Donny Hathaway em 15 canções

Uma seleção dedicada a um dos maiores talentos da história do soul

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Fotos: Val Mazzenga

Quando Jerry Waxler, célebre produtor da Atlantic Records, teve contato com Donny Hathaway no fim dos anos 1960, ele disse: “já temos dois gênios da música nessa gravadora, Ray Charles e Aretha Franklin – acho que encontramos o terceiro”. Quincy Jones, no documentário Unsung: The Story Of Donny Hathaway (2008), o chama de “um músico surreal”. “Quando você passa a vida toda tentando ser um [músico surreal], você reconhece quando escuta um”. Stevie Wonder cravou: “Quando Donny Hathaway cantava qualquer música, ele se tornava dono dela”. Elogios desse calibre dão a dimensão do tamanho do talento de Mr. Hathaway – como é carinhosamente homenageado em “Rehab”, de Amy Winehouse.

Com apenas três discos de estúdio, além de um lendário registro ao vivo e duetos emblemáticos com Roberta Flack, Donny Hathaway alçou um lugar especial no panteão do soul. Aos quatro anos (!) de idade já se apresentava como Donnie Pits em igrejas da região de St. Louis e, depois de estudar música na Howard University, retornou a Chicago, cidade onde nasceu, para fazer parte do coro do The Impressions, de Curtis Mayfield, e trabalhar como produtor, arranjador, pianista de estúdio na Curtom Records, gravadora de Mayfield. Então, ele saiu dos bastidores e passou a brilhar: vieram o contrato com a Atlantic, os discos Everything Is Everything (1970), Donny Hathaway (1971) e Extensions Of a Man (1973) e a admiração de seus pares de soul. Donny, um perfeccionista, mesclava a habilidade pop de Stevie Wonder, a extensão vocal de Marvin Gaye e o domínio harmônico de Herbie Hancock. Celebrava raízes da música negra – o gospel, o jazz e o blues –, mergulhava no soul dos anos 1970 e ao mesmo tempo trazia a complexidade de um fã ferrenho de Debussy e Ravel. Em meio a uma carreira que despontava cada vez mais, foi diagnosticado com esquizofrenia paranoide em 1973.  Donny se afastou dos palcos e estúdios por seis anos, tomava 14 comprimidos três vezes ao dia e batalhava contra a depressão, a paranoia e as mudanças drásticas de humor.

No dia 13 de janeiro de 1979, Donny enfim retornou a um estúdio, em Nova York, para mais uma gravação com Roberta Flack. Após um colapso nervoso, voltou para o hotel Essex House. Horas depois foi encontrado morto na calçada em frente ao hotel, em decorrência de uma queda do 15º andar.  Um músico absolutamente brilhante que teve sua jornada tragicamente encerrada de maneira precoce, aos 34 anos de idade.

Essa lista é apenas um aperitivo do que Donny Hathaway produziu e, mais do que um resumo, é um incentivo para um mergulho profundo por seu breve, mas deslumbrante catálogo.

 

“The Ghetto”

O carro-chefe de seu primeiro disco, Everything Is Everything (1970), é uma imperdível explosão sonora liderada pelas teclas de seu Wurlitzer e uma contagiante percussão, unindo funk e referências latinas.

“Someday We’ll All Be Free”

Entre as grandes canções de todo seu catálogo, foi escrita pelo amigo Edward Howard como mensagem de motivação a Donny, à época, diagnosticado com esquizofrenia paranoide. Com o tempo, tornou-se também um hino de igualdade racial. Um clássico.

“The Closer I Get To You”

A mais emblemática parceria com Roberta Flack é um dos grandes souls românticos de todos os tempos – e chegou ao segundo lugar da parada de singles da Billboard.

“A Song For You”

Com orquestrações grandiosas e uma voz que une delicadeza, emoção e força, a versão de Donny transforma a canção de amor de Leon Russell em uma experiência espiritual.

“This Christmas”

Uma linha de metais altamente assobiável, uma letra tão doce quanto a voz de Donny – e um clássico natalino, composto em parceria com Nadine McKinnor.

“Jealous Guy”

Incluída no lendário disco ao vivo de 1972, a releitura do clássico de John Lennon é encorpada por coros, um piano cheio de groove e a voz flutuante de Donny.

“Love, Love, Love”

Comandado pelas teclas do Fender Rhodes, o primeiro single de Extensios Of A Man (1973) é um groove-de-amor que faz frente às grandes canções de Stevie Wonder.

“Where Is The Love”

Mais uma amostra irresistível da dobradinha Flack & Hathaway, com suas vozes se harmonizando de maneira azeitada e mágica. Ganhou o Grammy e chegou ao 5º lugar do Hot 100.

“Little Ghetto Boy”

Um dos destaques do disco ao vivo de 1972, é uma união entre desamparo e fé, angústia e redenção – Donny entoa, com voz incomparável, um hino de resiliência da juventude afro-americana.

“Voices Inside (Everything Is Everything)”

Com arranjo luxuoso, coros imponentes e grande variedade de instrumentos, a faixa que traz o título de seu disco de estreia é um mantra sobre o entendimento holístico da existência – vale também ouvir a epopeica versão ao vivo, no disco de 1972.

“Back Together Again”

Uma das últimas canções gravadas por Donny, é a investida mais disco music de toda sua carreira em mais uma parceria afiadíssima e bem-sucedida com Roberta Flack.

“I Love More Than You’ll Ever Know”

A voz de Donny viaja de maneira livre em uma balada letárgica, algo melancólica e certamente classuda sobre um amor devoto.

“Magnificent Sanctuary Band”

Com letra e sonoridade embebidas de gospel, a faixa de seu disco homônimo de 1971 é uma demonstração da energia fervente de Donny ao expressar sua fé – e capitanear uma banda das mais competentes

“Tryin’ Times”

Enquanto a versão de Roberta Flack vem com marcante energia gospel, a de Donny – autor da canção – acelera no blues em meio a uma matadora linha de baixo.

“I Know It’s You”

Parte do repertório de Extensions Of A Man, é uma síntese das habilidades de Donny: o domínio vocal, o piano intrincado, as influências do gospel e um refrão de arrepiar.

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