Barra por Barra: a hora e a vez de Lil Gabi

Longe dos gramados, Gabriel Barbosa tem tudo para abraçar de vez sua face artística e abrilhantar o cenário do trap nacional

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Barra por Barra é o espaço no qual o João aparece por aqui às sextas-feiras para falar de hip hop e de tantas outras coisas que vêm junto com a (enganosamente simples e definitivamente sedutora) ideia de “falar de hip hop”. Ritmo, poesia e opinião – com o João.

 

Na última terça-feira (26), o mundo do futebol brasileiro foi surpreendido com uma notícia bombástica: Gabriel Barbosa, o Gabigol, foi suspenso do esporte por dois anos. O Príncipe da Nação foi acusado de dificultar a realização do antidoping, o que foi interpretado como tentativa de fraude. De acordo com os responsáveis pelo exame, o marrento atacante se irritou ao ver que o oficial o acompanhou até o banheiro para a coleta. Relembrando os jogos do ano passado, é difícil acreditar que o camisa 10 do Malvadão estava de fato se dopando para performar melhor. Nas ruas (na verdade, no Twitter) o que se supõe é que Gabi – para os íntimos – ficou com vergonha de exibir sua genitália para as autoridades.

Eu gostaria de sugerir outra hipótese. Veja que aqui já me referi a ele como Gabriel Barbosa, Gabigol, Gabi e Príncipe da Nação, mas nada disso importa. Com a suspensão até abril de 2025, o atleta terá um ano sabático para dar fruição a uma de suas personalidades mais interessantes: o trapper Lil Gabi. Amicíssimo de Matuê e presença certa em camarins de festivais de rap, talvez o atleta-agora-artista correu do exame para que não fosse acusada a presença de nenhuma “flor da importada” como sugere o refrão de “Sei Lá”, seu primeiro single com participação de Choji e produção de Papatinho. (Brincadeira minha, claro. Para apurações sérias, clique aqui).

Assim como no campo, a carreira de Lil Gabi já começou quebrando recordes: ele foi o primeiro trapper a estrear um som no Fantástico, na ocasião de ter pedido a própria música “Sei Lá” para embalar o VT de seus três gols contra o Santos, no Brasileirão de 2021. Na época, o rap de Gabigol foi bastante criticado por ser genérico, como se fosse exclusividade dele. É verdade que é bem constrangedor quando ele diz que “faz uma party com as bih pelada” (quem fala assim?), mas o problema de Gabi é outro. Enquanto, para alguns rappers, linhas como “um milhão é pouco porque eu sou camisa 9” podem soar forçadas, essa é só a vida normal dele. É como quando você vai ouvir um rapper underground boombapeiro e ele rima do jeito mais literal possível, sobre, sei lá, como tá meio foda andar de ônibus.

Quero dizer, Gabigol é o cara que foi detido pelo Alexandre Frota por estar em um cassino durante a pandemia. O que falta para sua persona trapper se tornar um personagem de The Boondocks? Tenho plena certeza de que com um pouco de esforço, orientação e – agora – tempo, ele pode dar um toque mais gangsta à matéria-prima dos seus raps, e evitar vexames como o infame verso do pescoço. Se ele não tiver tantas histórias assim, bora inventar, exagerar, contar mentira, o importante é estar bem rimado. 2024, já passou da hora de superar essa falácia de “rimar o que vive”.

Como flamenguista, me preocupa a ausência de Gabigol, caso ele não vença o recurso em instâncias superiores. Como autor desta coluna, a possibilidade de uma mixtape de Lil Gabi me anima. Posse cuts nacionais, se é que assim podem ser chamadas, como a série Let’s Go, do MC IG, ou Poesia Acústica estão tão chatas que a participação de Gabigol nessa cena mais mainstream talvez termine sendo bem divertida.

 

 

Recomendação de sons

Rua Dois – Mete Marcha

Em maio de 2023, o Prêmio Rap Brasil anunciou os indicados a “Melhor Performance Ao Vivo”. Entre nomes de gigantes como BK’, Matuê e Racionais MC’s, um em especial intrigou especialmente os fãs da falecida e não indicada Recayd Mob, que se perguntavam nas respostas da publicação: “Quem é Ruadois?”

A pergunta se tornou piada interna entre o público do Ruadois e até mesmo entre o próprio grupo, cada vez mais comprometido em sanar a dúvida. Objetivamente, Ruadois é um trio mineiro (não confundir com linguiça, mandioca e torresmo) composto pelos MCs Mirral ONE e WELL e a DJ Akila. Dando um passo à frente, o Ruadois é parte relevante da nova safra de artistas brasileiros a se debruçar sobre ritmos como o grime e o garage, adaptando-os aos sotaques tupiniquins.

No dia 20 de março, o trio desacelerou o ritmo da série de EPs Proibido Estacionar para o lançamento de S2, de temática amorosa. Em “Mete Marcha”, o desejo de não ver o ex nem pintado de ouro – um dos melhores temas de músicas de amor –, ganha uma roupagem suave e dançante, quase como uma versão Nego Doce do clássico “Dispiei”, do Néctar Gang.

Jovem MK – “Chevette”

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ARTISTA: Lil Gabi