DJ Ramemes: destruindo e construindo

‘Destruidor do Funk’, o produtor de Volta Redonda borra os limites de suas criações, vai da abertura de “Naruto” a remixes de Taylor Swift – e voa cada vez mais alto

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Fotos: Wander Scheeffer

“Virei diva pop”, conta Ramemes, que assinou “Calma Amiga”, música de Pabllo Vittar e Anitta de 2023, e vê seu público se multiplicar diariamente. Ramon Henrique Fernandes é o anfitrião do Baile do Ramemes, evento que gera registros inusitados entre os frequentadores (na última edição, ele e DJ Mu540 tocavam de um lado, Marina Sena rebolava de outro). Além de passar por todo o Brasil com a empreitada, o produtor e DJ de Volta Redonda (RJ) vai embarcar em uma turnê na Europa ainda esse ano. “Estou tendo que marcar dia pra ver minha mãe”, brinca.

Otaku, fã do Skrillex e vascaíno cronicamente online, o produtor de 24 anos figura bem no sistema de alinhamento de Dungeons & Dragons: Ramemes é totalmente chaotic good. E surgiu da forma mais chaotic good possível, de surpresa, em um show de talentos. “Eu já gostava de música eletrônica, né? Por causa do Skrillex, essas coisas que têm na gringa”, conta. “Aí falaram que ia ter um show de talentos no colégio. Eu, do nada, só falei: ‘Ah, vou ser DJ’. Isso em 2016. E eu não sabia de nada”.

Ele expressou essa vontade “em uma conversa aleatória no Discord” para um amigo de Anápolis (GO), que o ensinou a mexer no Ableton. “Aí a gente montou o set no programa, de um jeito que no show eu só apertasse um botão”, relembra, com expressão séria. “Acontece muito, né? Tem muito DJ que só aperta um botão e depois só fica dançando. Então, no show de talentos, o meu foi o talento de apertar o botão!”.

Nasce, então, o Ramemes (que, hoje em dia, não fica só apertando um botão). “A galera curtiu, e eu comecei a aprender mais a mexer no programa, a aprender mais a usar a mesa. Fui fazendo músicas para fazer a galera rir. E até que deu nisso tudo né, aqui de hoje em dia”, brinca ele, como se um acidente ou piada sem cálculo levasse qualquer um a trabalhar com a Pabllo Vittar.

Mas o DJ sabe que não foi acidente – levou tempo, investimento, cuidado. “Gastei uma grana, tocava em evento por R$ 50, R$ 100. Para aprender, também. E aí fazia de tudo para aparecer”. O investimento deu retorno: se você esteve atento ao Soundcloud nos últimos anos, já deve ter ouvido falar de Ramemes. Já conhecia o “Destruidor do Funk”, que mescla remixes de Taylor Swift a abertura do Naruto, com o mais inspirador desprezo pelas regras. E por isso, a plataforma foi o lugar perfeito para o produtor crescer. “O Soundcloud é onde você ‘taca as doidera’ e só tem doido pra ouvir”, diz. “E é onde tem gente importante, feito os produtores da Pabllo Vittar”.

(Foto: Dennis Siqueira)

“A minha parada nunca foi letra. Sempre foi batida. Então a letra, para mim, é um complemento da batida. Se ela combina com o que tá soando, com o que tá batendo ali, é isso”

Foi no Soundcloud que Ramemes variou entre seus “vulgos”, não só de destruidor do funk (“A galera falava que eu estava estragando o funk”, afirma) como de “Rei do Lança” e “Presidente do Sexo”. O último veio depois que o produtor adotou um novo padrão, fazendo as faixas “Sexo Completo”, “Sexo 2 Completo” e “Sexo 3 Completo”. (Mais sequências dessa franquia virão, ele anuncia).

A franquia “Sexo” é o sample levado ao extremo: sob diferentes bases, um mesmo sample da palavra “sexo” é repetido quase sem parar. Vira um poema concreto, digamos. E como é comum com Ramemes, ele conta que tudo começou com uma piada. “No Rio, tem muita montagem que você consegue sempre reimaginar”, diz. “Isso de repetir ‘sexo’ um monte de vez já existia em montagens do Rio de Janeiro, mas não ficava a música inteira. Aí que veio o maluco da cabeça [diz, apontando para si mesmo] e fala: ‘Por que que não faz isso a música inteira?'”.

