DJ Ramon Sucesso: o mundo gira, é só questão de tempo

O Cara do Beat Bolha e Dono da Sexta dos Crias, o artista carioca fala sobre sua estreia com disco de vinil e reflete sobre questões atuais do funk

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Fotos: Marcelo Mudou

Sorrizo Ronaldo, MT Sheik, Gilbert Rangel, Pimpolho Sheik, Carol Vicentini e FP do Trem Bala. Juntos, esses nomes formaram o que ficou conhecido como a “Vagabundo dos Bons”, uma espécie de coletivo de youtubers que catalisaram o funk carioca entre os anos 2013 e 2018. Com vídeo-montagens de fotos pessoais, os canais desses jovens eram a central de lançamentos de funk no Rio de Janeiro, o espaço em que você ia ouvia primeiro o próximo funk a estourar. Assim, eles se tornaram extremamente influentes na difusão da música de diversos MCs e foram alguns dos precursores do formato moderno de montagem (MTG) do funk carioca, no qual o DJ é protagonista.

Com potencial extremamente “memeável”, alguns desses artistas criaram obras que são clássicos da internet brasileira. Como não lembrar do “amv mais triste do max steel”, com trilha sonora de Luciano do YouTube sampleando Red Hot Chilli Peppers, ou o “Mega Se Piscar Já Era” do Sorrizo Ronaldo, o Hokage da edição dos vídeos?

Mas não era só o núcleo da Vagabundo dos Bons que se destacava no YouTube. Nomes como o próprio FP do Trem Bala (parte do coletivo), Gabriel do Borel e Yasmin Turbininha sacaram que o cenário estava mudando, e logo passaram de divulgadores de lançamentos no YouTube para produtores de funk. Com ascensão meteórica, se tornaram nomes inescapáveis para o funk carioca a partir da segunda metade da década passada.

É nessa transição que, em meados de 2018, Ramon decide junto a seu irmão e escondido dos pais evangélicos, criar o canal “Irmãos Sucessada”, inspirado em Somália Sucessada, DJ que ainda tem um dos canais do YouTube mais ativos dessa cena, com dezenas de milhões de visualizações.

Como se unisse as principais qualidades de seus antecessores, inclusive o potencial de meme (no sentido apreciativo da coisa), Ramon Sucesso hoje é DJ, produtor, “o cara do beat bolha” e criador da Sexta dos Crias. “O maluco é tão bom que tá distorcendo a realidade com o som” e “Tu sabe quando o cara é bom quando ele consegue inverter os polos magnéticos da terra com um beat” são alguns dos comentários no vídeo que viralizou DJ Ramon Sucesso para além da bolha (hehe) do funk.

Aos 21 anos de idade, e cerca de três anos após o primeiro vídeo viral, Ramon Sucesso botou para F e lançou Sexta dos Crias, seu primeiro álbum com distribuição em vinil pelo selo inglês Honest Jon’s. Pelo nível de experimentação em apenas duas faixas de mais de 15 minutos, Ramon Sucesso faz, à sua maneira, o que Miles Davis realizou no primoroso In a Silent Way. No entanto, o álbum é um trabalho primordial de funk: as músicas na verdade são dois sets mixados em que Ramon não abandona as vinhetas e nem sequer a divulgação do número para contratá-lo, clássicos do formato. É papo de cria.

DJ Ramon Sucesso, “O Cara do Beat Bolha”. O que te atraiu nessa vertente em oposição a tantas outras que estavam rolando nos canais de YouTube e Soundcloud na época?

O beat bolha já existia, foi criado aqui em São João [de Meriti] pelo DJ Careta, Merinho, DJ Ulisses, vários. Aí eu gravei um vídeo nesse bolha, o primeiro, e já bateu 100 mil. Pensei, “pô, então os cara quer bolha…”. Meu irmão que teve a ideia de gravar assim, começou a tremer… Não gostei, mas ele disse para postar assim mesmo. Hoje eu carrego “o cara do beat bolha” na minha logo. [Para isso] eu entrei em contato com aqueles amigos de São João e falei “pô, posso botar ‘O Cara do Beat Bolha’ na minha logo? Sei que o bagulho vem daí, e tal, não queria arrumar atrito com ninguém, sem a permissão de vocês que começaram…” E os caras foram de boa.

Você faz muito baile hoje em dia?

Sim, graças a Deus.

Conduzir um baile, como funciona pra você?

Em cada lugar o ritmo é diferente. Se for tocar na boate, a gente não vai tocar aquilo que a gente toca num baile funk, baile de favela. A gente sabe sobressair, lidar, entendeu? Porque a gente tem que agradar cada público.

Mas hoje em dia, com seu reconhecimento, tem gente que te chama só pra tocar o beat bolha?

Tem gente que me contrata só para me ver tocar o beat bolha, tá ligado? E tem público que quer ver tudo que eu toco na Sexta dos Crias, nos meus vídeos.

