portanto, repleto de complexidade, além de certa introspecção em relação à experiência humana de amar.

El Qahwa [ال قهوه] (1973)

Assim como “Ommi” [ اُمي] ou “My Mother”, de Marcel Khalifa, e tantas outras canções árabes, essa faixa na voz de Samira Tawfik fala sobre o simbolismo e a importância cultural do café. Fala-se sobre a importância de se adicionar cardamomo ao café para prepará-lo, sugerindo que a xícara perfeita dessa bebida deve conter essa especiaria. Também são mencionados os guerreiros para os quais a bebida é oferecida, enquanto fonte de energia e força para o combate.

Mais do que homenagear a bebida em si, a canção celebra a arte de fazer um bom café de acordo com as tradições e hábitos dos povos árabes, sugerindo como resultado final uma bebida forte, de tom muito escuro e textura quase licorosa. Essa canção foi lançada no mesmo EP da faixa mencionada anteriormente.

Ya Mdagdag [يا مدغداغ] (1993)

Com melodia belíssima, que remete muito à tradição musical beduína, essa faixa tem foco no canto acompanhado de um coro, além de fortes e marcadas percussões – provavelmente uma das faixas mais tocadas em qualquer aula de dança do ventre.

O ritmo sincopado que impulsiona a potente voz de Samira cria a atmosfera perfeita de uma noite de lua cheia num acampamento no deserto – onde, à beira de uma fogueira, o cheiro de chá e café com esquentam o coração tanto quanto versos sobre o desejo de beber da água de rosas que escorre das bochechas de seu amado.

Ya Hala Bel Deif [ياهلا بالضيف] (1988)

O título da canção se traduz como “seja bem-vindo” e fala sobre o ato de celebração que acompanha a chegada de um convidado. Fala-se inclusive sobre ele ser um “convidado de Deus” e como a sua partida será motivo de tristeza no coração dos anfitriões. Fica claro aqui que a canção trata de um traço bastante importante da cultura árabe que diz respeito à hospitalidade, à ideia de sempre receber de forma cordial qualquer pessoa e valorizar a sua presença.

No fundo, essa faixa celebra a hospitalidade e a noção de comunidade, encorajando a todos que recebam as pessoas de forma calorosa e mostrá-la o melhor de sua cultura, especialmente quando se trata de alguém que vem de outro lugar. Isso fica evidente por exemplo nos versos “اسكن بربوع ديرتنا, شاب صيف بديرتنا”, que se traduzem como “viva pelos cantos da nossa cidade, jovem rapaz de outro povoado”, transmitindo essa ideia de orgulho e amor pela terra natal, mas também atribuindo valor às trocas culturais entre diferentes pessoas.

Ya Ein Moulaytien [يا عين موليتين] (entre 1960-1970)

Essa antiga canção popular folclórica ficou famosa na voz de Tawfik. Trata-se de um estilo musical bem dançante chamado dabke, que é bastante popular em toda a região do Levante. Não se sabe ao certo quando foi lançado o disco contendo essa faixa, ainda que se possa especular tenha sido entre a década de 1960 e 1970.

O título quer dizer “duas viagens até o riacho” e conta a história de uma garota do campo que cruza uma ponte todos os dias para buscar água, porém na esperança de encontrar o homem pelo qual está apaixonada. Essa é provavelmente uma das faixas que mais a consagraram Samira.

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ARTISTA: Samira Tawfik

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