(Foto: Eric Goiaba)

“O funk bate em qualquer pessoa que existe, não adianta. Pode falar que não gosta, mas se tiver na festa bebinho e bateu um funk, já era. Aí vai a galera que é nerd, tá ouvindo funk e começa uma abertura de Naruto, f*deu”

Esse “pós-funk”, em que a palavra se repete tantas vezes que perde o significado – alguns comentários defendem que o termo, repetido, soa como “sossega” – pode ser considerado um estilo do produtor. “A minha parada nunca foi letra. Sempre foi batida. Então a letra, para mim, é um complemento da batida. Se ela combina com o que tá soando, com o que tá batendo ali, é isso”, conta.

“Tem muita música minha que não faz nem sentido. Tem uma música que a gente produziu com a Mc Myres, uma cantora da Rocinha, que ela fala assim: ‘É piroca no caralho’ [risos]. Qual a lógica? E a gente fez a música sem prestar atenção nisso. No final da música, quando estava pronta, a gente foi perceber que ela falava isso”.

É difícil descrever Ramemes sem cair na armadilha de falar de sua idade. Aos 24 anos, ele é produto – e agente – de sua geração formada por tudo-que-há-para-se-ver-na-internet, que não rejeita nenhuma influência, mas não obedece nenhum manual. Em suas produções frenéticas, ansiosas e distorcidas, a brincadeira vem de reimaginar tudo: uma de suas faixas mais ouvidas no Soundcloud usa a clássica “Dança do Créu”, mas a cada vez que o MC Créu “aumenta” a velocidade, Ramemes acelera o BPM. Em outra, ele e DJ Mulú remixam vários funks sobre lança-perfume com “Lança-Perfume”, da Rita Lee. Não dá para dizer que não faz sentido.

É esse jeitinho chaotic good que o leva a… Todos os lugares. “Eu toco em evento de hétero top, toco em evento de LGBT, eu toco em evento de nerd, eu toco em evento de emo… eu toco em evento de tudo que existe. Por conta de não ter a famosa mente fechada. Eu faço de tudo que existe”, declara. Essa muito bem utilizada falta de amarras referenciais também repercute no som explosivo e surpreendente de seu disco de 2023, Sem Limites.

Tudo isso culmina no Baile do Ramemes, sua própria festa. “Eu pego da cultura dos cria, das festas LGBT e misturo tudo”, conta. “E aí tem de tudo no Baile do Ramemes. O meu sonho não é ser o melhor DJ, não é ser o melhor produtor de funk do mundo. O sonho mesmo é ser o maior dono de evento musical do Brasil”. No fim, o tal “destruidor” chega a ser um embaixador do funk – que metamorfoseia o estilo à sua própria moda e para vários públicos. “O funk bate em qualquer pessoa que existe, não adianta. Pode falar que não gosta, mas se tiver na festa bebinho e bateu um funk, já era. Aí vai a galera que é nerd, tá ouvindo funk e começa uma abertura de Naruto, f*deu”.

Mas se Ramemes chegou onde está fazendo piada, ele não pretende começar a levar nada muito a sério. “Eu só fui fazendo o que vinha na telha e até hoje é assim. Sempre fui eu e nada mudou. Mas agora a galera me trata como artista”, conta. “Virei um artista mesmo, de acordo com a galera. Uma diva pop”.

Ramemes por Ramemes


Um artista: Skrillex.

Um artista brasileiro: DJ Luanzin do K11.

Uma regra pessoal: Fazer sempre pensando em diversão para não me estressar. Eu prefiro muito mais que a galera que vem produzir comigo fale: "Toma. Isso aqui é a minha voz e eu quero que você faça qualquer coisa" do que "Quero que você faça algo específico". O Ramemes gosta de fazer do jeito que ele acha divertido. Quando eu faço algo sorrindo, sai muito melhor do que quando eu faço algo com a cara feia.

O futuro de Ramemes: Muitas músicas com pessoas que eu gosto. Vai sair música com MC Naninha, Puterrier, Irmãs de Pau… Vem aí muita coisa doida.

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ARTISTA: DJ Ramemes

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