“Nunca imaginei gravar um vinil para a Europa, é gratificante porque é para o funk. O funk é muito discriminado, e lançar um disco na Europa é um cala boca para eles”

Tenho visto muitos DJs de funk falarem do funk de favela x funk de tik tok, que não tocam funk de tik tok em baile de favela. Como você analisa essa questão?

Eu creio que o Tik Tok mudou a vida de muitas pessoas, tá ligado? Mas, tipo assim, acho que o Tik Tok deu uma influenciada no nosso funk. Antigamente, a gente para estourar um funk, chegava no baile, gravava o vídeo no baile, rodava o funk no baile, aí a música estourava. Hoje em dia ela, para a busca do funk estourar, tem que passar pelo Tik Tok, tá ligado? Tem baile que eu toco que ninguém toca Tik Tok. Porque ninguém gosta, mano. O povo da favela vai olhar pra tua cara e falar: “o que ele tá fazendo ali?”.

Me conta como você começou.

Comecei com YouTube, com meu irmão. Escutava muito os DJs que produziam música. A maioria dos youtubers às vezes fazia vídeos ali, mas não era o produtor da música real. Começou a subir [minhas] visualizações, trabalhava num lava-jato também e fiquei trabalhando nas eleições. Aí comprei um notebook para tocar, partir pro lado DJ já, tocar nas resenhas aqui de graça e tal. Depois meu pai ganhou um dinheiro que até hoje a gente não sabe como caiu na conta dele e ele falou que era o dinheiro que ia ser minha controladora, ele me deu de presente. Eu cresci sendo fã do Denilson, O Clínico. A mixagem ninguém me ensinou, mas de tanto mandar mensagem pra ele, peguei intimidade com ele, ele me ensinou a produzir. Olha só, eu sendo fã do cara, ele me ensinou a produzir. Bagulho doido. A mixagem foi sozinho, botei as cara e fiquei treinando.

Como está sendo pra você lançar um disco de vinil?

Porra, está sendo gratificante. Papo reto, a parada surreal. No começo, nunca imaginei que eu ia gravar um disco de vinil para a Europa.

O funk sempre foi uma cultura de coletânea, montagem, set mixado, DVD… Excluindo nomes como Claudinho e Buchecha, por exemplo, nunca foi tradição do funk lançar um disco. Você acha que faz sentido pro funk lançar disco?

É essencial porque o funk é cultura, tá ligado? Eu acho o bagulho gratificante porque é pro funk. Funk já é discriminado pra caralho, lançar um disco na Europa é um cala boca pra eles, tá ligado?

Nos últimos anos, com a profissionalização do funk, alguns artistas têm cobrado direito autoral de samples de voz, que são matéria-prima de diversas músicas. Como isso impacta seu trabalho, que tem muito sample…

Sim, é verdade, muita montagem, né? Mano, eu gosto muito. Quando eu vou produzir, o MC fala pra mim: “coé, vamos lançar uma música pra trabalho”. Eu vou lá, faço o máximo pra produzir só com a voz dele, para não ter esses problemas. Porque tipo assim, meus vídeos? É mais montagem. Sexta dos Crias? É mais montagem, já é vários samples. A maioria ali não é das músicas que eu faço, então eu só subo no Soundcloud, ou faço um set mixado… Só música de trabalho que eu boto no Spotify.

“Em cada lugar o ritmo é diferente. Se for tocar na boate, a gente não vai tocar aquilo que a gente toca num baile funk, baile de favela. A gente sabe sobressair, lidar, entendeu? Porque a gente tem que agradar cada público”

Como é uma sexta-feira na vida do DJ Ramon Sucesso?

Às vezes é muito corrida. Eu sou maluco, deixo pra gravar o vídeo da Sexta no dia, aí fica uma correria do caralho (risos). Às vezes eu produzo a música na sexta tendo que gravar o vídeo 13h mais ou menos.

Eu acordo cedo, chamo o menor da produção para gravar o vídeo, vou pro computador, produzo a música rapidinho, às vezes deixo até pela metade, nem termino a música – só para fazer o vídeo –, monto a controladora, monto o cenário para gravar, testo a música e o que vou fazer no vídeo.

Depois que grava, às vezes nem desmonto a controladora, vou, corto o cabelo porque tem baile de noite, show… E é assim, correria, mano. Almoço tardão.

E como é a sexta de cria? O rolé que você fazia antes de ser DJ.

Mano, eu não bebo nem fumo. Uma sexta de cria para mim é ficar com os amigos, jogar bola, soltar pipa, cortar o cabelo, lançar o reflexo, depois ir pro baile, ou ir para uma praça zoar, ficar entre os amigos. Para, mim uma sexta de cria é assim.

Me conta os passos do Ramon pro futuro

Meu futuro que eu penso é mudar de vida, mudar a vida da minha família. Realizar meu sonho que eu tenho de ir para a Europa, e é isso, mano…

Quer deixar um recado pra quem tá lendo, uma mensagem pro mundo?

Pra rapaziada nunca desistir do sonho de vocês, tá ligado? Porque se você tem o sonho na sua cabeça, é porque Deus botou na sua cabeça, então você pode chegar! É isso.

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